segunda-feira, 30 de junho de 2014

É uma metáfora

Hoje começa mais uma semana de crônicas aqui no blog, dessa vez especial Copa do Mundo. A Copa está quase acabando, e eu senti uma necessidade absurda de registrar aqui o que foi viver o mundial mais legal de todos os tempos, mesmo do sofá e do Twitter. Espero que gostem da brincadeira!

Sou uma pessoa que gosta de metáforas, que as procura em tudo quanto é canto e quase sempre encontra, e por isso me sinto autorizada a dizer que acredito que elas sejam muito mais uma questão de retórica do que de analogia. Não sei o que Peirce teria a dizer sobre isso, mas eu acho mesmo que dá pra metaforizar qualquer coisa se você for bom de lábia o suficiente para sustentar a proposta.

Já o Nick Hornby, mais do que acreditar nas metáforas, acredita no futebol, muito, obsessivamente, e isso faz com que ele transforme essa fixação não só na espinha dorsal de sua história pessoal, que é o mote do seu livro Febre de Bola, como também numa grande analogia com a própria vida. E eu, sendo entusiasta de metáforas, da literatura do Nick Hornby, e do futebol, só consigo concordar com ele em absolutamente todos os paralelos traçados ao longo do livro (que eu estou adorando!) e vou além, me sentindo encorajada por ele para tirar minhas próprias conclusões exageradas e passionais.

Foram muitas desde que essa Copa maluca começou, mas a principal delas é a de que, tal qual a vida, o futebol é uma coisa terrivel e cruelmente injusta, e muito mais cheio de nuances do que um placar que conta quantas vezes cada time fez a rede balançar consegue exprimir. 

Estou falando, claro, do jogo de ontem da Holanda contra o México. Gosto muito das duas seleções e assisti a todos os seus jogos. Não sabia para quem torcer no início, mas os rumos da partida foram me deixando cada vez mais apegada com a seleção mexicana. Eles estavam visivelmente melhores na partida e a Holanda passou bons sufocos. Me pareceu muito lógico eles terem marcado no início do segundo tempo, mais lógico ainda quando, depois de almoçar correndo, eu voltei pra sala e vi que faltava menos de 10 minutos pro jogo acabar e o placar se mantinha. Eles iriam se classificar e mandar a Holanda pra casa. Eu não veria mais o Van Persie na minha TV, mas eu respeitava muito aqueles merricanos em campo. Foi então que, faltando seis minutos pro apito final, o jogo sofreu uma reviravolta digna de novela mexicana.


A Holanda marcou dois gols nesses seis minutos, um golaço do Sneijder e outro de pênalti, que tem gente duvidando se foi legítimo. Pessoas mais entendidas que eu comentaram que o México recuou e por isso levou, e mesmo que tenha sido exatamente isso, não consigo não achar o resultado injusto. Enquanto eu fazia um esforço muito grande para não chorar, meu pai deu um suspiro de uma tranquilidade quase profana e disse: futebol é assim, filha, quem não faz, toma, e o jogo só acaba quando termina; eles não fizeram, eles tomaram, e agora eles estão de fora. 

O mundo é mau, e a Holanda é pior ainda
Só que não é tão simples assim, ao menos não na minha cabeça. Racionalmente, claro, faz todo o sentido, mas eu nunca tive pretensão de ser uma pessoa pragmática. Aliás, pragmático mesmo é meu pai, e um dos motivos, talvez o único por trás de todas as nossas divergências de opinião, vem exatamente disso: ele enxerga o mundo de um jeito preto no branco, e eu insisto em focar no cinza. Meu pai é um cara liberal, que acredita no mercado, na individualidade, e adora esse papo de mérito. Eu arrepio os cabelos da nuca só de ouvir falar nisso. Enxergo os fatos concretos como a ponta do iceberg que flutua acima de um contexto mais denso e complicado, que determina a envergadura e todas as outras características daquela pontinha visível. 

O que me deixa desgraçada das ideias é que, tanto no futebol, como na vida real, a única coisa que aparentemente importa é essa pontinha do iceberg, que diz muito pouco sobre as coisas como elas são. E às vezes isso faz do futebol uma coisa horrível, como a própria vida consegue ser horrível vez ou outra. Vemos times dominando um jogo inteiro para perder tudo em poucos minutos, e seleções indo para casa por conta do erro dos outros, como foi o caso do Irã naquele jogo contra a Argentina. Sempre tem um asno sem limites pra estragar tudo pra todos, como fez o Suárez, e tem gente que nada, nada, nada e morre na praia, como aconteceu com a Argélia hoje. 

É impossível dissociar o futebol das nossas vidas, e acho que talvez seja justamente sua narrativa dramática e imprevisível que faz dele um esporte tão popular, de apelo mundial. O resultado não necessariamente reflete a partida, ele está inteiramente sujeito aos erros humanos, as coisas mudam de um segundo pro outro, e você precisa dos outros para que dê certo. É horrível, violento e nos faz sofrer, mas nos conecta aos outros de formas inimagináveis, servindo como uma espécie de argamassa nessa nossa realidade hipermoderna fria e distante, e é cada lance inacreditável que, quando dá certo, nos deixa com uma euforia gostosa, e a certeza de que é uma das melhores coisas do mundo. 

Num dos capítulos do livro, o Nick Hornby descreve seu dia perfeito e seu ideal de perfeição vai muito além do seu time vencer com uma vantagem de dois gols, mas envolve o clima da torcida, o que ele almoçaria e até a forma como seu pai estaria vestido. Ao longo de sua vida até então, esse dia perfeito tinha acontecido uma única vez, e isso só mostra, mais uma vez, como o autor está certo quando compara o futebol com a nossa experiência humana, pois é uma das melhores medidas encontradas para traduzir essa grande piada que vivemos. 

O Arsenal era um time bom demais, o gol do Charlie foi espetacular, a torcida, naquele dia, estava lá em peso e curtindo de montão o desempenho da equipe... Aquele doze de fevereiro aconteceu  de verdade, exatamente do jeito que eu descrevi, mas somente o fato de ter sido um dia atípico é que importa agora. A vida não é, nem nunca foi, uma vitória de 2 a 0 em casa contra os líderes do campeonato depois de comer na lanchonete. 

{Febre de bola - Nick Hornby, pg. 76}

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Books & songs

Há um tempinho a Tary me chamou para postarmos possíveis músicas-tema para alguns dos nossos livros favoritos. Trilha sonora é um dos meus assuntos favoritos no mundo inteiro (aliás, escrevo uma coluna quinzenalmente no Move That Jukebox apenas sobre isso, hehe #publi) e acho que ser supervisora de trilha sonora na produção de algum filme ou seriado é uma das minhas profissões dos sonhos. Acho que muitos livros mereciam muito vir com uma mixtape em anexo, mas, ao mesmo tempo, é legal ter a liberdade de criar um pano de fundo musical baseado na sua própria experiência com a história e os personagens. Escolhi então alguns títulos e suas respectivas trilhas, espero que gostem do resultado. A brincadeira foi inspirada numa série de vídeos feitos pela Raeleen, do canal padfootandprongs07 lá no Youtube.

