terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Aquele com o restaurante vegetariano

Como muitas das histórias e teorias que eu venho contar aqui, essa também começou com uma conversa com a Analu. Mais especificamente uma conversa que aconteceu em uma noite de terça, quando a Analu resolveu compartilhar comigo sua mais recente obsessão internética: o blog Do Seu Pai. Lá, o Pedro escreve cartas lindas para seus filhos João, Irene e Teresa (que nasceu essa semana). Mas coisas muito lindas mesmo. Desde declarações de amor que recendem ternura mesmo através da fria tela do computador à pequenas observações cotidianas que valeriam uma tatuagem enorme nas costas. E mesmo com esses textos lindos, o que chamou ainda mais minha atenção no blog foram as fotos que acompanham cada post. Não demorou para que eu estivesse seguindo Pedro e Lua no Instagram (e eles são demais até nas legendas das fotos!), e agora vou parar de falar deles porque isso já está ficando estranho.

O negócio é que, como muitas das conversas entre eu e Analu, eu pensei e ela disse: queria tanto ser daquela turma! Pedro e Lua parecem viver num mundo em tons de Valencia, com seus filhos bonitos de nomes chiques, as tatuagens misteriosas cheias de significados poéticos, os amigos igualmente cool, tatuados, misteriosos, com filhos de nomes chiques - cenário que, num momento de fraqueza (noite de terça, notebook na barriga, uma entrevista importante pra fazer no dia seguinte para a qual eu não me sentia preparada at all, a primeira de uma matéria grande que deveria ser entregue sexta e meu Deus eu não tinha absolutamente nada), me pareceu uma perspectiva ideal de futuro. Para que dali uns 10 anos, num apartamento com chão de taco na Vila Madalena, eu, grávida do terceiro filho do amor da minha vida, risse de mim 10 anos atrás, tão bobinha e pouco iluminada, perdendo o sono por conta de uma entrevista. Na parte interna do meu braço, uma tatuagem (desenhada por algum amigo designer cujo papo eu morro de saudades) misteriosa com o significado poético que me lembraria como eu teria chegado ali. 

É um bom futuro pra se aspirar.

Na fatídica quarta-feira (entrevista feita, cabeça mais tranquila), me vi às 13h sem companhia pra almoçar. Já estava tarde para alcançar meus amigos no RU e não tinha nada de bom em casa que pudesse render uma madura refeição com Breaking Bad na frente do computador. O sol estava forte demais pra ir andando até o shopping e eu até poderia fazer o que costumo fazer sempre que me vejo nessa situação, que é almoçar qualquer porcaria que encontro no armário e fuck da police. Mas aí lembrei do blog e da minha tatuagem-misteriosa-com-justificativa-poética e resolvi sair. Não pro shopping, não pra universidade, mas pra um restaurante vegetariano perto de casa, que me foi recomendado por uma amiga.

Uma coisa importante sobre mim: eu amo carne.


Amo carne, mas queria amar menos. Amo carne, mas me identifico com a causa vegetariana e me sinto uma pessoa cínica, vivendo em negação eterna, porque não consigo parar de comer carne. Amo carne, mas acho que tem tudo a ver com meu futuro na Vila Madalena ser vegetariana, ou pelo menos ter esse hábito em algum dia da semana. Aproveitei que nem estava com tanta fome assim e fui. 

Não gosto de usar estereótipos, mas o restaurante era exatamente tudo que você imagina de um lugar com comida vegetariana, orgânica e do bem: instalado em uma casa mais ou menos adaptada, mandalas, imagens de budas e decoração oriental por todos os cantos e todo o rolê zen-budista-alternativo-tatuagem-misteriosa da cidade. 

Apesar dessa aura hippie, era um self service como outro qualquer. Investi na salada (tabule! trigo! sustento!) e fui direito no escondidinho, porque comer batata é estratégia de guerra. Arroz (integral), porque na falta de carne escondidinho + arroz tá liberado. E pronto. Era um prato de respeito, com muito mais comida do que eu sirvo normalmente, só pra garantir. Lembrei da vez que na quinta série fui almoçar na casa de uma amiga vegetariana e uma cena que nunca vai sair da minha cabeça conta com a mãe dela ofendida porque eu recusei a carne de soja com abobrinha e minha outra amiga repetindo o feijão pela quarta vez. 

Para uma pessoa acostumada a comer carne, carne vermelha, muita carne vermelha, ela faz muita falta. Tanta falta que a cada garfada eu sentia meu estômago ficando mais vazio. Angustiada, resolvi pegar o celular e compartilhar a angústia com as minhas amigas, porque eu estava me sentindo uma mentira tão cabeluda naquele momento que precisava que alguém soubesse a verdade: que eu estava com fome, arrependida e que queria sair dali. É claro que senti os olhares de julgamento sobre mim quando tirei o celular da bolsa e comecei a comer e digitar ao mesmo tempo. Eu também me julgaria se visse de fora, mas situações desesperadoras pedem medidas desesperadas, como invocar suas amigas que vão rir da sua cara e dizer que também estariam loucas para sair correndo dali. 

Quando finalmente fui pagar, tinha uma mocinha na minha frente. Ela também almoçou sozinha e não mexeu no celular em momento nenhum. Ela tinha um corte de cabelo diferenciado e usava calças de linho (quem usa calça de linho numa quarta-feira em horário comercial?) e na parte dos ombros que a blusa revelava, saía uma tatuagem cheia de arabescos. Misteriosa, sabe como é. Como se eu precisasse de mais uma certeza de que aquele mundo não me pertencia e tinha gente muito mais adequada para habitá-lo. Fui tomar um cafezinho na saída. "Moça, já tá adoçado?" "Não, e é descafeinado, tá?". Claro que era descafeinado.

Saí de lá direto pra uma cafeteria, onde terminei de almoçar uma torta de doce de leite com creme holandês.

Na janta, hamburguer de picanha de 200g, bacon e molho barbecue.

Quem é que eu estou enganando, né? Quem nasce pra comédia romântica (para aquela parte dos constrangimentos e de levar na cara das comédias românticas) ou pra sitcom não combina com o rolê zen-budista-alternativo-tatuagem misteriosa-apartamento-de-tacos-na-vila-madalena.

Mas pelo menos a gente tem picanha mal passada.



