quinta-feira, 11 de abril de 2013

Monomania

Eu sei que a essa altura todo mundo já deve ter ouvido falar da Clarice Falcão, além de ter ouvido a própria falar e cantar também. O negócio é que eu sou uma pessoa atrasada em tudo nessa vida, e só no domingo que efetivamente fui ver os vídeos dela (não estou falando de Porta dos Fundos). O engraçado é que mesmo sem nunca ter ouvido, eu já sabia exatamente o que esperar e sabia perfeitamente que iria amar e sentir coisinhas com suas músicas. Comecei por "Fred Astaire", por razões óbvias, e mesmo esperando uma fofura incomensurável, aquela conversa de "só pra saber nesse tal filme de romance, antes que o público se canse, você me beija no final?" me encantou deveras e eu queria desesperadamente ter escrito isso.


As melodias são tão fofas e sua voz tão doce que, se você não prestar atenção, pode acabar não reparando na bizarrice que surge numa estrofe ou outra. Falo isso porque foi só lá na terceira ou quarta vez que ouvi "Macaé" que me liguei que ao fim ela estava falando mesmo no cianureto que comprou pros dois se matarem. Coisa mais Romeu e Julieta, mal do século e afins, né? Em algum cemitério por aí, Lord Byron chora de saudade dos bons tempos. 

A música, que poderia facilmente se chamar "Melô da stalker", é um atestado de transtorno obsessivo-compulsivo dos graves, mas eu absolutamente adoro a quebra de expectativa. Ela mostra que é possível confessar que pensa em alguém o dia inteiro sem ser brega, faz piada disso, mas permite que a gente se identifique um bocadinho. Acredito (espero, torço) que a parte de decorar o RG, imprimir o mapa astral e grampear o celular seja uma licença poética, mas quem nunca soube mais do que seria de bom tom assumir sobre a vida de uma pessoa que não faz parte da sua vida (da forma que você queria)? Eu, pelo menos, me declaro culpadíssima. 


Em "Qualquer negócio", menina Clarice e/ou seu eu-lírico topam ser a empregada da empregada da empregada da empregada da empregada do tio do bonito, porque isso é muito melhor do que ser ninguém na vida dele. A coisa fica mais divertida e gritante quando chegamos em "Uma canção sobre o amor (oitavo andar)", que conta sobre um devaneio suicida. Que coisa linda pular do oitavo andar pra cair em cima da pessoa e poder curtir um romance no necrotério depois, né? Eu juro que ela usa essa palavra, e se regozija diante da perspectiva de se ver ao lado do seu amor, "cada um feito um picolé, com a mesma etiqueta no pé". É uma piada, claro, tanto que o clipe que está no Porta dos Fundos é totalmente voltado pro humor, mas isso me fez pensar um pouco sobre as letras das músicas.

Soa estranho ouvir alguém cantando sobre ficar no necrotério brincando de sério e achar o máximo que a autópsia da morte revele que a pessoa morreu, literalmente, por causa da outra, mas fico pensando se seria estranho em outra língua. Estava estudando pra minha prova de Antropologia Cultural hoje e um aspecto que os antropólogos levam muito em consideração na hora de formular suas proposições tem a ver com a língua. Ela não é simplesmente o instrumento que a gente usa pra dizer as coisas, mas por trás dela existe todo um referencial simbólico que nos ajuda a entender como aquela sociedade enxerga (e depois traduz) o mundo que vê. Isso fica muito perceptível quando você aprende uma outra língua. 

A Rebiscoito escreveu um post muito interessante falando sobre a diferença que existe em expressar amor e carinho por alguém na sua língua nativa ou em alguma outra que você domine. Como se chamar alguém de 'amor' em outra língua fosse mais tranquilo, tivesse menos peso. Isso faz tanto sentido que a gente tem muita facilidade em mandar um what the fuck por aí, mas muitos hesitam antes de escrever que porra é essa - eu, por exemplo, acabei de achar muito, muito feio (desculpa, mãe). 