Não vou repassar a brincadeira para ninguém em específico, mas quem quiser postar também, sinta-se à vontade - e deixe o link pra eu ler também!


As everything I need is denied me, and everything I want is taken away from me, but who I got to blame? Nobody but me

Vacaciones & The Good Life: Esse livro é uma compilação dos posts que a Polly escreveu em seu blog entre 2004 e 2007 (depois pulando para 2013), contando as histórias de suas andanças inconsequentes pelo mundo. Tem uma parte em que ela diz que se fossem fazer um filme sobre sua vida, a primeira cena seria aquele momento em que ela dança no banheiro da rodoviária de Curitiba, lugar pra onde foi porque não tinha nenhum outro pra ir. Eu quase conseguia ouvir "The Good Life", do Weezer, tocar nesse momento, e não é coincidência que essa seja a banda favorita da autora. O livro inteiro tem muito a cara de Weezer, e acho que essa música é a que mais o representa.



And I tried last night to pack away your laugh like a key under the mat, but it never seems to be there when you want it

Eleanor & Park & Black Treacle: Eu escrevi um texto inteiro sobre a trilha sonora desse livro, que é absurdamente musical. A própria Rainbow Rowell fez não uma, mas quatro playlists pra ele. Adoro tudo que é citado na história, assim como adorei tudo que a autora escolheu na hora de construir os personagens e seus momentos, mas quero dar meu pitaco: passei o livro inteiro com a sensação que se a história fosse contemporânea, tanto a Eleanor como o Park seriam fãs do Arctic Monkeys. Acho o "Suck it and see" totalmente a cara deles e a veia romântica do Alex Turner nesse disco combina demais com o Park. Imagino ele escrevendo trechinhos de "Black Treacle" nos cadernos da Eleanor.



It doesn't mean that I don't care, it means I'm partially there

Como Falar com um Viúvo & Please Be Patient With Me: Ouvi essa semana que o Wilco faz músicas para homens em crise de meia idade. Discordo absolutamente (até porque é minha atual banda preferida, e eu não me recordo de um distúrbio de personalidade que tenha me transformado num careca de 46 anos chamado Carlos Alberto), mas não posso negar que algumas músicas e letras combinam sim com esse tipo de crise. Doug Park (falei sobre o livro lá na Lado M) tem só 29 anos, mas o fato de ter perdido a esposa num acidente de avião fez com que ele avançasse umas casas no jogo da vida, se entregando ao Jack Daniels e à auto-comiseração. Essa música do Wilco é a trilha perfeita para os momentos em que ele se conecta com outros personagens do livro (seus pais, a irmã, o enteado) e sente vontade de ser uma pessoa melhor.



Hoje eu sei que quem me deu a ideia de uma nova consciência e juventude tá em casa, guardado por Deus, contanto vil metal

Aos Meus Amigos & Como Nossos Pais: Os personagens desse livro foram jovens subversivos na época da ditadura, e uns 20 anos depois se reencontram e são obrigados a se confrontar com o que o tempo fez deles. A verdade é que a maioria abandonou as antigas lutas e ideais e se acomodou numa vidinha pequeno-burguesa, mais ou menos como a geração dos seus pais, que eles tanto criticavam. E é basicamente isso que essa música discute, numa toada que tem tudo a ver com a época do livro. Acho que ela conversa especialmente bem com a história da Lena e do Ivan.



We might be hollow, but we're brave

Paper Towns & 400 Lux: Ainda não conhecia a Lorde quando li Paper Towns, mas bastou ler a letra dessa música pela primeira vez para pensar automaticamente em Quentin e Margo andando de carro por Orlando durante a madrugada e aprontando altas confusões. A letra fala sobre andar de carro por aí ao léu, fala sobre tédio e a monotonia das casas iguais do subúrbio e acho que esse espírito tem tudo a ver com esse momento dos dois, principalmente com aquilo que a Margo poderia estar sentindo antes de fugir, combinado com os sentimentos de Quentin por ela.


But now we must pick up every piece of the life we used to love just to keep ourselves at least enough to carry on

A Culpa é das Estrelas & Holland, 1945: O livro só cita a banda fictícia The Hectic Glow, que é a favorita do Gus. Tem gente que a associa a The Mountain Goats, a banda favorita do próprio John Green. A trilha sonora do filme, por sua vez, seguiu uma onda mais acústica que não me impressionou muito, senti que sobrou melodrama e faltou energia. Essa música do Neutral Milk Hotel me lembra muito a história da Hazel e do Gus: além de se referir diretamente à Anne Frank e todas as pessoas que morreram jovens demais por conta do Holocausto, ela fala sobre morte e perdas de modo geral, e é difícil não associar ela ao livro.



You hurt her but you don't know why, you love her but you don't know why.

Alta Fidelidade & Misunderstood: Outro livro que tem uma trilha sonora pronta (e eu já escrevi sobre ela e o filme), poderia citar a óbvia "Let's Get It On", do Marvin Gaye, e convidar vocês para dançar igual o John Cusack com os bracinhos pra cima, ou então qualquer música do Al Green. Mas se fosse pra eu escolher alguma coisa pra ele ouvir, seria essa do Wilco, que tem muito da melancolia e do sentimento do Rob de não pertencer ao lugar que nasceu, e evoca algo de suas relações com as ex-namoradas que ele procura ao longo da história. Aliás, esse plot é bem um sintoma de crise de meia idade e a música dialoga muito com isso, não dá pra negar. Talvez meu amigo tenha razão e no fundo eu tenha um pouco de algum careca de cenho franzido chamado Carlos Alberto. 

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Soy loca por pipoca e... café?

Arroz de festa de Copa como sou, acho bem irônico não ter no armário nenhuma camiseta do Brasil. Acho a camisa da nossa seleção uma das mais bonitas, de verdade, mas já me conformei que amarelo não me favorece e deixo passar (mas se alguma marca estiver a fim de me enviar uma de presente, eu aceito com a maior alegria e não verei problemas em andar por aí com cara de anêmica). Assisto aos jogos ora de verde, ora de azul, e levo a sério essa coisa de não combinar com o time adversário: não deixei ninguém aqui em casa usar verde no dia do jogo contra o México e já estou tristíssima com a perspectiva de jogo contra o Chile, porque vermelho é minha cor favorita.

Acho que não, hein
(via Buzzfeed)
Não sou de comprar acessórios também, tipo perucas, cartolas, cornetas ou laços gigantes. A Analu me chamou pra tirar uma foto creiça de Copa com ela e acho que uma parte do seu coração farofeiro morreu por dentro quando eu contei que não tinha nada de ridículo e mega divertido pra torcer. Também não tenho o costume de decorar a casa para a Copa: nada de bandeira na janela, no carro e muito menos almofadas temáticas. A camisa canarinho pode até cair bem em alguns felizardos, mas verde e amarelo na decoração da casa é um desastre bem universal. Se minha mãe não decora a casa nem pro Natal (quando eu era criança, ela me deixava pendurar umas luzes e bolinhas nos vasos de planta e olhe lá), o que sobra pra um evento de futebol?