Ron Swanson curtiu pelo menos o final deste post

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Os primeiros e os últimos filminhos do ano #3

Meu ano começou tão ligado no 220 que a sensação que fica é de que já avançamos uns dois meses em 2014. As duas semanas de pernas para o ar no recesso parecem outra vida, e entre uma preguiça e algumas temporadas de Breaking Bad já entrei no frenesi do Oscar e aquela vontade de ver todos os filmes do mundo. Mas, antes, vou dividir com vocês o que assisti em dezembro e no comecinho de janeiro, e depois falamos de Oscar com calma. Mas adianto que estou muito animada e já tenho um favorito! 

O inventor da mocidade (Howard Hawks, 1952): Li uma biografia da Marilyn Monroe no final do ano e entrei numa pilha de ver os filmes mais obscuros dela. Esse foi o primeiro que caiu no meu colo graças ao Netflix, mas a coisa que menos me chamou atenção foi Marilyn. Impossível prestar atenção nela (em mais um papel de loira burra) quando tem toda uma dinâmica Ginger Rogers + Cary Grant acontecendo. É um pastelãozinho de época (bem divertido) sobre um cientista que acidentalmente descobre uma fórmula da juventude, mas acho que tirando a parte das travessuras com um macaco (sim), é um mote que poderia ser muito bem aproveitado atualmente num remake. Impossível uma história ter mais a cara do nosso tempo do que um monte de gente ficando louca querendo rejuvenescer. Curti.


Carrie (Kimberly Peirce, 2013) Esse filme é errado em tantos níveis diferentes! Aliás, maldito seja o dia em que eu o assisti. Apertei meu dedo na porta, passei mal de quase desmaiar na fila do ingresso, a energia acabou no meio do filme e eu ainda fui obrigada a assistir esse lixo. Eu estava realmente disposta a gostar, ansiosa pra ver o remake, mas logo na primeira cena eu vi no que ia dar. Pra começar, Chloe Moretz não é estranha, e nem o figurino antiquado e o cabelo de palha me convencem disso. Só isso basta pra invalidar a premissa da história e descreditar o filme. Depois, faltou sutileza para fazer o espectador entrar na história, se ambientar com o clima do filme, sentir o mínimo que fosse de apreensão. Não existe esse banho-maria necessário, e eles já entram fazendo o que existe de pior no cinema americano: fazer as coisas super exageradas, como se fosse uma questão de força, não de jeito. Talvez daqui uns 5 (ou 10) anos eu veja ele de novo e consiga pelo menos achar um filme divertido, desses que de tão ruins são bons, mas por enquanto fiquei tão constrangida com a forma com que eles conseguiram fazer uma lambança em cima de um material tão bom que nem debochar eu consegui. Dicona: vejam e revejam o filme do Brian De Palma, com Sissy Spacek e John Travolta. Anos 70, só maravilhas.

Álbum de família (John Wells, 2013): Não sei direito o que pensar sobre esse filme como um todo, porque fiquei concentrada demais na entrega dos atores e na quantidade de bafões que acontecem. Um grande naked-cake de climão familiar e só isso já vale o ingresso. Um drama familiar tenso o suficiente pra qualquer mal estar provocado pelo excesso de proximidade da família nas festas parecer uma bobeirinha. O elenco é incrível, os personagens são interessantes e os diálogos são desses que nossa cabeça acompanha ora um personagem, ora outro, como num bang bang de palavras. Meryl Streep, novidade, está monstruosa no papel de matriarca decadente viciada em remédios. Julinha Roberts aparece moendo as inimigas num moedor de carne e segurando tão bem uma personagem tão complexa como a dela. As duas indicadas ao Oscar e as duas provavelmente sairão de mãos abanando (depois não querem que eu fique nervosa com a Jennifer Lawrence), mas fica aqui meu respeito. De novo. E por favor, o que é a cena do jantar? Queria me enfiar embaixo da mesa de tanto constrangimento e climão reunidos. Ah é: o queridinho do Tumblr, Benedict Cumberbatch, integra o elenco também, num papel pequeno, mas significativo o suficiente pra me deixar com vontade de conhecê-lo melhor.

The holiday (Nancy Meyers, 2006): Já tinha visto esse filme uma vez, há tantos anos que acho que foi até no cinema. Mas ele não significou absolutamente nada na época, tanto que eu não lembrava dele. E muita gente tem um carinho enorme pela história, então resolvi rever. No fim das contas, adorei muito! Acho o máximo como nos filmes tudo é muito simples e tranquilo e é absolutamente natural você ir passar uma temporada na casa de uma completa estranha, que vai também ficar duas semanas na sua casa. Adoro como nos filmes as pessoas decidem isso de um dia pro outro e nem rola uma preocupação. Queria que na vida real fosse assim também, porque adoraria passar uma temporada em outro país, em outra casa e até numa outra vida, com Jude Law, de preferência. Apesar de ganhar no quesito beleza-do-mocinho, a aventura da Cameron Diaz perde feio para a da Kate Winslet, que é uma pessoa bem mais legal e vive coisas fantásticas em Los Angeles. Ivy, queria ser você. Até pegaria o Jack Black (ok, nem tanto).

Ju-On (Takashi Shimizu, 2002) Já tinha tentado assistir a essa versão japonesa de O Grito, mas larguei porque não estava achando a mínima graça. Só que esse filme aparece em quase todas as listas de filmes mais assustadores do mundo, e eu precisava entender o por quê. Ah, o Japão! Filmes japoneses são cheios de melindres, de terror principalmente, e é preciso entender isso e embarcar na proposta pra conseguir assistir e apreciar Ju-On. É um jeito totalmente diferente de se fazer terror: outro timing, outra perspectiva. Não tem susto, mudança brusca de trilha sonora ou cara feia. Os fantasmas não aparecem de relance, mas andam do lado dos personagens, com uma maquiagem exagerada, teatral, enfim, outra história. É bem mais perturbador do que assustador, e ele tem lá seu mérito. A história me lembrou muito a de O Iluminado e a continuação do filme ajuda a entender com mais profundidade algumas coisas que ficam soltas no primeiro. Pelo menos foi o que eu li. Esse diretor trabalhou por anos com essa inspiração, e tem um curta (bem curtinho) bacana que ele fez com os mesmos elementos de Ju-On. Vale a pena assistir pra entender o que eu estou falando sobre a vibe do horror japonês: 4444444444

