sexta-feira, 25 de março de 2016

Diálogo?

Às vezes eu lembro de umas coisas aleatórias. Hoje lembrei que o nome do primeiro disco do NX Zero é Diálogo?, assim, com uma interrogação no final. Acho incrível como um sinal de pontuação faz toda a diferença. Eu provavelmente não lembraria se fosse simplesmente Diálogo. Diálogo? deixa as coisas mais dramáticas, como uma conversa que você pega no meio, um casal falando alto num restaurante em que todo mundo fala baixo: 

- Diálogo? Diálogo, Lidiane? - ele diz, logo antes de jogar o guardanapo de tecido no prato e se levantar de repente, fazendo a mesa toda balançar. As pessoas que antes já falavam muito baixo agora pararam completamente de falar para observar a cena. Marcos chegou rápido até a esquina enquanto Lídia cortava mais um pedaço do cordeiro, os olhos fixos no prato, tentando entender o que tinha dito de tão errado. Diálogo, ué. Ele sair assim só mostrava como ela estava correta. 

Eu poderia continuar pelo resto da noite. 

***

O negócio é que eu lembrei que o nome do primeiro disco do NX Zero é Diálogo?, o que me fez lembrar que ouvi NX Zero pela primeira vez num programa da MTV chamado Chapa Coco, com o Felipe Solari e um outro cara que eu sei o nome. A banda estava no estúdio porque era a estreia do primeiro clipe deles. O Di usava camiseta branca com um colar de sementes vermelhas e eu achei ele o maior gatinho, por isso fui assistir o clipe de novo logo que o programa acabou. Essa seria uma lembrança relevante se eu tivesse sido uma grande fã de NX Zero na minha adolescência - a gente sempre tem histórias sobre como foi ouvir bandas importantes pela primeira vez - mas não. Foi só uma coisa que eu lembrei.

Eu estava pensando sobre diálogos (Diálogo?) porque li uma resenha de Batman vs. Superman que dizia já no título: dava pra resolver conversando, e eu sabia que concordava com aquele texto mesmo antes de assistir ao filme. Saindo do cinema repeti a mesma coisa, dava pra resolver conversando, e hoje, quando me perguntaram como tinha sido o filme ontem, disse que um diálogo pouparia Batman e Superman de uma tremenda dor nas costas e Gotham (ou foi Metropolis?) de uma destruição quase completa. 

É uma premissa bem estúpida colocar os dois heróis mais importantes (de acordo com algumas pessoas) para lutar entre si se eles estão fundamentalmente do mesmo lado. Sei lá, os dois não querem o bem e a paz mundial? Na minha módica opinião a gente troca uma ideia antes de resolver as diferenças no braço, principalmente quando esse braço significa quebrar uma cidade inteira. Então eles estão lá quebrando a porra toda e no fim é tudo por causa de um mal entendido. Que poderia ter sido evitado se os bonitões CONVERSASSEM. 

- Diálogo? - pergunta Bruce Wayne sem disfarçar o escárnio enquanto sai do restaurante às pressas com uma lança de kriptonita das mãos - Eu não tenho tempo pra diálogos. - disse, agora com uma voz mecânica e grave que não era mais a sua, mas a de Batman.

***

Eu queria que as pessoas conversassem. Veja bem, conversar é diferente de falar, argumentar, discutir. Conversar, sabe? Diálogo. Uma pessoa fala. A outra escuta. Pondera. Depois responde. É uma troca.

Desde que estourou todo esse rebosteio pelo país tem me incomodado muito a gritaria generalizada, com as pessoas berrando na cara umas das outras aquilo que acreditam e deixam de acreditar, incapazes de ouvir o que o outro lado diz. Acredito que a polarização é uma configuração estúpida para qualquer sociedade, a começar pelo fato de ela não ser real, já que a vida não existe no preto ou no branco, mas num caminho possível entre os dois. Enquanto a gente só ouve quem diz a mesma coisa que a gente e repete só aquilo que a gente já concorda, deixando de ouvir quem está do outro lado, demonizando qualquer posicionamento que fuja à nossa cartilha perfeita de como as coisas devem ser e o que estiver diferente merece morrer, sério, a gente não vai pra lugar algum. 

Imagine aquele monstro do filme, oportunamente batizado de Apocalypse, e é mais ou menos assim que vamos continuar vivendo. 