Hoje, nem julgo mais. Acho que pior que verde e amarelo, só mesmo o verde e vermelho do Natal. 

E mesmo vindo de um berço pouco ortodoxo e nada chegado nessas tradições da família brasileira, aqui em casa temos um rito especial que se repete a cada quatro anos que me faz sentir que sim, tá tendo Copa pra caralho e demorô é noix: pipoca com café.


Eu sei, eu sei. Eu tenho vinte anos e deveria estar vendo jogo num bar, enchendo o focinho de cerveja ou qualquer outra coisa que os jovens fazem hoje em dia. Mas, desde a primeira Copa que eu tenho lembrança, aquela de 2002 em que me acordavam às três da manhã pra ferver e ver jogo, eu aprendi que jogo do Brasil é sinônimo de pipoca. E café. Acho que a pipoca nem pede muita explicação, mas concordo que o café não é a escolha mais óbvia do mundo. Demorei pra entender o apelo, confesso, mas depois que me juntei aos bons, vi que não existe combinação mais certa - e dá uma azia depois que é uma maravilha, sinto como se tivesse mesmo enchido o focinho de cerveja.

Outro motivo para tão apaixonada defesa de tão excêntrica combinação, é que pipoca e café são duas das (se não as únicas duas) minhas especialidades culinárias. Eu faço uma pipoca maravilhosa e um café sensacional. Gosto de valorizar essas pequenas coisas, sem qualquer traço de modéstia ou culpa cristã, porque a maioria das pessoas subestima uma boa pipoca e um bom café. Quando digo que sei fazer os dois, e muito bem, as pessoas riem da minha cara como se eu estivesse me gabando de fazer um ótimo miojo com tempero artificial de galinha caipira, como se nunca tivessem comido uma pipoca ruim ou tomado um café aguado. 

O que pouca gente sabe é que existe toda uma ciência envolvida, toda uma bossa nova, todo um rock'n'roll, toda uma arte moleque pouco reconhecida, expressa naqueles momentos em que eu acho que a pipoca precisa de um outro dedo de óleo, ou que o café pede uma colher a mais ou menos de pó, sem nenhum motivo aparente. Pipoca e café são como os zagueiros da culinária pra quem não entende muito de futebol. Na nossa ignorância, acompanhamos sempre o meio de campo, pois já nos cantou o pensador contemporâneo Samuel Rosa que é lá que ficam os craques que vão levando o time todo pro ataque. A gente mal sabe o nome dos zagueiros e só nota a presença deles quando alguma coisa dá errado, da mesma forma que o café, e principalmente a pipoca, só tem destaque na lembrança do público médio (excluindo-se os entusiastas gourmets) quando são ruins.

Por isso que o David Luiz é meu jogador favorito nesse time do Felipão, e o Lúcio é o cara que eu mais sinto falta nesse time. Eles ficam lá no fundo fazendo o serviço deles sem pedir muito confete, do mesmo modo que uma boa pipoca de panela se destaca silenciosamente nos estômagos e corações daqueles que tiram um tempo pra pensar que pipoca de microondas é uma excrescência da modernidade, pior ainda se for daquelas com sabor. Pipoca boa é aquela que suja os dedos, fica entre os dentes, é salgada na medida certa e é o apoio que você usa para analisar linhas de impedimento ou observar o time adversário bater escanteio. Enfie vinte pipocas de uma vez na boca e seja feliz. 

Quanto ao café, confio no critério de vocês para reconhecer sua superioridade dentre as outras bebidas. Cafeína é a droga lícita mais maravilhosa que existe, dissolvendo lentamente aquela pontada de dor de cabeça que se esconde embaixo de todo cenho franzido e dando o gás necessário para que a gente não entregue os pontos e dê um cochilinho naquele segundo tempo meio preguiçoso. Vai que a gente perde o gol?

No próximo jogo do Brasil (sábado taí!!!), querido leitor, faça como a família Rocha, coma pipoca acompanhada de café e depois venha me contar se gostou. Ou não. Só não me vá vestir vermelho!

David Luiz curtiu esse post

quarta-feira, 18 de junho de 2014

O choro é livre

Ou: A Culpa É Das Estrelas não é uma história de amor

Sexta feira eu tive um momento. 

Estava tudo indo bem, até que não estava. Fui assistir A Culpa É Das Estrelas mais de uma semana depois da estreia - e a impressão que eu tinha era que todo mundo já tinha visto o filme, menos eu - porque não queria dividir minha emoção com muitas pessoas, e nem queria que o excesso de emoção alheia atrapalhasse minha catarse particular. 

Se você chegou agora, um fato importante: esse livro mexeu muito comigo. Tenho uma relação especial com a história desde que a li pela primeira vez, em 2012. Amei e senti absurdamente da primeira até a última linha, e até hoje não consigo explicar objetivamente o por quê. Claro que sei citar as características literárias que fazem desse livro do John Green um grande livro, mas não é por isso que gosto dele. Nesses dois anos, já ouvi muitas críticas negativas sobre ele, algumas que eu reconheci, outras que eu desprezei, e outras que só posso atribuir à realidade (que pode ser cruel ou muito bem vinda) de que uma coisa pode me emocionar muito, mas não significar nada pra outra pessoa. Todos esses pontos de vista conflitantes não me fizeram amar o livro menos, mas esse amor tampouco me ajudou a defendê-lo com a mesma paixão que me fazia chorar só de falar a respeito. Eu gostava do livro porque sim. Eu amava aquela história porque não conseguia me distanciar para pensar racionalmente sobre ela. 

Na época escrevi um post sobre o livro que entitulei de "Por que a gente é assim?", no qual eu falava de pessoas que tem relações anormais com a ficção. Foi assim que comecei a me aproximar da Hazel, protagonista de A Culpa É Das Estrelas, que atravessa um oceano pra encontrar o autor do seu livro favorito porque ela precisa saber o que acontece com os personagens depois do fim. Só que eu entendo os motivos específicos da Hazel para permitir que um livro de ficção mexa tanto com sua vida, entendo a urgência que a fez escrever várias cartas para Peter Van Houten, sei por que a única coisa que ela queria na vida era ir para Amsterdam se encontrar com ele. Mas e eu, o que eu tinha a ver com isso? Por que eu não poderia ser uma pessoa normal que segue com a vida, dá meia volta, e vai comer uma torta inteira de amora no jantar?

Sério, qual a necessidade disso? (r: toda)
Enfim, fui ver o filme e, como eu disse, estava indo tudo muito bem, na medida do possível. Eu ria e chorava quando era para rir ou chorar, eu estava encantada com a forma como a Hazel e o Gus saltaram das páginas do livro pra ganhar vida através da Shai e do Ansel, eu estava achando o Nat Wolff bem gato, estava sofrendo no museu da Anne Frank, e repetindo junto com os personagens as linhas do livro que foram inseridas de forma perfeita no roteiro - e isso só comprova o que eu senti desde o começo das filmagens, que acompanhei desde o início pela internet: que aquele era um filme feito por uma equipe que tinha muito amor e respeito pela história que estava sendo contada ali. 