Frozen (Chris Buck e Jennifer Lee, 2013): Primeiro cinema de 2014, para começar o ano com a magia Disney aquecendo o coração. Fui assistir com meus primos babys e confesso que no início estava morrendo de preguiça e com medo de morrer de tédio. Mas estava super enganada, porque o filme é um amorzinho. Me diverti horrores, me segurei para não cantar junto, dei várias choradinhas e me apaixonei por todos os personagens! É legal também porque, na medida do possível, o filme desconstrói um pouco a imagem clássica da princesa que precisa ser salva, e coloca como foco central da história não o amor entre uma mocinha e um mocinho, mas sim o relacionamento (muito realista) de duas irmãs. Achei essa virada bem positiva e tem um texto bem bacana no Hellogiggles falando sobre esse movimento recente, de trazer mais realidade para histórias infantis.

Confissões de adolescente (Daniel Filho, 2014): Me surpreendeu bastante, principalmente por causa do realismo de várias situações. Fiquei com medo de ser uma coisa meio Malhacão, com histórias e personagens que simplesmente não existem na vida real, mas não foi nada disso. Achei que eles pesaram a mão em alguns momentos, e algumas situações ainda ficam com um pé na idealização, mas, no geral, achei um filme MUITO divertido, pouco moralista e despretensioso. Acho que foi por isso que gostei tanto. A trilha sonora é bem bacaninha e vai de Clarice Falcão a Gal Costa, até escrevi sobre ela na minha coluna lá no Move That Jukebox. Gostei tanto que até me animei para ver a série (tem quase tudo no Youtube) e fiquei com vontade de ler o livro. Vamos ver até onde isso vai. 

domingo, 19 de janeiro de 2014

Somos todas Frances Ha


Um dos meus trechos favoritos de The Bell Jar, da Sylvia Plath, é um logo no começo no qual a Esther diz que o melhor truque para se lançar mão quando você está num jantar chique e não sabe qual colher usar é simplesmente fazer o que te dar na telha, mas com uma arrogância segura de quem sabe perfeitamente o que está fazendo. Assim, mesmo se você estiver errada, ao invés de pensarem que você não é fina o suficiente, as pessoas vão olhar pra você como alguém original e muito, muito esperta. Eu acho esse conselho uma sabedoria para levar não apenas para a mesa, mas para a vida.

No fundo, fico pensando se por trás de uma fachada de confiança as pessoas não estão todas se perguntando qual é a colher apropriada para aquela sopinha chique. Eu acho que estão. 

O negócio é que elas disfarçam bem demais, e o que resta sou eu fazendo um uni-duni-tê mental antes de me arriscar no garfo mais à direita, enquanto penso que só pode ter alguma coisa muito errada acontecendo para eu ser a única que não sabe quantos dentes tem um garfo de peixe. Acho que é por isso que eu sempre gostei tanto de ficção realista, que esbofeta, cospe na minha cara, me faz querer nunca mais sair da cama - mas ao mesmo tempo me diz: queridona, pelo menos você não se ferrou sozinha. 

É por isso que eu adorei Girls e ainda adoro a proposta da série, mesmo que tenha abandonado no meio da segunda temporada. Eu escrevi bastante sobre ela, mas nunca aqui no blog, o que é bem engraçado. Mas o que eu gostava, basicamente, era de ver o universo feminino retratado de uma forma mais crua, com personagens exorcizando demônios muito cabeludos, do tipo que a gente se identifica até na espinha mas não tem coragem de admitir em voz alta. Eu adoro isso e a abordagem tough-love funciona comigo que é uma beleza. Mas em Girls é tudo tão torto que até meu coração gelado clama por clemência, e eu cheguei num ponto que estava odiando tanto aquelas personagens, aquelas situações, e aqueles diálogos, que larguei.

E aí, quase um ano depois de eu jogar a toalha, Frances Ha entrou na minha vida. Me parecia um filme de Tumblr como tantos por aí e eu sabia que ia amar porque sou presa fácil de fotografia bonita e frases de impacto, mas eu não sabia que amaria tanto assim. O que me encanta em Frances Ha é basicamente o fato de ser um filme realista e doído demais sobre crescimento, sem deixar de ser um filme doce. Todo mundo precisa de colo, um beijinho na testa que ajude a seguir em frente, uma música do David Bowie, que seja.


O filme conta a história de Frances, uma mocinha de vinte e tantos anos vivendo em Nova York e tentando ser alguém. Minha fala favorita dela no filme é: eu ainda não sou uma pessoa de verdade. Isso é dito quando o cartão de crédito dela não passa logo quando ela convida um amigo descolado para jantar por conta de sua restituição de imposto de renda. Orgulhosa, ela resolve ir correndo a um caixa eletrônico para sacar o dinheiro e muitos quarteirões e um tombo depois, ela consegue. Eu poderia fazer um paralelo dessa cena com um milhão e meio de situações da minha vida, da mesma forma que poderia fazer um paralelo desse filme com um milhão e meio de situações da minha vida.

É bem verdade que Frances não sabe o que está fazendo, e não ajuda o fato de as pessoas ao seu redor estarem com a vida tão encaminhada, com cada vez menos espaço para ela e seus movimentos desengonçados. Ela toma quinhentas porradas do destino, mas como diz a letra de Modern Love, que toca enquanto ela rodopia por Manhattan, ela segue tentando. Uma das sequências mais desoladoras pra mim é quando ela resolve ir para Paris, numa fuga desesperada de seus problemas e: é uma merda. Frances passa o fim de semana sozinha, dorme durante a maior parte dele, encontra todas as lojas fechadas e nem tem coragem de contar para a melhor amiga da sua aventura, porque ela sabe a mentira patética que foram aqueles dias.


Só que tudo é tão lindo, sabe? A própria Greta Gerwig, protagonista e uma das roteiristas, é aquele tipo de pessoa que a gente não sabe se é muito bonita ou muito feia. Ela está sempre descabelada, usando umas roupas que ficam no limiar entre o descolado e o estranho-de-um-jeito-ruim, com tiradas que às vezes são ótimas e em outras são simplesmente inapropriadas. Mas a fotografia é toda em preto e branco para homenagear a nouvelle-vague e é impossível não lembrar de Manhattan, do Woody Allen. A trilha é incrível, os personagens, de modo geral, são bem abraçáveis, e as cenas de dança são lindas. Alerta de spoiler: o final é feliz. 

