sexta-feira, 11 de maio de 2012

Artificial



Sou uma entusiasta do cinema nacional e não nego. Acredito no nosso talento e tenho esperanças de que conseguiremos criar uma tradição no ramo tão bacana quanto os argentinos. Nos últimos anos tenho notado um grande amadurecimento das produções, que conseguiram finalmente se distanciar daqueles grandes lugares-comuns involuntários que acabaram por caracterizar as produções brasileiras recentes: os "filmes de favela" ou aquelas com um apelo social gritante, os "contos regionais" ou comédias do Nordeste e os novelões globais. Falo aqui daqueles que chegam ao circuito nacional ou ao menos tentam muito (se esqueci de algo, me corrijam e indiquem nomes, por favor) e também digo lugares-comuns não num sentido negativo, gosto demais de várias obras dos subgêneros supracitados, mas me alegra assistir a novos dramas urbanos, histórias de família, retratos da juventude, que se desvinculam daquilo que já foi feito à exaustão.

Isto posto, posso dizer agora que fui assistir Paraísos Artificiais e saí da sala um pouco decepcionada. Quer dizer, eu nem tinha expectativas para o filme, porque soube a respeito dele na terça e fui vê-lo logo no sábado. Mal sabia a história. Sabia que era sobre drogas, tinha a Nathália Dill no elenco e fim. O filme conta a história de dois jovens, Érica e Nando, cujas caminhos se entrelaçam ao longo de anos em meio à traumas, música eletrônica e drogas. Pela entrevista que vi do diretor Marcos Prado na tv, entendi que o filme queria mostrar um pouco como era a cena eletrônica no país, o mundo das raves, e a forma como as ~drogas de balada~ rolavam soltas.

O filme fala disso sim, no entanto, ali pela segunda metade do filme, a gente tem contato com um drama mais profundo e infinitamente mais interessante do que vinha sendo tratado até então. Não sei se é porque eu simplesmente sou apaixonada e viciada em dramas desses que levam à angústia existencial profunda, mas sinto que essa história que o cara tinha nas mãos era bem mais legal do que sua proposta principal e que, infelizmente, foi mal explorada. Mal explorada porque ele se preocupou tanto em mostrar a "realidade nua e crua" com a droga rolando solta e grandes cenas de sexo, que se esqueceu de colocar tudo isso sobre uma base sólida que seria maior que aquilo tudo ou pelo menos justificaria os rocócós usados para trazer intensidade à trama. Ah, Almodóvar, se todos no mundo fossem iguais a você!

Preciso dizer também que achei o filme cheio de clichês, estigmas bem tradicionais quando a gente pensa em drogas. Porque se a cena dos "filmes de favela" abordam um lado dos clichêzões, Paraísos Artificiais aborda o outro, dos jovens de classe média assombrados pelos traumas do passado, sem saber direito o que querem da vida, curtindo dias de muita bala, tuntz-tuntz e sexo. Meio careta e moralista, penso eu. Não conheço muitos filmes junkies e sei que citar Trainspotting é balela, mas na minha humilde opinião, nenhum outro conseguiu tratar desse universo de forma tão crua  e sem pudores de modo a fazer com que a maioria das pessoas passasse a sentir uma repulsa horrível de qualquer tipo de droga sem recorrer a moralismo fácil algum. 

Fiquei incomodada com os aspectos acima porque sei que o impacto deles no espectador médio (aquele que não tem um interesse particular por cinema e que assiste filmes pelo entretenimento) provavelmente será negativo. Minha sessão estava completamente vazia, mas outros amigos meus que viram o filme disseram que o que eles mais viram foram pessoas abandonando a sala antes da hora. Certamente elas saíram de lá dizendo que não tem jeito, filme nacional só tem mesmo putaria e fim, não adianta dar chances. Infelizmente ainda carregamos esse fardo e Paraísos Artificiais contribui para isso, ainda que sem querer.

Não dá pra achar ruim um filme que tem uma história bacana (ainda que explorada pelas beiradas), execução interessante e edição de som fantástica, mas dá pra ficar triste ao ver que o resultado é algo mediano sendo que havia jeito de fazer daquilo uma coisa bem legal. 

Um último desabafo? Que cenas de viagem mais cafonas! Fiquei tão envergonhada naquela hora que a Erica sai vagando pelas falésias, fugindo dos búfalos, enquanto sua amiga sente o vento e nada pelada no mar que nem sei. Alguém também compartilha do meu horror? Só conseguia pensar na cena de viagem mais divertida e bacana de todas, o bar mitzvah de Um Homem Sério, e sentir uma pena enorme da Nathália Dill. 

13 comentários:

  1. Já reclamei muito sobre o cinema nacional, mas conforme fui amadurecendo, aprendi a dar certo valor. O problema é que nem os diretos daqui acreditam nessa arte. Eles insistem em imitar o estilo americano; indo dos enredos a fotografia. Acho que ainda não encontraram o "jeito brasileiro" de fazer cinema, se espelham demais no exterior. É lógico que isso, muitas vezes, acaba em merda. A prova é que Central do Brasil, O alto da compadecida, Tropa de elite e outros deram certo! Conseguiram manter nossa essência. Não adianta querer "fazer igual", tem que fazer como os brasileiros fazem.

    Assim que vi o trailer do Paraíso Artificial soube que seria mais do mesmo. Um filme global enchendo linguiça e afastando mais pessoas do nosso cinema. Sabe, os diretores deveriam parar pra pensar nas consequências antes de lançarem um troço desse. Não percebem que estão prejudicando o próprio trabalho?!