Estava indo tudo muito bem, e eu era só uma garota vendo uma adaptação perfeita de um dos livros favoritos, que calhou de ser um livro bem triste. Só que as coisas ficaram muito intensas, e muito rápido, e foi então que meu momento começou. 


De uma choradinha que estava no protocolo eu passei pra um choro com soluços, bem inconsolável. E eu não era a única: como foi aparentemente regra em sessões no mundo (!) todo, a ponto de virar motivo de chacota (vocês me envergonham), a sessão inteira chorou bastante. Entre os meus soluços eu sentia o Matheus chorando do meu lado, ele que nem gostou do livro tanto assim, e o homem do meu lado chorava copiosamente também, ele que ganhou minha antipatia gratuita porque tentou roubar meu lugar e ainda me derrubou Coca-Cola. 

Fiquei pensando em todas as pessoas que estavam comigo naquela fila enorme que transformou meu jantar num sanduíche do McDonalds enfiado goela abaixo numa velocidade recorde, todas elas no escuro chorando junto comigo. O filme quer que a gente chore sim, tem todos os recursos no lugar certo pra que ninguém saia dali sem borrar a maquiagem, mas eu gosto de acreditar que existe algo de mais universal numa história que tem o poder de comover tantas pessoas, que vai além de closes na cara de personagens que sofrem e uma música da Birdy tocando no fundo. Se até nas cabines de imprensa era possível ouvir os soluços - e, como o Ricardo Calil escreveu, crítico é um bicho sem coração - o que sobraria para os reles mortais?

Fiquei nessa vibe bacana até o filme terminar, e depois que ele acabou eu demorei até sair da sala. Andei pelo shopping fechado de braços cruzados olhando o nada, e quando o Matheus tentou puxar papo eu mandei ele ficar quieto, porque eu estava tendo meu momento. Não sabia ainda qual era a daquele momento, mas agora eu vejo que eu tinha acabado de sentir que aquilo tudo tinha, sim, muito a ver comigo.

Não tenho câncer e nem estou apaixonada por um cara que vai morrer em breve, muito menos fui convidada pelo meu escritor favorito para tomar um chá com ele e ouvir sobre os personagens do meu livro do coração depois que ele acaba. Mas a minha vida também vai acabar no meio de uma frase, daqui 5 minutos ou 50 anos. E o mundo vai continuar girando quando eu não estiver mais aqui, para o bem e para o mal. Como a Tatiana escreveu numa resenha sobre o livro que mexeu muito comigo, "não é desnecessariamente triste nem nada. É a porra da vida. É assim mesmo, você acha que está tudo lindo e dá merda. Talvez seja por isso que dói". Assim é a nossa vida inteira, tá tudo bem até que não está mais e não tem nada que a gente possa fazer com relação a isso. A gente não escolhe se vai sair machucado desse mundo, não é Gus? The world is not a wish-granting factory. 


Essa ideia me paralisa de medo de vez em quando, mas é ao mesmo tempo muito libertadora. Não existe muito o que se fazer com relação ao inevitável senão seguir em frente, um infinito de cada vez, um pequeno, outro um pouquinho maior. Vamos ajeitando como dá, fazendo o melhor com os nossos dias numerados, e tentando ser grato no final. Se dermos sorte, não vamos querer trocá-lo por nada. E fim.

Me senti idiota, porque estava na minha cara o tempo todo. A Milena já escreveu e eu amo repetir, mas esqueço às vezes: todas as histórias são sobre nós. There is no shortage of fault to be found amid our stars. E pra todo o resto, o choro é livre. 


Okay. 

sábado, 14 de junho de 2014

Porque não dá pra viver só de novela: as séries do momento

A Tadsh inventou esse meme utilidade pública no qual devemos contar um pouquinho sobre as séries que estamos acompanhando no momento. Digo utilidade pública porque estou passando por uma fase que eu jamais imaginei que viveria: estou sem séries para assistir. Quer dizer, estou vendo algumas coisas, mas bem menos do que estou acostumada - não tenho muito foco na vida, então assisto 35 séries ao mesmo tempo e levo três anos para terminar séries que as pessoas levam no máximo três semanas. Mas no último ano eu fiquei órfã de Dexter, Breaking Bad e How I Met Your Mother, de modo que minha agenda televisiva reduziu bastante. Então, adorei ser convidada para contar um pouco sobre as sobreviventes, mas vou adorar mais ainda ler as respostas que pipocarem por aí. Sugestões nos comentários são sempre bem-vindas! 

Repasso para: Tary, Mimi e Larie.

Parks & Recreation


Parks & Rec é a série atual que eu mais gosto, e é minha comédia favorita - obviamente atrás de Friends, mas Friends é hors concours. Lembro que via as propagandas na Sony e ficava pensando que não fazia o menor sentido que uma série sobre funcionários públicos de um departamento que ninguém se importa, em uma cidade bizarra que ninguém conhece, fosse interessante. Ainda bem que me enganei, e sou eternamente grata à Tary, que tanto insistiu até que me convenceu a dar uma volta por Pawnee e me apaixonar por tudo que existe lá. Os personagens de Parks são entusiasmados e apaixonados, e isso faz com que todos sejam absurdamente apaixonantes. E engraçados. E inspiradores. É um elenco que funciona muito bem, e o que eu acho mais lindo é que os relacionamentos mais incríveis da série são os de amizade - e olha que ela vem com o brinde de um dos ships mais fantásticos da história. Sinto que cresci e abandonei Seth Cohen pra me apaixonar perdidamente por Ben Wyatt e sonhar em ser alguém como Leslie Knope. Aliás, Amy Poehler, rainha do universo, lidera um rol de personagens femininas bem sensacional, e ainda temos Rob Lowe no elenco, pra encantar entusiastas dos anos 80.

Orange Is The New Black


Se Parks é a comédia do momento, Orange Is The New Black fica com o posto de melhor drama atualmente no ar. Ok que a série tem um senso de humor incrível, mas a segunda temporada chegou semana passada pra mostrar que vai ter muito tiro, porrada e bomba por aí. O que mais gosto nela é que ela parte de uma proposta que deixa abertura pra um desenvolvimento clichê e estereotipado e, episódio por episódio, desconstrói tudo isso. Porque veja bem, com uma protagonista branca, bem educada e de classe média que vai parar na prisão por conta de seus dias de porra louquice pós-faculdade, a ideia imediata que vem à mente é de que as outras detentas vão ser personagens-acessório, ali só para que ela cresça e se redima a partir dessa nova experiência. Só que, como eu disse, esse desenvolvimento fácil é desconstruído com muita competência e coragem, e o que temos são personagens complexas e incríveis, com todo o rolê marginalizado representado com direito a uma construção que vai além daquilo que inicialmente as diferencia. Fico muito feliz que exista uma série assim, que seja ainda por cima sobre mulheres e que traga tanta diversidade pras nossas telas. No momento, minha personagem favorita é a Taystee. 