Dá pra ser realista sem cuspir na cara. Não é menos corajoso deixar uma nesga de esperança. E não faz mal associar as desventuras de Frances com um milhão e meio de situações na vida. O fato de as pessoas amarem tanto esse filme e afirmar identificação profunda só mostra que no fundo elas estão tentando tanto quanto eu e você. Algumas mais descabeladas, outras menos, mas é mais fácil respirar no lado adulto da vida quando olho pra pessoa na minha frente e penso que ela também pode não saber comer peixe do jeito certo, ou que aquele entrevistado está tão assustado como eu, qualquer que seja o seu motivo. 

Foi para registrar para a posteridade essa pequena iluminação para vida que resolvi que faria o novo layout do blog com a temática Frances-Hazística, para todas aquelas vezes que eu tivesse certeza absoluta de que eu era uma mentira e nunca mais conseguiria escrever um parágrafo que prestasse, eu olhasse para Frances correndo, cantarolasse Modern Love e pensasse: ufa, tá tudo bem. Mas se algum dia eu fui boa em matéria de editar layout e configurar HTML5, esse dia passou - um paralelo na vertente design/programação da sequência de Frances correndo para sacar o dinheiro e pagar o jantar. Não ficou do jeito que eu queria, mas ficou assim. Ainda não está tudo pronto porque longo é o trabalho e breve o fim de semana, mas a gente vai dando um jeito.

(Eu juro que minha intenção era fazer um post de dois parágrafos falando sobre o layout novo. Talvez meu professor esteja certo quando diz que eu preciso de foco na minha vida)

Ps.: Fiquei muito feliz com a repercussão do meu post sobre a Jennifer Lawrence! Confesso que postei morrendo de medo do fandom alucinado da moça, mas as respostas foram, em sua maioria esmagadora, muito positivas. O que foi mais legal: um monte de gente que ama a J-Law e queria ser amiga dela gostou do post e trocou ideias muito bacanas nos comentários. Fiquei felizona e com vontade de escrever mais polêmicas, hahaha. (Sério, alguém tem alguma sugestão?)

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

A problemática da Jennifer Lawrence

Eu não odeio a Jennifer Lawrence.

Na verdade, eu nem desgosto da Jennifer Lawrence.

Eu não acho a Jennifer Lawrence uma má atriz.

Na verdade, eu até acho a Jennifer Lawrence uma atriz bem competente.

Acho importante deixar tudo isso claro, assim bem pausadamente, com calma, respirando fundo, porque há uns três anos (!) eu inventei de falar mal de um clipe da Avril Lavigne e até hoje (!!) recebo comentários dizendo que sou feia, boba e recalcada por causa disso. O que as pessoas não sabem é que tenho os dois primeiros discos dela tatuados na alma e que dirijo cantando "Complicated" sem medo algum de ser feliz. Por isso, por precaução, acho bom frisar que não odeio a moça, tenho poucas coisas contra ela e torço pra que seja feliz - ainda mais agora que eu soube, com anos de atraso, que ela tem uma longa história com o carinha que fazia o Tony em Skins (que melhorou bastante desde Skins).

Aliás, essa história de recalque já deu, né? Sei lá, será que as pessoas não conseguem conceber que o fato de alguém não amar alguma coisa pode significar pura e simplesmente que ela não ama aquilo tanto assim? Tipo, meu melhor amigo odeia Friends e odeia Strokes, mas nem por isso eu fico dizendo pra ele que é só recalque por ele não ser tão engraçado como o Chandler ou tão gato como o Fabrizio Moretti, sabe. São coisas que acontecem.

Toda essa lenga-lenda pra dizer que eu não amo a Jennifer Lawrence e nem acho ela a pessoa mais legal do mundo. E isso, queridos leitores, faz com que eu me sinta uma aberração na internet. Basta a moça surgir no tapete vermelho pra todo mundo começar a querer colocar a mãe no eBay em troca da amizade da moça. E ela aparece cheia de caretas, fazendo gracinha, fugindo do protocolo e fazendo de conta que não está nem aí pra nada, como um Twitter de zoeira na vida real, como uma sequência de gifs esperando para estampar um destaque no BuzzFeed. Chega uma hora que isso cansa. Ela é inegavelmente carismática, mas não compro essa espontaneidade simplesmente porque quando um microfone chega na moça e você sabe que ela vai fazer graça, sabe que ela vai dizer algo pouco convencional e sabe que ela vai tirar sarro de alguma convenção hollywoodiana, isso deixa de ser algo tão espontâneo assim. Inusitado pra mim é ver Emma Thompson apresentando uma categoria descalça, bêbada, Louboutins em uma mão e drink na outra ou Amy Poehler recebendo o Globo de Ouro e declarando: eu nunca ganho, então não acredito que ganhei, claramente desconsertada.

Até porque algumas coisas que ela diz me parecem saídas da cabeça de alguém que podia ter colocado um Rivotril embaixo da língua (piada ótima que vi no Twitter ontem e esqueci a autoria) mas esqueceu. Como na explicação para o tombo que ela levou no Oscar, que chegou nas manchetes brasileiras como se ela estivesse pensando em bolo e caiu, mas na verdade, segundo a moça, o stylist avisou kick, walk e ela confundiu com cakewalk. Gente. Por favor.

E mesmo que ela estivesse pensando no raio do bolo (e olha que eu colocaria muita gente no eBay em troca de bolo), quem pensa nisso depois que ganha o primeiro Oscar da carreira? I rest my case.