Seguindo essa linha de raciocínio, a gente automaticamente associa a letra da Clarice ao nonsense e ao humor, mas chora cabernet-sauvignon com Morrissey em "There is a light that never goes out" (e dissolve se for o Brandon Flowers fazendo cover) que, objetivamente, fala sobre ser atropelado por um ônibus de dois andares ou então se chocar contra um caminhão de dez toneladas - dois acidentes fatais que se tornam celestiais quando se está do lado daquela pessoa especial. E a gente acha isso genuinamente lindo e queria tatuar nas costas.

Reflexões afetadas depois de exaustiva leitura de Franz Boas a parte, nonsense ou não, amor ou crime passional, as músicas dela são gostosas de se ouvir e realmente acho que ela merece uma chance. E se o Gregório Duvivier resolver dar uma sumida a moça tá seriamente encrencada.


vs.
(aham, tá)

11 comentários:

  1. Geralmente eu tenho preguiça de descobrir coisas novas, você sabe. Já tinha visto um vídeo dessa mulher e to vendo ela sair na mídia em tudo quanto é canto, e acho que ela tem cara de fofinha e de gente que vale a pena descobrir quem é, e por isso, veja, assisti os dois vídeos no seu post! Não cliquei nos links, porque aí já seria demais. #Sinceridades

    Ainda não acostumei com a melodia não, mas já grifei algumas das frases, hahaha.
    E, céus, como eu concordo com essa história das coisas ditas em línguas diferentes! Que pessoas gênias essas que param pra pensar nesse assunto, porque eu nunca ia reparar. E eu amo "There's a light that never goes out". Absolutamente amo!
    HAHAHA

    Beijos! <3

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  2. Acho que tem a ver, também, com a própria imagem/pessoa que compõe a música.
    Quando a gente encara as letras da Clarice como humor e nonsense, ajuda saber que ela é atriz e faz muito trabalho de humor. O Morrissey, enquanto isso, é o Morrissey.

    Mas faz todo sentido isso que você disse sobre a diferença nas línguas. Quem nunca se pegou no meio de uma conversa importante (principalmente se for por escrito, na internet) pensando "Damn! Isso seria tão mais fácil de dizer em inglês!"?

    (E já que o post é sobre uma cantora super fofa, não sei se você conhece a Russian Red. Ela é espanhola, mas canta em inglês, e é a coisa mais linda desse mundo. Vale a pena :DD)

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  3. Finalmente achei que pensasse como eu que, certas coisas, quando faladas/escritas em outra língua funcionasse melhor!

    E nunca tinha ouvido alguma música da Clarissa por achar que fosse uma espécie de Mallu Magalhães das antigas, mas hoje resolvi dar uma olhadinha e quase morri de rir! Que jeitinho meio bizarrinho da menina!

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  4. As músicas da Clarice são amor, ainda mais com esse humor sarcástico-mórbido dela. Gosto muito. Principalmente de Macaé. E da parte do mapa astral, hahaha.
    Mas de fato as coisas mudam e muito de uma língua para a outra. Palavrões em inglês = relax, take it easy. Em português = absurdo, feio feio feio. hahaha

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  5. A primeira música da Clarice que eu escutei foi "A Gente Voltou", que, acredito eu, é uma das (se não a) mais fofa de todas que eu já escutei dela. Quando descobri Oitavo Andar, quase chorei de tanto rir e me senti na obrigação de mostrar à todas as pessoas a música "meio estranha, mas muito daora" que ela tinha inventado. Adoro o modo como ela atua e a voz estranha dela, da mesma forma que gosto como ela quase sempre está com o mesmo vestido nos vídeos em que canta e como a melodia pega fácil, principalmente porque é impossível não se identificar (ainda mais com Macaé, afinal quem nunca stalkeou, né?).
    E sou obrigada à concordar com o Tyler ali em cima, porque, realmente, quem nunca pensou que seria mais fácil falar algo se fosse em outra língua?
    Adorei o post. (=
    http://tracerizar.blogspot.com.br/