Modern Family



O título diz tudo: a proposta de Modern Family é trazer pra TV americana as novas configurações familiares que já existem há muito tempo, mas que não tem a visibilidade apropriada. O núcleo Dunphy-Prichett integra o pai coroa que casou de novo com uma mulher mais nova e imigrante latina; o casal gay que adota uma criança asiática; e a família """tradicional""" com papai, mamães e três filhos. O que mais amo na série é que ela consegue ser MUITO engraçada e muito tocante. Gosto de comédias que também fazem chorar, e eu choro horrores vendo Modern Family. Acho os dramas muito reais e adoro muito que eles são abordados com profundidade e muito realismo, apesar da leveza que o tom cômico dá pra tudo. É filmada no estilo mockumentary, com os personagens dando depoimentos pra câmera, e adoro muito quando eles começam a falar uns dos outros pelas costas.

Game of Thrones



Taí uma série que eu jamais imaginei que iria gostar. Não sou muito fã de fantasia, épicos, etc, e resisti enquanto pude aos apelos dos amigos que, um a um, se rendiam à disputa pelo trono de ferro. Li o primeiro livro mês passado e me apeguei demais, provando que estava certa a menina Gabriela Couth que definiu a série como um "Harry Potter adulto". São dois pesos e duas medidas, claro, mas devorei o primeiro livro com tanto gosto que acho a comparação possível. Agora estou vendo a primeira temporada e achando tudo absurdamente fiel e bem da forma como eu imaginava na minha cabeça. Sei que não vai ser sempre assim, mas por enquanto o saldo é positivo. Quero ler o segundo livro antes de ver a segunda temporada e assim por diante, mas não sei se vou aguentar por muito tempo, principalmente porque meus amigos estão em dia com a série e simplesmente não falam de outra coisa.

My Mad Fat Diary


Única série adolescente que estou vendo, para o meu pesar (aliás, vocês tem alguma indicação bacana?). Em compensação, é uma das melhores que eu já vi. A história gira em torno da Rae, uma garota gorda que, depois de sair de uma clínica psiquiátrica, precisa reaprender a viver como uma adolescente normal ao mesmo tempo que faz as pazes consigo mesma. A discussão que a série faz de body image e auto-estima é boa demais, e os papos da Rae com seu psiquiatra servem como drops de terapia pra quem assiste. A série é britânica e rola toda uma vibe Skins, e é sensacional porque se passa nos anos 90, então tem referências estéticas e de cultura pop maravilhosas. O texto é esperto e bem engraçado, e a trilha sonora é demais. Um detalhe que pode ser bom ou ruim é que My Mad Fat Diary é muito curta: duas temporadas de seis episódios cada, e ninguém sabe se vai ser renovada. Sim, a TV britânica sapateia nos nossos corações sem dó e por isso até hoje não tive coragem de ver a segunda.

O limbo




Duas séries que antes eu curtia pacas se perderam muito em suas últimas temporadas: Downton Abbey e Grey's Anatomy. A primeira foi muitíssimo bem e se sustentou por três temporadas sendo minha novela das seis aristocrática favorita - o problema foi o fim do seu terceiro ano. Estou com a mão no queixo e coração partido sem entender até agora, e não vejo muito sentido em continuar vendo. Até tentei acompanhar a quarta temporada, mas é tudo tão sem propósito que não sei se quero continuar. A outra amargando o purgatório é Grey's Anatomy. Só Deus sabe como eu já amei Grey's nessa vida, todo o tempo, lágrimas e estabilidade emocional que eu já investi nessa série. O problema é que Shonda Rhimes é uma transtornada que não tem o menor respeito pelos seus personagens - o que é bem irônico, se a gente for pensar que o ponto mais forte da série está justamente neles - e depois de dez temporadas vendo ela matar gente a torto e a direito, eu cansei. A série já acabou, já esgotou suas possibilidades e perdeu uma das atrizes mais importantes do elenco. Não vejo por que continuar. Abandonei porque preciso, deixei de lado porque amo muito e não quero perder o respeito.

O gargarejo




Duas séries que só vi o piloto, mas que pretendo continuar a ver: Devious Maids e Les Revenants. A primeira é uma espécie de Desperate Housewives, só que o foco é na vida das empregadas latinas das famílias americanas nos subúrbios chiques. É uma novela mexicana americana (?) com tudo de bom e ruim que a premissa reserva. Fui fisgadíssima pela latinidade da série, e não resisto a nada do nicho tão ruim que é maravilhoso. Já de Les Revenants eu confesso que não lembro de muita coisa, porque vi o piloto há muito tempo. É algo com mortos que voltam e ficam perambulando pelo meio dos vivos, e é francesa e tem uma vibe gótica maravilhosa. Tem só uma temporada, então estou esperando um dia que eu acorde mais mórbida que o normal para assistir tudo de uma vez. 

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Notas do buraco negro #2: vai ter Copa sim!

Alguém aí lembra da minha tentativa falida de criar nesse blog uma tradição de posts periódicos nos quais eu compartilho coisas bacanas que andei lendo nesse mundão velho sem porteira que é a internet? Pois é, eu também não lembrava. O negócio é que há uns dias (na verdade, já tem mais de um mês) eu comecei a compartilhar vários links no Twitter (na verdade, foram dois) com coisas interessantes que eu li naquele dia, e isso me fez pensar que poderia ser uma boa dividi-los no blog só que opa, eu já tinha tentado isso antes. Mesmo sendo tão relapsa, algumas pessoas (na verdade, foi uma só) apoiaram a ideia e por isso o Notas do Buraco Negro volta com uma edição extraordinária especial sobre a Copa do Mundo.

Sim, vai ter Copa mesmo, já tá tendo Copa pra valer. E se brincar, vai ser tanta Copa que não vai sobrar pra Rússia em 2018. 

Talvez já tenha dado pra perceber que eu amo Copa do Mundo. Amo mesmo. O fato de a Copa ser realizada no Brasil, com todas as discussões, protestos, atrasos e problemas que vem sendo pauta há mais de um ano, me deixou com mixed feelings sobre a coisa toda. Tenho minhas ressalvas, e não são poucas, mas não consegui fugir da euforia coletiva e agora só penso, falo e sonho com isso. Vou deixar aqui com vocês algumas leituras que fiz sobre esse assunto nos últimos meses e vocês me contam nos comentários o que pensam sobre tudo isso.

"Elite brasileira usa a Copa do Mundo para mostrar seu descontentamento em ser brasileira":  O Maurício Savarese é um jornalista brasileiro que mora nos Estados Unidos e mantém esse blog sobre o Brasil, em inglês, para informar a galera lá de cima sobre o que acontece aqui. Gostei muito da forma como ele analisou o discurso contra tudo isso que tá aí adotado pelas classes mais altas, que vem desde as manifestações do ano passado, e que abraçou com força o movimento anti-Copa. Achei lúcido, bem didático e toca em vários pontos interessantes. 