Oscar é um outro ponto sensível. Me irrita o fato da atuação dela ser tão superestimada pela indústria e pela Academia, principalmente quando eu vejo tanta gente boa ser subestimada. Assisti Inverno da Alma, os dois Jogos Vorazes e O Lado Bom da Vida e embora eu concorde que o trabalho que ela entrega em todos eles seja bem honesto, pra mim nunca foi algo memorável ou que valesse um Oscar. Uma indicação, talvez, mas sair com um Oscar embaixo do braço por conta de O Lado Bom da Vida? Caras, menos, bem menos. Se fôssemos seguir esses critérios, Julia Roberts, Meg Ryan e Michelle Pffeifer deveriam exigir um prêmio de life-time achievement cada. Não assisti American Hustle ainda e pode ser que eu mude de ideia, mas por enquanto a única que tá liberada a ser indicada em tudo quanto é premiação é a Meryl Streep. E sobre ela, Cameron Tucker explica melhor que eu:


Por fim, uma pequena polêmica: eu sempre, SEMPRE, vou dar a maior força para quem coloca em xeque alguns padrões de beleza. Eu nunca vou ser contra uma mulher que serve como modelo para que as mulheres sejam mais felizes com seus corpos. E J.Law é uma dessas embaixadoras de um modelo positivo do corpo, e isso me deixa muito feliz. No entanto, li dois textos recentemente que questionam não as intenções dela, mas a mensagem que essa postura pode passar se analisarmos mais de perto. Quem levantou a problematização original foi a Jenny Trout, do Huffington Post, que comparou a Jennifer Lawrence, que já declarou cem mil vezes que odeia dieta, come sem parar e adora junk food, com a Melissa McCarthy, uma atriz gorda que sustenta uma postura meio apologética com relação à própria aparência, ao declarar que possui hábitos alimentares saudáveis, etc. Ou seja, a gente acha a Jennifer corajosa por dar uma banana pras loucuras da patrulha da imagem, mas esquecemos de que, querendo ou não, ela é maravilhosa e tem um corpão. Ok que tem uns lunáticos que insistem em dizer que ela é gordinha, mas no mundo das pessoas normais é evidente que não. Será que se a Melissa McCarthy saísse por aí falando que adora junk food e que vai mandar se foder o primeiro que sugerir uma dieta todo mundo ia achar tão bonitinho, engraçado e irreverente ou a patrulha da vida saudável chegaria cheia de ressalvas?

When it comes to body image, we allow thin and beautiful women to love themselves or claim to not care about beauty standards, and then call them brave for doing so. On the occasion that we laud fat women (or women who are considered ugly in any capacity) for their self esteem, we do in such a patronizing way that it’s very clear that she loves herself in spite of a glaring shortcoming that we’ll continue to point out. Every time Jennifer Lawrence and other female celebrities claim that they don’t care that she’s “chubby,” she makes it clear that chubby is less desirable than the way she actually is, which is conventionally perfect.



Resolvi escrever esse post porque toda vez que falo qualquer coisa dessa mulher vem alguém tirar satisfação, como se eu devesse alguma. E como é um saco explicar isso em 140 caracteres para 15 pessoas diferentes, agora já tenho um link pronto para futuros esclarecimentos. Meu problema com a Jennifer Lawrence é que ela não é a atriz mais legal do mundo, nem a mais espontânea, nem a mais corajosa e nem a melhor, mas a internet me enfia isso goela abaixo todos os dias. 

Mas no fundo eu juro que queria gostar dela tanto quanto vocês, acho bonitinho. Eu sei que não parece, mas no fundo eu sempre prefiro gostar. 

sábado, 11 de janeiro de 2014

A mulher de sucesso que vou ser em 2014

Ou: aquele com a agenda 


Ano passado escrevi aqui sobre minha teoria baseada em fatos do mundo paralelo das gêmeas Olsen que uma mulher de sucesso é produto de uma agenda organizada, recheada e toda cheia de rabiscos coloridos e compromissos importantes. Sei que não faz muito sentido, mas é essa ideia que me faz comprar uma agenda todos os anos, mesmo que não use o suficiente pra justificar o dinheiro investido. Esse ano não foi diferente, e pra apresentar o motor do meu futuro sucesso nesse ano que começa, segui a proposta da Analu de mostrar minha agenda de 2014 em vídeo - e acabei mostrando as agendas de 2013 e 2012 também, porque eu não tenho limites. 

Espero que gostem e deixo o convite para quem quiser também compartilhar a agenda do ano, seja em vídeo, texto, foto, tanto faz. Aguardo vocês!


segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Love songs for my next year

Acho que já passamos da fase de receber um ano novo pedindo por amor, né? É isso que eu fico pensando, ou melhor, é isso que aquele bichinho da auto-censura fica me dizendo o tempo inteiro. Mas, apesar dele, no mês passado me vi reunindo uma coleção de músicas amor das mais amorzinho que consegui encontrar na minha biblioteca, e achei que seria interessante colocá-la aqui para abrir esse ano. A Marie disse que tinha um pouco de receio de montar uma playlist para o ano, como se quisesse ditar o que ele iria ser e depois dar com a cara na porta. Longe de mim querer ser mais sábia que Deus ou a vida com relação ao rumo das coisas, mas uma inspiração sempre vai bem. Assim, como quem não quer nada. Vai que.


01 Tender (Blur)
02 To me you are a work of art (Morrissey)
03 Strange magic (Electric Light Orchestra)
04 Amante à moda antiga (Roberto Carlos)
05 Whole love (Wilco)
06 Estive (Vanguart)
07 Crown of love (Arcade Fire)
08 Pega rapaz (Rita Lee)
09 Maybe I'm amazed (Paul McCartney)
10 Do I wanna know? (Arctic Monkeys)
11 Friozinho (Nevilton)
12 You can't hurry love (The Concretes)
13 Je ne sais pas (Joyce Jonathan)
14 Macaé (Clarice Falcão)
15 Inside of love (Nada Surf)
16 Brown eyes (Lady Gaga)
17 All the fish in the sea are stupid sluts anyway (Big Japan)
18 You can't always get what you want (The Rolling Stones)

A seleção abre com Tender, do Blur, e ela meio que zera a mixtape logo na largada: sete minutos e meio de Damon Albarn repetindo Lord I need to find someone who can heal my mind e com seu timbre de voz incrível selando na nossa alma que love's the greatest thing that we have. E dá-lhe espera por esse sentimento! Não é uma música, é um hino. Mesmo se estiver com preguiça de ouvir a mixtape inteira, não deixe de ouvir Tender. É sério. Faça isso pelo seu coração. 