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- Diálogo? - pergunta Apocalypse, de acordo com o tradutor residente - AJKDHKNNKJHKJFHEIBSKSNKKBGWKGBSODJSINRGKBKBCDHDJJSJSKSDNNSHUAAAAAA [destroys everything in kryptonian monster language]

***

Esse mês eu li Modern Romance, livro sobre relacionamentos na era digital escrito pelo Aziz Ansari (!). Logo no início ele fala sobre a situação ridícula que a modernidade (ou a pós-modernidade, caso você prefira assim) nos coloca que é a de ficar calculando quanto tempo devemos esperar pra responder a mensagem daquela pessoa que a gente gosta. Porque, sabe como é, não dá pra responder muito rápido senão vai parecer que a gente está ali com o celular na mão esperando aquele oi, ainda que a gente esteja. Ninguém quer se mostrar muito disponível e nem ser aquela pessoa que gosta demais. Então a gente espera dez minutos. Vinte. Sete a mais do que a outro esperou pra responder, porque não sou eu que vou sair perdendo caso alguém esteja acompanhando o placar.

Enquanto isso tem dois bobocas de olho no celular e no relógio, perdendo o maior tempo e tendo crises de ansiedade, enquanto tudo seria resolvido com um diálogo. 

- Oi, gostei de você.

- Eu também.

- VAMO SE BEIJAR?

- Bora

A Taylor Swift (lógico) já escreveu mais ou menos sobre essa sensação em The Story Of Us: Now I'm standing alone in a crowded room and we're not speaking / And I'm dying to know is it killing you like it's killing me? 

A parte mais idiota disso tudo é que 1) o maldito do jogo funciona e 2) mesmo sabendo que é estúpido a gente joga junto. Recentemente me vi no meio de uma dessas histórias de mensagens e silêncios calculados, morrendo um pouco a cada vez que pegava meu celular e não via ali nenhuma notificação, pensando que tudo isso seria evitado se eu tivesse um pouquinho mais de coragem de dialogar. Eu tenho esse monte de filosofias, mas infelizmente ainda não sou adepta de todas elas. Por causa desse monte de bobeiras uma história nunca começou, e nem estou dizendo que seria uma boa história, mas seria melhor que esse disco furado na faixa introdutória. 

Algumas histórias não aconteceriam se houvesse diálogo, vide Batman vs. Superman, mas outras tantas se perdem quando a gente escolhe não dizer nada. Já era para eu ter superado esse caso, eu já tinha superado esse caso, mas às vezes eu lembro de umas coisas aleatórias, como lembrei do Diálogo?, disco do NX Zero, que me lembrou de Batman vs. Superman, e da Conjuntura Política Atual, mas também me lembrou de Fresno, e de como aquele moço gostava de Fresno na adolescência, o suficiente para se lembrar, assim como eu, de como tinha ouvido a banda pela primeira vez, e a gente estava no mesmo show, e tudo isso me fez pensar nos nossos diálogos que nunca aconteceram, jamais vão acontecer, e tudo isso me trouxe até aqui. 

- Diálogo? - ela disse, descrente, como se falasse para si mesma ou para ninguém. 


8 comentários:

  1. Anna, lembro de você há uns 4 anos, no tempo do meu antigo blog. Já gostava da sua escrita. Voltei a ler seu blog e continuo gostando do que vejo aqui ;)
    Sabe, sobre seu texto, eu não assisti Batman vs Superman para opinar sobre o texto, mas concordo com todo o resto. As pessoas têm uma dificuldade muito grande de dialogar, de ouvir o outro, considerar um ponto de vista que não o seu próprio. Eu tento não me envolver em discussões sobre o "rebosteio", como você chamou, que está acontecendo, pois é muito gasto de energia tentando dialogar com quem não quer.
    Sobre o último assunto, eu fico triste toda vez que vejo acontecer alguma situação assim porque a chance de se perder uma ótima oportunidade por receio de parecer isso ou aquilo é enorme!
    Um beijo Anna e parabéns pelo blog!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Amiga, dois minutos pra eu ter um momento aqui quando vi que cê tinha atualizado o blog e ainda fazia referência ao primeiro cd do Nx Zero: Diálogo? E aí que eu achei um absurdo porque eu não tenho nenhuma lembrança de quando eu ouvi Nx pela primeira vez, mas eu tive uma fase de ser muito fã e muito louca, de ir em todos os shows, de perder noites sonhando com o dia que eu casaria com o Di, etc. Momentos. Diálogo? é meu álbum favorito deles, tem umas músicas que eu ouço até hoje (jamais superarei minha adolescência, é claro), mas enfim, né. Momentos. Nem sei mais que ~tipo~ de música eles andam fazendo agora.
    Sobre todo o resto, amiga, obviamente preciso concordar. Porque é isso, né? Falta diálogo, gente disposta a bater um papo legal, ouvir o outro lado, ser vulnerável (!), gente que dê o braço a torcer e que reconheça que não está certa o tempo todo, sei lá. Tanta coisa que dava pra resolver com um pouquinho de diálogo. Pfvr, pessoas, vamo colaborar.

    te amo <3

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  4. fico estupefata de como você é ótima, Ana!