"Meninas em jogo", reportagem em quadrinhos da Agência Pública:  Sou muito muito muito fã do trabalho da Pública. Sabe aquele tipo de coisa que a gente quer fazer quando crescer? Então. Dessa vez, a empreitada foi fazer uma reportagem toda em formato de quadrinhos, e a investigação era sobre o turismo sexual focado na exploração de menores, ampliado nessa época de Copa. É um tema bem dolorido, mas que precisa ser abordado e o resultado é bom demais. 

"Há um clima pessimista no ar e um desejo, tanto à direita quanto à esquerda, de limar todos os discursos a favor do Brasil. Compreende-se: os serviços públicos são precários, há corrupção nos governos, basta abrir o jornal ou a janela para darmos de cara com horrores de todo o tipo. Mas será que a saída é desistir e admitir que foi tudo uma ilusão? Machado de Assis, Gilberto Freyre, Oswald de Andrade, Villa-Lobos, o concretismo, Niemeyer, João Gilberto; nada presta, promessas falsas, roncos de um motor de arranque que não fez nem jamais fará o carro dar a partida.

Talvez seja bom colocar nossos mitos à prova, negar a pátria, como se nega o pai, para nos tornarmos adultos. Talvez, porém, fosse prudente ficar atento para não jogar a criança com a água do banho: o Brasil é foda, mas a bossa nova, como cantou Caetano Veloso em seu último disco, também é."

Em "O Álbum da Copa", pra variar temos o Antonio Prata falando por mim. Não entendeu meus mixed feelings ali no primeiro parágrafo? Leia essa crônica que o moço desenha.

"Bend it like a brasileiro", jornal indiano falando de um Brasil além dos estereótipos: Sou meio viciada em acompanhar o que a imprensa internacional escreve sobre o nosso país. Amo esses textos com curiosidades, que falam sobre costumes - ainda que a maioria deles peque pela generalização. Achei essa lista curiosa primeiramente porque é de um veículo indiano, coisa que não costumo ler, e outra porque comenta alguns de nossos costumes além dos clichês. Já pararam pra pensar que café da manhã só se chama café da manhã porque a gente bebe MUITO café? O texto tem falhas, como considerar que vivemos uma democracia racial (risos eternos), mas mesmo assim é divertidinho.  

"Pardon anything", por Gregório Duvivier: Gente, eu adoro muito o Gregório. Fico bem chateada quando vejo vocês fazendo troça dele na internet. Falando em costumes, essa crônica  é bem sensacional. Me senti muito contemplada e penso seriamente em tatuar "Put some farofa. It's delicious" em alguma parte do meu corpo, porque se tem uma coisa que eu amo, acredito, defendo e recomendo nessa vida, essa coisa é a farofa.  

O jornalista dinamarquês: Mesmo se eu não gostasse de acompanhar gente de fora falando do Brésil, seria difícil passar incólume ao caso do jornalista dinamarquês que desistiu de cobrir a Copa e virou meme na internet. O assunto é batido, mas as coisas explodem (e desaparecem) tão rápido na agenda de polêmicas diárias que queria resgatar a stalkeada marota que o jornalista brasileiro Igor Natusch deu no nosso colega escandinavo, e as conclusões que ele tirou disso. O trabalho que ele fez pela graça da coisa fica de lição pros jornaleiros como euzinha, de sempre investigar exaustivamente qualquer história antes de sair replicando e de apurar direito e largar de ser besta.

Essa história do jornalista dinamarquês, o gringo que viu o que os gringos não devem ver, foi aproveitada até pelo ótimo Is Wilco Coming To Brazil. Porque se tem uma coisa que gringo não vê nunca, é o eterno não do Wilco pras nossas terras. Aliás, os memes do site estão sempre de parabéns. É muito bom saber que eu não sofro sozinha.

via Is Wilco Coming To Brazil
História animada relembra a Copa de 50 e o Maracanaço:  Último link gringo, eu juro. O NY Times mandou um de seus ilustradores pra cá, pra investigar um pouco sobre a alma brasileira do futebol. Nessa empreitada, o Christoph Niemann acabou descobrindo a história da Copa de 50, aquela que estava ganha, até que o Brasil perdeu pro Uruguai no Maracanã, no último mundial realizado no país. É um guia ilustrado e animado bem divertido e muito bem feito, vale muito a leitura.

Tinder na Copa: O nome é meio que auto-explicativo. Na ausência do saudoso Gatos da Copa (pelo menos ele continua no ar, pra gente relembrar dos bons momentos de 2010 e ver quem melhorou, quem embarangou, etc), nos contentamos com esse Tumblr que compila os achados maravilhosos que esse mês de loucura, caos e euforia nos reserva. Uma pena que Uberlândia só seja cidade sede da minha preguiça.

 "10 causos que a Copa de 2014 já eternizou":  Vi isso no Twitter ontem e fui feito besta caçar link de todas as notícias. Felizmente, uma boa alma compilou tudo com os links e agora está tudo reunido, pronto pra vocês. Meu caso favorito é o do cachorro adotado pela seleção da Bósnia, mas também morri de rir com a galera da Alemanha na maior integração com a comunidade indígena na Bahia. Só faltou nessa lista a notícia maravilhosa do jogador inglês que ficou esquecido no hotel


"Inspirações pra você passar a Copa da forma mais brega possível":  Sigo a Bic Muller no Twitter e há meses ela tem compartilhado tudo quanto é tipo de cafonice verde e amarela que vocês podem imaginar.  Fui no perfil dela caçar algumas fotos pra colocar aqui e quando vi ela fez um post reunindo o creme de la creme do espírito de porco alheio. Amo Copa, adoro torcer, mas odeio essa combinação de cores e quero vomitar sempre que vejo looks de torcida na vitrine das lojas ou quando tentam me vender um jogo de maquiagem verde e amarelo.

10 músicas sobre futebol melhores do que as músicas tema da Copa:  Por conta do sucesso de "Waka Waka", que me fez dançar loucamente ao longo do ano todo de 2010 (e 2011, 2012, e a música tá no meu iPod até hoje), estava ansiosa para conhecer as músicas tema desse ano. Aí veio aquela lástima de Claudinha Milk com Pitbull (gente) e J.Lo, e nem a música que a Shakira lançou depois conseguiu salvar. Esse link reúne 10 músicas nacionais sobre futebol e se for pra escolher uma, fecho totalmente com o MC Guimê - a Nina Lemos também escreveu sobre isso. A música gruda, o clipe é ótimo e a temática tem total a cara do Brasil.


"Não estou dizendo que devemos liberar a Joana Havelange que  em cada um de nós: "o que tinha que ser roubado, já foi". Nada tinha que ser roubado. Que se ponha atrás das grades queroubou. Que se aproveitem todos os holofotes mundiais para se esticar faixas e cartazes contra o estado das nossas escolas e dos nossos hospitais, a falta de moradias e de transporte. Mas, a partir da semana que vem, Messi, Cristiano Ronaldo, Neymar, Klose, Eto'o, Drogba e tantos outros estarão jogando em nossos gramados. Os maiores jogadores do mundo, no maior espetáculo do futebol. Se privar de viver essa experiência, seja nos estádios, nas praças, nos bares, em casa ou mesmo durante uma justíssima manifestação, pela internet do celular, não fará o Brasil melhor, só deixará sua vida mais chata."