Em seguida, e eu sei que o timing não poderia ser pior, temos senhor Morrissey matando a pau logo no título, pra compensar: To me you are a work of art. É uma música linda, mas não deixa de ser uma música linda de amor do Morrissey. Quem mais diria que o mundo o faz vomitar, mas na pessoa amada ele vê uma pequena esperança? É fofo, vai! Mais fofo que isso só a balada dos anos 70, Strange Magic, da Electric Light Orchestra, saída direto da trilha de As Virgens Suicidas, a música que Lux Lisbon dança coladinha com Trip Fontaine. Seguindo nessa vibe bailinho da mocidade, Amante à moda antiga, do nosso amigo-de-fé-irmão-camarada Roberto Carlos. Ele só tem nos decepcionado ultimamente, mas ainda dá pra amar ele de tênis velho, calça desbotada, chamando de querida a namorada. 

Depois, vamos abraçar Jeff Tweedy em uma das minhas músicas favoritas do Wilco (suspiros): Whole love. Hélio Flanders se junta ao abraço depois, já que no novo CD do Vanguart ele está mais apaixonado do que nunca (e não é por mim, minuto de silêncio), derramando amor em todas as faixas, sendo Estive uma das mais singelas. Arcade Fire, uma das bandas do momento, faz sua contribuição com Crown of love, sobre um amor em crise, é verdade, mas os arranjos dela são tão maravilhosos que não consigo deixar de fora. Para quebrar a melancolia, Rita Lee sempre fantástica com Pega rapaz e sua cama voadora fazedora de amor (depois de ver Confissões de Adolescente esse verso passou a fazer total sentido).

Como na outra mixtape amorzinho que fiz pro blog, também não consegui deixar Paul McCartney de fora, e dessa vez a artilharia é pesada porque é uma música para a Linda, que ainda por cima aparece em The O.C. (num cover lindinho feito pela Jem). Preferi o original de Sir Macca porque ele é cafona e perfeito como o amor. Do I wanna know?, do Arctic Monkeys, por sua vez, é a declaração de amor do nosso século: maybe I'm too busy being yours to fall for somebody new. Apenas. 

Na sequência, Nevilton e o friozinho na barriga que nos mantém vivos e sem respirar com a ajuda de aparelhos, The Concretes com o aviso sábio de que não podemos apressar o amor, e a recém descoberta (por mim) Joyce Jonathan com Je ne sais pas pra cobrir uma cota que eu inventei agora de músicas em francês, já que agora eu sou uma pessoa que leva o curso de francês realmente a sério. Claricinha Falcão vem com seu amor stalker-maníaco-obsessivo de Macaé e aquele drama nosso de cada dia: eu queria tanto que você não fugisse de mim, mas se fosse eu, eu fugia. Eu fugiria também, Clarice. De mim e de você. A dorzinha no coração da vez quem entrega é o Nada Surf com Inside of love, porque a letra dói e também porque ela é tema do casal que eu amo de Wonderfalls e toda vez que eu escuto tenho vontade de chorar de amor. 

Pra encerrar, uma surpresa: Brown eyes, da Lady Gaga, porque eu amo mesmo essa música, dá licença? Depois, Big Japan, a banda flopada do Adam Brody (sim, ele toca bateria!!!!), tentando nos convencer que não somos só mais um peixinho nesse marzão de gente sozinha desesperada por amor. Que bom. Ela ia acabar por aí mesmo, mas depois de conversar com a Marie resolvi fechar com Rolling Stones, pra internalizar a mensagem e levar não só pro ano, mas pra vida: you can't always get what you want, but if you try sometimes you might find you get what you need!

Amém!

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Retrospectiva literária de 2013

Não sei porque acho meio zicado fazer retrospectivas depois que o ano já acabou, mas eu já sou muito pouco ortodoxa pra dar as costas a uma tradição do blog que existe desde 2010 (!). Acho mais dinâmico falar sobre livros em vídeo, mas tentei umas três vezes e odiei todos os resultados. Sendo assim, vou fazer em formato escrito mesmo, usando aquele questionário já clássico por aqui montado pela Tary em 2010, com algumas categorias que eu adicionei em 2011. Em 2012, fiz um vídeo falando apenas dos melhores livros do ano, fica aqui pra quem ainda não viu ou quer relembrar. E vamos para as leituras de 2013! 

O casal mais apaixonante

Anne e Peter, de O diário de Anne Frank: Talvez o casal principal de Vampire Academy fosse mais adequado a uma perspectiva shipping really really hard it's crazy, mas escolhi a Anne e o Peter sobretudo por causa da forma delicada, natural e inegavelmente real que o romance deles é construído. Não existe forma melhor para acompanhar o nascimento de um amor do que através do diário de uma das partes, e uma das várias coisas especiais, incríveis e emocionantes que vem quando acompanhamos o amadurecimento de Anne (muitas vezes à fórceps, dadas as circunstâncias) é observar um relato em primeira mão sobre esse sentimento tão tímido e tão sincero. É tipo Hazel e Gus mas na vida real: I feel in love the way you fell asleep: slowly and then all at once.

Virei a noite lendo

Série Vampire Academy, Richelle Mead: Não exatamente virei a noite, porque ainda não estou por conta, mas parafraseando a Couth, foram esses livros escritos com cocaína os culpados por várias noites em que me peguei indo dormir às três e meia da manhã porque não conseguia desapegar de Rose, Dimitri, Lissa e Adrian. Ainda quero escrever mais sobre a série, mas o fato é que fazia tempo que não me envolvia dessa forma com uma saga xovem e muito sinceramente não sinto a menor vergonha em admiti-lo. Estou terminando o quinto volume, o penúltimo, e isso significaria que estou quase no fim, não fosse pelo spin-off, que já tem um monte de volumes lançados nos EUA, aos quais eu não sei se vou resistir por muito tempo, já tendo lido o primeiro

Chorei de soluçar

Extraordinário, R.J. Palacio: Não só solucei como o fiz em público, num ônibus cheio às cinco e meia da tarde. Tinha algumas ressalvas com relação a esse livro porque tenho uma preguiça monstruosa de histórias melodramáticas de superação e era isso que eu pensava que esse livro seria, afinal é a história de um garoto de 11 anos com o rosto deformado indo para a escola pela primeira vez. No entanto, o livro é tão honesto, tão real, e tão bonito (do jeito menos piegas possível) que é preciso ter o coração muito gelado para não ser tocada profundamente pela história. Chorei, chorei com gosto, e choraria de novo sem pudores.
O diário de Anne Frank, Anne Frank: Esse choro foi bem menos poético e muito mais doído. Terminei o livro com uma dor muito enorme e chorei uma manhã inteira por Anne, sua família e todas as pessoas que viveram o mesmo que eles. Mas foi absolutamente necessário. Coloco Verdinho na roda de novo: a dor precisa ser sentida.