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  5. Yeeeeeey, tropecei aqui, vou ficar um pouco, 2bjs...




    Como assim tu lembra do NX Zero na MTV manola :o Eu mal lembro da MTV rs E olha que tenho vinte e tantos anos e curti muita sonzera naquele canal. Na real lembro coisa ou outra do Mion, só rs Ah, a Moon tb. Enfim. Não tive adolescência NX Zero, acho que isso conta tb rs

    E meu, compreendo sua posição quanto ao diálogo, passei minhas últimas semanas refletindo sobre preconceito, feminismo, e mais uma caralhada de ismos, ceitos etc, e tudo... Tudo poderia ser resolvido com mais humildade e empatia. Anyway, o mundo é mundo, pessoas são pessoas, e eu fiz questão de não assistir Bat x Supax, estava crente desde que foi anunciado que seria Ó RRI VEL, até comentei com a Ana no Oh So Fangirl sobre isso, afe, essas adaptações me desanimam.

    Não cheguei a ver esse livro que tu comentaste, mas agr vou, não cheguei ainda a fazer isso de contar tempo etc pois sou SUPER ansioso, tanto quanto o Man é Super ~ IQDHHWQDIUHIWQHDIUHWQIDU piada tosca, enfim. Costume escroto que tornou-se intrínseco na cultura contemporânea... Oh gosh.

    Logo tudo muda, outra vez.

    É isso aí, passe bem :D
    xoxoxo

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  6. Você é incrível demais!!! Eu fico um pouco perturbada depois dos seus textos, olha, francamente, você: <3

    Acho que a primeiríssima coisa que a gente tem que olhar nesse filme é que se fossem duas heroínas (caso o mundo estivesse preparado pra lidar com duas mulheres heroínas AND protagonistas) ia ficar todo mundo "NOOOOOOOOOOSSA, mulher é tudo histérica", mas nossa, deus o livre falar isso do Super Homem (do Batman a gente não fala porque ele é brother, mas convenhamos que também tá difícil defender).

    Acho que 90% dos problemas atuais da política brasileira (e dos relacionamentos amorosos da nação também, por que não?) podiam ser resolvidos com aquele meme do urso "jovem senta aqui vamos conversar". A gente tá cada vez mais 5a Série D, chamando o outro de bobo porque discordou da gente (mas não vai ter professora pra vir separar no final).

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  7. O outro cara é o André Vasco, e eu lembro porque gostava do Chapa Coco e me senti ofendida, no auge dos meus 14 anos, quando o próprio André chamou o Flea do RHCP de "velho" - e pior que é né, uai.

    Adorei sua associação das coisas, com essas cenas de restaurante no meio. Sua escrita é muito saborosa, sabe.
    Do Batman x Superman eu tô adorando é os memes com o Ben Affleck, se o filme é ruim ou bom só vou saber quando estiver disponível de graça na TV (aquelas com preguiça).

    Nos falta diálogo realmente, ouvir e mesmo não concordando, respeitar. E não ficar batendo um no outro, gritando um mais alto que o outro, etc.

    Tenho medo dessas bolhas que a gente cria só adicionando quem nos convém, deixando de seguir quem é contrário, ironia daqui e de lá, e quando você vai ver, mesmo os pensamentos diferentes têm mesmos argumentos, e você se pergunta "what the fuck, man?" *voz do Cheech do Cheech & Chong*

    Tenho medo também desse desespero nosso de cada dia em esperar a mensagem de alguém. Às vezes continua quando a gente já tá ficando com a pessoa, tem horas que é meio paranoico e sempre nos machuca e nos faz perder tempo, e não temos controle sobre isso. Poderíamos esperar uma notificação simplesmente fazendo outras coisas, por nós mesmas. Lendo, desenhando, estudando, vivendo. Espero que a internet não lasque com as nossas vidas.

    Beijão!

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  8. Ah... os diálogos.
    Os joguinhos até que são agradáveis...
    nos primeiros 5 minutos.
    Deuses como eu odeio essas "convenções sociais de comportamento no whatsapp"!
    Texto show de bola *-*

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