Antonio Prata, de novo, e sempre, dizendo que vai ter Copa e vai ter toldo também!


sábado, 7 de junho de 2014

Manifesto pelo direito de ler o que eu quiser

 Eu poderia estar vendo a temporada nova de Orange Is The New Black, eu poderia estar dormindo, eu poderia estar descendo até o chão ao som de Countdown ou então terminando de ler Eleanor &amPark. Mas resolvi vir aqui defender o YA. 


Pra quem não sabe, YA é a sigla pra young adult, gênero literário supostamente voltado para jovens adultos  na faixa dos 12 aos 17 anos. Não é de hoje que esse nicho é não apenas subestimado, como também visto com um certo desdém, e essa semana saiu um artigo muito do idiota que dizia, logo no título, que adultos deveriam se sentir envergonhados de ler esse tipo de coisa. Não vou colocar o link aqui, porque agora sou dessas, mas a pérola é da revista Slate e sei que vocês são espertos, vai ser fácil encontrar - mas eu realmente sugiro que você use seu tempo vendo um clipe da Beyoncé.

Ruth Graham, a autora, argumenta basicamente que ela, uma adulta com A maiúsculo, merece mais do que a literatura jovem oferece. Porque, afinal, ela cresceu, foi promovida a gente grande, e isso fez com que a adolescente que ela foi um dia fosse rebaixada a uma esfera de existência necessariamente inferior. Isso fez também com que ela se tornasse boa, completa e complexa demais para se identificar com a experiência de um adolescente. Por isso que ela, do alto do seu pódio de Adulta, leu A Culpa É Das Estrelas com a mão no queixo, pensando que era uma história bem gracinha para jovens de 13 anos, mas que pra ela não oferecia nada mais que motivos para suspirar, revirar os olhos e exclamar "Oh brother!" a cada virada de página.

Ou seja, é uma condescendência muito da cretina, e essa visão é mais comum do que a gente imagina. À medida que crescemos, temos uma tendência a subestimar a experiência das pessoas mais novas, como se ela fosse menos importante ou não tão significativa quanto aquilo que vivemos agora. É o que nossos pais fazem quando defendemos apaixonadamente um ideal e ouvimos de volta que aquilo é coisa da idade, olha só que gracinha. É aquilo que a gente faz com nossos primos mais novos, quando eles reclamam da sétima série e a gente diz espera só até você chegar na faculdade, cê ainda não viu nada.

Acho crescer e amadurecer coisas muito importantes, só temos a ganhar com isso. A passagem do tempo é uma benção nas nossas vidas, se bem aproveitada. Acho que o importante é sempre tentarmos ser pessoas melhores do que fomos ontem. Só que eu acho também que crescer não nos autoriza a cuspir na cara daquilo que fomos, como se crianças e adolescentes vivessem experiências menos importantes ou significativas, a ponto de só merecerem uma revirada de olhos e uma risada de desdém, como se elas só fossem dignas da empatia dos seus próprios pares. Se você é uma pessoa que se acha boa demais para aprender com a experiência de alguém mais novo que você, ainda que seja para acertar as contas com aquela pessoa que você foi um dia, só me resta concordar com Allison Reynolds:

Disclaimer: contrariar essa declaração é um dos meus objetivos de vida
Trazendo a discussão pro lado literário da coisa, deixa eu contar uma história. Eu lia muito quando era mais nova, era basicamente uma das únicas coisas que eu fazia da minha vida, junto com assistir The OC e Dr. 90210. Já ganhei mais de uma vez um prêmio na escola por ter sido a aluna que mais pegou livros da biblioteca em um determinado ano. Já cheguei a ler toda a seção infanto-juvenil da biblioteca da escola. Foi logo quando zerei esse departamento, ali pelos meus 13 anos, que comecei a ler Livros de Gente Grande. Na minha época (a voz da experiência falando) a literatura juvenil não era tão forte como hoje, e eu nem conhecia muita coisa além de Harry Potter e Meg Cabot. Além disso, minha avó tem uma coleção enorme de livros que sempre foi meu sonho de consumo, e assim como a Ruth, olha só que coisa, eu não via a hora de encarar aqueles livros. 

Pulei da coleção Vagalume e do Cachorrinho Samba direto pra Machado de Assis, Eça de Queirós, Clarice Lispector, Ian McEwan e até Dostoiévski. Gostei de algumas coisas, me apaixonei por outras, e é bem provável que eu não tenha entendido nada na maioria delas, mas eu lia. Lia, sobretudo, porque eu gostava de ler e não fazia muita distinção do que aparecia na minha frente. E nesse ritmo eu fui até uns 18, 19 anos, quando comecei a ter mais contato com YAs e percebi que tinha uma deficiência séria no meu histórico de leitura, que era justamente não ter lido literatura jovem o suficiente. Foi todo um novo mundo que eu descobri e foi uma coisa que aconteceu quando eu deixei de ser o público alvo desse tipo de publicação. 


E nessa minha missão de recuperar o tempo perdido no maravilhoso mundo YA, eu li muita coisa boa. Li coisas ruins também, mas eventualmente tropeço em livros ruins desde que aprendi a ler, então suspeito que não seja um privilégio do gênero. Ler coisas como Fangirl e Nada Dramática permitiu que eu entendesse melhor a adolescente que eu fui, que é parte inexorável dessa criatura que sou hoje. Ler A Culpa É Das Estrelas me ensinou muito sobre duas das coisas que mais me assustam nesse mundo: o inevitável fim de qualquer coisa que seja, e o fato de não termos o menor controle sobre o que acontece com a gente, principalmente quando é algo ruim. E agora eu estou lendo Eleanor & Park, e tem sido uma experiência de leitura tão maravilhosa que, mesmo deitada no sofá da minha casa, eu me sinto dentro de um filme do John Hughes em que toca Joy Division sem parar.

Essas impressões podem ter a ver com escapismo, nostalgia ou simplesmente com satisfação pessoal. A nossa colega Ruth observa isso e aponta o dedo na nossa cara, nos acusando do crime hediondo que aparentemente é sentir prazer lendo alguma coisa, um tipo de prazer que não está associado à suposta honra que é consumir Grande Literatura. E eu digo: e daí? Não acho que tais características sejam sinônimos de fraqueza intelectual, e muito menos considero uma falha de caráter gostar de ler alguma coisa porque aquilo faz com que eu me sinta sinta bem. Mas para ela, literatura de verdade não pode ter personagens gostáveis e nem finais felizes, e Deus nos livre de uma literatura que seja ao mesmo tempo entretenimento. 