Decepção do ano

Bling Ring, Nancy Jo Salles: Minha obsessão pela história da quadrilha de adolescentes de classe média alta que invadia a casa de celebridades para roubar roupas, sapatos, dentre outras banalidades surgiu em 2010, quando assisti o reality show de uma das participantes, o Pretty Wild. Na época, Nancy Jo Salles, repórter da Vanity Fair, escreveu uma reportagem de fôlego a respeito do caso, e três anos depois resolveu estender o relato em um livro. A estrutura do texto intercala a narração dos fatos e uma análise minuciosa e bem amarrada sobre a sociedade americana, sua juventude transviada e o que pode ter levado a um caso tão absurdo como esse, e tudo isso ancorado em vários exemplos de cultura pop, etc. A parte analítica é realmente muito bem feita e foi o que fez a leitura valer a pena, mas a parte jornalística da coisa é tão errada e mal feita que é difícil acreditar que a mesma pessoa escreveu as duas coisas. A falta de fontes primárias (jornalismo 101) dificulta mesmo o processo, já que só um dos envolvidos topou abrir o jogo e, pra cada declaração que ele dava sobre o desdobramento do caso, Nancy Jo precisava destacar o depoimento dos outros envolvidos, que contradiziam o primeiro. Chega uma hora que essa repetição fica insuportável e a história se torna confusa, não se sabe mais quem fez o que e é difícil acreditar em alguma das partes envolvidas. Outro grande problema é a forma como a jornalista julga e debocha dos personagens, como se ela precisasse (e tivesse o direito de) ser uma bússola moral da história - o que entra em contradição com o que ela conclui na análise, que a Bling Ring é o produto de uma sociedade americana dodói da cabeça. Enfim, esperava mais.

Livro irrelevante do ano

O sol é para todos, Harper Lee: Antes de ser açoitada em praça pública, queria dizer que esse é um daqueles casos em que eu olho pro livro e digo: não é você, sou eu. Porque o problema sou eu mesmo. Passei por uma ressaca literária bem tensa em 2013 e O sol é para todos teve o azar de estar na minha mão durante esse processo. Demorei bem mais do que deveria para lê-lo, passava mais de uma semana sem pegar nele e por isso não me conectei com a história. Definitivamente gostei quando terminei, mas hoje não lembro de mais nada a respeito. 

Grifei

Paper towns, John Green: Li três livros do John Green esse ano e foi só no último que pude vivenciar de novo o fenômeno de iluminação pra vida provocado por A Culpa É Das Estrelas. Paper towns me revirou por dentro, ficou na minha cabeça por dias, semanas, meses e eu me peguei repetindo várias de suas frases mentalmente, ruminando aquela história, pensando até a cabeça fundir em tudo que Quentin descobriu enquanto seguia as pistas atrás da enigmática Margo Roth-Spiegelman, em todas as colocações fantásticas, em todas as vezes que o Ben foi o cara mais legal do mundo e não tinha como experimentar tudo isso sem grifar marcar civilizadamente com flags tudo que me tirou o ar, para poder voltar ali depois e pirar com aquilo tudo novamente. Melhor quote: What a treacherous thing it is, to believe that a person is more than a person.
The bell jar, Sylvia Plath: Não só o livro em que eu mais destaquei as passagens esse ano, mas o livro mais marcado da minha estante e, acreditem, isso é muito. Sylvinha Plath apenas coloca no papel aquilo que eu sinto a vida toda, o tempo inteiro, mas nunca fui esclarecida o suficiente para conseguir definir e muito menos gênia o bastante para colocar em palavras. E isso ela faz com perfeição esse livro inteiro. 

O pior livro de 2013

Por isso a gente acabou, Daniel Handler: 2013 foi um ano tão proveitoso literariamente que esse foi o único livro que destaquei como genuina e inegavelmente ruim. Já fiz um vídeo inteiro falando (mal) dele, por isso não vou me estender muito. Os piores problemas pra mim estão na obviedade da trama, na insuportável personagem principal (que narra a história e estraga tudo), e também no desânimo que bate quando um livro que tinha tanto pra dar certo (e que é ilustrado de forma tão linda!) dá tão errado. 

Soco no estômago

Morte súbita, J. K. Rowling: O primeiro romance adulto da tia Jo não tem nada em comum com Harry Potter, tirando a construção impecável dos personagens e a narrativa que nos envolve do começo até o fim. A morte de Barry Fairbrother afeta todos os moradores da cidadezinha de Pagford, cada um de uma maneira diferente. Ao longo do livro, uma tensão crescente toma conta do livro e você sabe que vai dar merda, e das grandes, mas eu não estava preparada pra pancada. Fiquei pensando no final desse livro por semanas, sem me conformar com a forma seca que tudo se descarrilha e amando muito a autora por isso. 
O olho da rua, Eliane Brum: Não economizo as ressalvas para esse livro, principalmente porque o texto da Eliane Brum não me agrada nem um pouco, mas essa coleção de reportagens feitas por ela sobre diferentes personagens invisíveis socialmente mexeu muito comigo. A matéria sobre as mães cujos filhos - jovens - foram mortos pelo tráfico de drogas no Rio de Janeiro foi certamente uma das coisas mais impressionantes e tristes e devastadoras que eu já li na vida.

Melhor final

The great Gatsby, F. Scott Fitzgerald: Tento ler pelo menos um classicão-importante-que-todo-mundo-tem-que-ler por ano, e 2013 foi a vez de tirar o atraso com Fitzgerald e ler Gatsby. Ele também me pegou em plena ressaca literária, mas foi o livro que me ajudou a sair dela, sobretudo por conta do final. Como contei antes, a leitura se arrastou por mais de um mês (e o livro é bem fino), mas as últimas cinquenta páginas passaram num sopro e num susto. Cheguei aos últimos parágrafos quase suando frio diante da genialidade do autor e também da forma majestosa como a história é construída e a imagem poderosa que a encerra. Se minha vida fosse um filme, meus cabelos estariam voando enquanto eu encarava uma luz verde irradiando das páginas do livro. Definitivamente, classicão que NECESSITA ser lido por todos. 
Serena, Ian McEwan: Romance de espionagem sensacional, que eu li nas férias e deixei de entrar no mar várias vezes só pra ler mais um capitulozinho. Não posso dizer muito a respeito do final para não estragar pra quem não leu ainda, só digo que Ian McEwan manja das coisas e pobre de quem acha que está mais no controle da situação do que ele.