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    1. Del, não senti que Paraísos Artificiais seguindo a linha de novelão global não, mas acho que um certo exagero nas cenas ~polêmicas~ é que acaba por afastar o público e aumentar o preconceito. ):

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  2. Eu gosto de cinema nacional, mas ainda acho que os melhores filmes brasileiros são aqueles que eu ainda não vi. Porque é um nicho escondido, gente. Quase não encontro no cinema (só os que têm toda uma propaganda ao redor), e isso me entristece porque eu fico pensando, poxa, tem uma penca de filme com gente falando português, gente que eu conheço a cara, gente com talento, gente palpável, mas que eu não conheço. =/

    E tem esse, que eu sequer ouvi falar.
    Mas só pelo que voce falou, fiquei com dó da Nathalia Dill, porque eu acho ela uma ótima atriz. É chato quando o resultado final fica meia-boca =/

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  3. Eu adoro cinema nacional, não gostava antes por ter essa opinião de "é só putaria", mas daí comecei a ver uns undergrounds e me apaixonei. No entanto, tenho richa com esses filmes patrocinados pela Globo, onde atores mega conhecidos são os protagonistas. Os únicos que curti foram Auto da Compadecida, Tropa de Elite e Olga. O resto, prefiro com atores desconhecidos, parece que assim a trama é melhor explorada, porque quando o ator famoso faz parte, subestimam o resto das coisas que compoem o filme.
    Não me interessei por paraísos artificiais, mas pela sua descrição parece ser uma grande merda que tentou não ser e assim sendo, não verei.
    Ademais, concordo com sua opinião sobre o cinema nacional. Tenho fé em sua capacidade e rezo por mais filmes históricos e histórias fora dos esteriótipos pré formulados.
    Porém, não creio que alguem aqui chegue ao nível de Almodóvar algum dia, porque aquele ali, minha cara, é O gênio.
    Abraços <3

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  4. Esqueci de dizer que o lugar que melhor fala de drogas é Skins e deviam seguir esse exemplo no cinema.

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  5. A verdade é que a gente sempre tem que escolher ver alguns filmes em detrimento de outros e, geralmente, é o trailer (e o filmow, no meu caso) que ajuda nessa decisão. Por isso, quando eu vi o trailer de Paraísos Tropicais já nem me preocupei em colocá-lo na minha lista e, pelo visto, fiz bem. Pra ser bem sincero, me pareceu muito mais do mesmo e até um pouco apelativo. Eu não acho que dá pra generalizar que o cinema brasileiro seja assim, pelo contrário, mas é verdade que todo ano a gente tem uns filmes desses mergulhados em clichês e abordando sempre os mesmos temas e do mesmo jeito. (mas se isso faz sucesso, quem pode culpá-los?) Acho que você conseguiu se expressar muito bem quando disse que falta uma "base sólida", uma "justificação" nesse tipo de produção. A questão não é ter violência (Pulp Fiction e Fight Club oi), sexo ou drogas, o problema é que quando nada se encaixa em um contexto, em uma linha coerente, parece que estão lá só porque hoje em dia é quase obrigação usar pelo menos um desses temas.
    Tudo bem que eu nem assisti o filme, mas sabe que eu continuo sem vontade de ver? Ainda que tenha ficado >>bastante<< curioso pra conhecer essa trama mal-explorada que você falou... Talvez eu assista um dia, quem sabe.
    O último filme nacional que eu vi foi O Homem do Futuro, e gostei. Bem leve e um tanto clichê, mas divertido.
    Enfim, vamos acompanhar qual o próximo filme da Globo Fil--, digo, brasileiro e torcer para que cada vez mais os filmes mais alternativos - e interessantes - do nosso país saiam do limbo.
    Beijo ;)

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  6. Eu adoro cinema nacional. Meu filme preferido é Saneamento básico e O ano em que meus pais saíram de férias. E sabe por quê? Porque traz o dia-a-dia. São coisas simples. Histórias simples. São essas coisas que eu gosto nos filmes brasileiros.
    Olha, eu confio muito em ti no quesito filmes, e como eu já não estava muito afim de ver esse filme, digo: passo.
    Beijo!

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    1. P.S: li meu comentário agora e achei que repeti muito a palavra "filme/filmes". ahahaha E também um adendo: não acho a história do filme O ano em que meus pais saíram de férias simples, pelo contrário, me fez pensar em várias coisas e eu fiquei angustiada. Enfim. :)

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  7. Também tenho muita fé no cinema brasileiro. Acho que guardamos grandes talentos, e não falo apenas de atores. Porém, são filmes assim que rendem ao cinema nosso a fama que tem. Ainda não assisti Paraíso Artificial, mas pelas resenhas (além da sua) que li, ele surpreendeu, mas não positivamente. Enfim, nos resta aguardar pelo próximo lançamento, porque certamente tem muita coisa boa vindo por aí.

    Beijos!

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  8. ainda não vi o filme, mas tenho sérios problemas com esse provável moralismo. muitas vezes acaba sendo um pré-requisito quando um filme fala sobre drogas, ainda mais envolvendo a classe média.

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  9. Sou uma das não apreciadoras do cinema brasileiro. Mas, como gosto do trabalho da Natália Dill, vou fazer um esforço e ver esse filme, quem sabe mudo um pouco de ideia, nem que seja só por um único filme rss

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  10. Esse filme não chamou a minha atenção para me levar ao cinema. Olha que sou como você: uma entusiasta do cinema brasileiro e acredita que nós temos potencial sim.

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