Shakespeare escrevia para massas de analfabetos e foi incrivelmente popular, e romances nasceram de histórias publicadas nas páginas dos jornais para entreter as pessoas. Jane Austen é consagradíssima e a maioria das seus livros tem um final feliz. E se esse tipo de desfecho é realmente um problema, talvez Ruth precise reler alguns títulos que citou no seu texto, porque eu não sei muito bem em que parte de ACEDE existe um felizes pra sempre. Holden Caulfield e Esther Greenwood, personagens de J.D.Salinger e Sylvia Plath, respectivamente, se enquadram no perfil de jovens adultos, e quando penso numa adaptação moderna de O Morro dos Ventos Uivantes, imagino um romance complicado entre o bad boy e a garota mais popular da escola. 

Estou aqui escrevendo nomes importantes na tentativa de falar a mesma língua da Ruth, de modo que fique explícito o quão reducionista e preconceituosa é sua argumentação. Mas, de verdade, acredito muito que a gente pode e deve ler o que quiser, a diferença é o que tiramos de cada experiência de leitura - seja uma iluminação sobre a condição humana ou então o prazer inenarrável que é shippar um casal como se sua vida dependesse desse enlace. Sem medo, vergonha ou culpa, a não ser que isso faça mal a alguém. A vida é muito curta para desencanarmos de Harry Potter aos 17, e eu nunca teria conhecido o John Green ou a Rainbow Rowell se tivesse me limitado à biblioteca consagrada da minha avó.

Se é que isso importa, queria esclarecer que ler YAs não me colocou numa zona de conforto literária, muito menos me fez uma pessoa acomodada. Continuo lendo Livros de Gente Grande, e ainda tem muita coisa nesse mundo que eu quero ler. E quando alguém vem me dizer que tem medo de alguma obra importante e consagrada, meu conselho é sempre o mesmo: encare-a como aquilo que ela essencialmente é, ou seja, um livro que conta uma história que você pode ou não gostar e se divirta. Memórias Póstumas de Brás Cubas sempre vai ser uma das coisas mais engraçadas que já li, e Anna Karenina é uma novela das seis deliciosa, ninguém pode negar.

A máxima de viver e deixar que leiam, ou ler sem dar satisfações, contém uma ideia muito simples que, se fosse amplamente aceita, nos pouparia um bocado de aborrecimentos. Eu poderia, inclusive, ter deixado por isso mesmo (caberia num tuíte), mas acho a discussão importante e queria muito saber a opinião de vocês sobre o assunto.


Atualização: A Tary me lembrou desse vídeo da maravilhosa Ariel Bisset, que se encaixa perfeitamente no tema. É interessante ver que o vídeo rebate diretamente vários argumentos utilizados pela Ruth Graham e poderia ser uma resposta perfeita pro seu artigo - só que foi postado há mais de um ano, o que significa que ela não foi a primeira a defecar pelo teclado o seu elitismo literário. Além disso, a Tary também postou sobre como é importante termos gostos diferentes dos coleguinhas.

E se você quiser se aprofundar nessa discussão, vou deixar três links bacanas: Não queria ter essa conversa de novo, em que minha incrível amiga Milena discorre sobre literatura jovem; Book Girls e seu mundo que é mais complicado que elas, que são mais complicadas que seus livros; esse artigo que defende, baseando-se em exemplos, que YAs podem sim ter todas as características que qualquer Livro de Gente Grande supostamente tem. 

domingo, 1 de junho de 2014

Ódio em família

Existe essa história que é contada há anos na minha família, que é o caso da Tia Galiana. Tia Galiana era a tia-avó da minha avó, o que faz dela minha tia-bisavó, se é que isso existe. E aí que minha avó conta que já velha e meio senil, Tia Galiana passava o dia inteiro vendo novela e, bastião da moral e dos bons costumes como só tias-bisavós bem velhas e meio caducas conseguem ser, Tia Galiana assistia suas novelas só para falar mal de tudo que era inapropriado nas tramas. Até aí normal, quem nunca, né? O problema é que um dia a Tia Galiana ficou tão transtornada de ódio por um personagens que foi lá e quebrou a TV com um pedaço de pau. 

Pois é.

Tenho pensado muito em Tia Galiana nos últimos meses, e Em Família é a razão disso. Odiei a novela desde a primeira semana, com sua trama que não faz o menor sentido e seus personagens que, um por um, mereciam ser mortos por pauladas da Tia Galiana. Apesar disso, me apeguei muito à novela, assisto todos os dias e fico tristíssima quando perco algum capítulo, do tipo estar com amigos num sábado à noite e mesmo assim ficar pensando no Cadu e na Verônica, etc. 

Depois de meses reunindo muito ódio no meu coração, vim hoje destilar tudo aqui com vocês, ao melhor estilo Morri de Sunga Branca. Então pega aí o seu colar de fênix, um pedaço de pau, a bossa nova de sua escolha, e vem comigo!


Luiza
Por que odiar:
Bruna Marquezine. Que criatura detestável, não lembro de uma personagem dela que não me tenha feito revirar os olhos. Meu sonho era mandar a Salete engolir o choro. Sendo assim, já odiava antes da novela começar, mas Luiza fez questão de fazer por merecer. Veja bem, o problema não é ela ter se apaixonado pelo grande amor & grande trauma da vida da mãe. Às vezes algumas pessoas erradas são mais erradas que as outras. O problema é que o Laerte foi a grande desgraça da família dela, por ser tão controlador e possessivo que tentou matar o Virgílio, vulgo pai da Luiza, por conta de ciúmes. E não foi qualquer tentativazinha de homício não, o Laerte enterrou o homem vivo, sabe? A Luiza sabe disso, mas mesmo assim insiste em se fazer de Julieta moderna e jura que o fato de ninguém apoiar seu relacionamento não passa de uma querela insignificante. Então o problema é que a Luiza é BURRA, e minha tolerância com gente burra é bem pequena. O problema é que a Luiza é arrogante, e acha que todo mundo que está contra ela, está errado. O problema é que ela está sendo desleal com a mãe e com o pai, e fica choramingando porque eles não vão abençoar seu casamento. O problema é que ela chora em todos os capítulos, o que significa que estou há mais de dez anos sonhando em mandar ela engolir o choro.

Laerte
Por que odiar:
Típico Homenzinho de Merda™, o Laerte jura ser o centro da vida de todas as mulheres. Ele não apenas acredita nisso, como trata todas como se elas existissem em função dele, para agradar ele. Assim, no relacionamento com a Helena ele era ciumento e controlador ao extremo. E por isso que, mesmo não amando a Verônica, ele ficou anos com ela, porque era conveniente, porque ela fazia tudo por ele - do mesmo modo que ele sempre abusa do amor e da loucura da Shirley quando lhe é conveniente, sem nunca dar nada em troca. Seguindo essa cartilha, a Luiza será descartada assim que não for mais tão interessante, assim que ele provar pro Laerte (e pra Helena e pro Virgílio) do passado que ele pode ter a mulher que ele quiser. Ou pelo menos até outra mulher aparecer - e já apareceu, né? Corra para as montanhas, Lívia!