Abandonei

Dez dias que abalaram o mundo, John Reed: Relato a respeito da revolução russa escrito por um jornalista americano que estava lá quando tudo aconteceu e escreveu o trabalho na chama vermelha do momento. O único problema foi que peguei da biblioteca da universidade e a edição era antiga, certamente de uma época em que revisão era uma coisa extremamente subestimada. Desorganizado, confuso, sem nenhuma nota de editor quando elas são muito necessárias: arreguei. Mas não desisti.
Uma confraria de tolos, John Kennedy Toole: Outra vítima da ressaca literária, mas já estou recuperando o tempo perdido porque voltei a lê-lo na última semana, desde o começo, e já adianto que é genial.
Profissões para mulheres e outros artigos feministas, Virginia Woolf: Deixei pra depois porque essa coleção de artigos e resenhas literárias não é o tipo de coisa que se lê de uma vez. Mas o discurso que abre o livro (Profissões para mulheres) já valeu por um livro inteiro, mudou minha percepção e me fez ter coragem para encarar um romance da autora em 2014.

Morri de rir

I've got your number, Sophie Kinsella: Eu não sei porque negligencio tanto os chick-lits da vida. Não é pedantismo, juro, mas eles simplesmente nunca caem na minha mão. Graças a esse livro ficarei mais atenta, principalmente aos trabalhos da Sophie Kinsella, porque não apenas morri de rir como ri alto na sala de aula. Poppy, a protagonista, perde o anel de noivado (uma jóia de família!) a poucas semanas do casamento, depois perde o celular e se enfia nas situações mais absurdas e constrangedoras do universo. Quando você pensa que ela não podia se humilhar mais, alguma coisa acontece, mas o bacana é que a personagem sabe rir de si mesma e encontra alguém capaz de rir junto com ela.

Aventura, fantasia ou infanto-juvenil

O oceano no fim do caminho, Neil Gaiman: Meu primeiro Neil Gaiman da vida foi esse livro fininho, meio auto-biográfico e muito introspectivo que acredito que tenha sido o melhor tipo de introdução ao trabalho desse escritor que eu poderia ter. Não amei completamente porque achei a história muito curta para que eu me envolvesse completamente naquele universo, mas muitos dizem que a graça é justamente essa: a mágica acontece sem muitas explicações e também termina de repente, como uma memória de infância que a gente nunca sabe direito se aconteceu mesmo ou se foi tudo coisa da nossa cabeça. 

Bate-bola de personagens

Personagem masculino mais apaixonante: Ed Kennedy, de Eu sou o mensageiro, um loser realmente loser, mas com um coração tão enorme que faz dele um dos caras mais incríveis que já "conheci"; Ben Starling, de Paper towns, porque "I love you like a really drunk guy loves the best girl ever" é o tipo de declaração de amor de bêbado que me levaria pro altar; Adrian Ivashkov, de Vampire Academy e Bloodlines, por motivos de CRUSHING SO REALLY REALLY REALLY HARD IT'S CRAZY. 
Personagem feminina que eu queria ser: Sinceramente? Nenhuma. Mas personagens femininas badass e admiráveis que quero levar pra vida: Anne Frank, de O diário de Anne Frank, por motivos óbvios; Catherine Morland, de Northanger Abbey, por ser uma negação de tudo que se espera de uma heroína de um romance do século XIX, o que basicamente a torna uma heroína do século XXI que dá uma banana para as expectativas de sua geração; e Rose Hathaway, de Vampire Academy, porque as sagas teen merecem uma heroína que não espera que os outros a resgatem e que faz a própria sorte, mas que continua divertida e vulnerável, e não uma justiceira marrenta e insuportável. 
Personagem mais chato: Min Green, de Por isso a gente acabou, por motivos óbvios; e Colin Singleton, de An abundance of Katherines, por sentir pena demais de si mesmo e porque eu nunca tenho paciência para personagens com ego enorme e auto-estima insuficiente.
Personagem mais engraçado: Samantha Mollison, de Morte súbita, porque ela é errada, despeitada, e a sinceridade cortante dos seus pensamentos e as observações que ela faz sobre os moradores de Pagford são as melhores do mundo.
Personagem mais identificável: Esther Greenwood, de The bell jar, e isso me assusta mais do que eu poderia descrever.

O melhor livro de 2013

The bell jar, Sylvia Plath: Não tinha como ser outro. Esse livro me doeu da primeira até a última página, porque era tão eu de um jeito que assustava. Como disse acima, ele fala de coisas que eu nem tinha auto-conhecimento o suficiente para pensar sobre mim, mas que eu sempre pensei e isso foi jogado na minha cara durante a leitura. The bell jar me virou do avesso, tirou meu sono, me fez rir, chorar e me identificar, e acho que um bom livro é um livro que causa sensações desse tipo. Para quem não sabe, ele conta a história de uma garota de vinte anos que está vivendo (ou deveria estar vivendo) a melhor época da sua vida, mas no entanto ela não está feliz. E assim, lentamente, a gente acompanha sua descida rumo ao fundo do poço de uma depressão com traços de loucura, e parece tudo tão sutil, tão banal, que de repente ela divagando sobre os meios mais eficientes de se matar abre nossos olhos pra seriedade da coisa toda. O livro tem uns insights bem interessantes (e infelizmente muito atuais) sobre a situação feminina na época (meados dos anos 50) e é muito bacana mesmo ver a personagem criar uma consciência sobre sua condição de mulher, o que isso significa na época que ela vive, e todos os absurdos da sociedade em que vive, que pareciam tão rotineiros, serem escancarados de repente. Favorito do ano e um dos favoritos da vida. Parem o que estiverem fazendo e leiam Sylvia Plath.


Lista completa de leituras do ano