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  6. Sou viciada na música dela pro Porta dos Fundos "essa é pra você" hahahahah é genial!!!!!!! Essa que vc citou nunca ouvi...
    E sou meio como vc, td mundo falou faz tempo dela e eu só ouvi semana passada tb, essa que deu título ao post e achei mt da engraçadinha, apesar da obsessão dela!!! Acho que talvez esse seja o intuito dela!
    E faz total diferença falar que gosta de alguém com as palavras dela do que com um 'eu te amo'!
    Que saudades de antropologia me deu com seu post!!!!!!!!!!!!
    Beijos!

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  7. A minha favorita é 'Uma canção sobre o Amor' que ouvi no Parafernalha pela primeira vez e apaixonei. Eu e minha irmã vivemos cantando no carro... Adoro a morbidez e a fofura, mas a voz da Clarice é o que deixa tudo mais bonito, com certeza. E eu já tinha falado dela pra você, não tinha? Jurava que você conhecia porque faz tempo que escuto as músicas da Clarice! Mas enfim, falha minha se não havia falado antes.

    Beijos, amiga <3

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  8. Só conhecia ela mesmo do canal, não sabia que cantava e tão bizarramente fofo. Além da voz linda, ela tem um jeitinho apaixonante :3

    Amei as melodias, parece que você está no sofá, comendo batata e tem alguém cantando, e sim, vou passar a noite ouvindo tudo. Adorei.

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  9. Tava aflita pensando "amd o que vou dizer num comentário a um texto sobre uma cantora da qual nunca ouvi falar?" até que você fala de FRANZ BOAS! Cara. Eu te amo! HAHAHAHAHA
    Toda vez que estudo algo novo em atropologia piro TANTO sobre o mundo ao meu redor, essa coisa das línguas é fodástica! Vc leu o "Tratado sobre a desigualdade social" (algo assim) do Rosseau? Bem, é um texto em que ele imagina como foi o surgimento da linguagem e é absurdamente FENOMENAL! Eu adoro essas coisas, sério mesmo.
    Daí que cara, sua teoria faz MUITO sentido e cairia de prato cheio na categoria dos meus "sonhos revolucionários", só que meu título seria algo como "também dá pra sofrer em português" HAHAHAHAHAHAHA
    Só que, bem, eu acho que talvez seja a melodia das músicas dela, porque, veja bem, as pessoas sofrem e se descabelam com Fresno ou, no meu caso, com Renato Russo, Chico Buarque, Caetano Veloso e claro, Tom e Vinícius. Mas, COM CERTEZA, me descabelo mais com as músicas estrangeiras. Só não tenho o problema dos palavrões, porque a antropologia desvencilhou-me deles.
    Cara, ler seus textos me faz ter vontade de conseguir escrever algo que preste.
    E, claro, depois dessa obriguei-me a ouvir Clarice Falcão. Ainda mais depois que vc disse que Lord Byron gostaria dela, rs.

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  10. Eu quero chorar por não ter escrito esse post!!!!!
    Anna, eu vivo reparando em músicas em inglês, que eu acho lindas, e pensando o que as pessoas que têm o inglês como primeira língua pensam ao ouvirem as mesmas. Porque, com certeza, não é o mesmo que eu sinto. Pensa comigo como os gringos devem achar meio chiclê e brega dizer que ela-será-amada, sendo que eu, aqui no Brasil e o português na ponta da língua, choro horrores e grito SHE WIIIILLLLLLL BE LOOOOOVEDDDDD como se fosse a coisa mais profunda do universo.
    É louco.

    As músicas da Clarice não são meu tipo favorito de música, mas o relacionamento dela com o Gregório me encanta TANTO que eu acho amor demais. Assim, as letras são ótimas pra postar no twitter ou no facebook como indireta, mas as melodias não são a alegria dos meus ouvidos, não.

    Beijos, Annoca!

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  11. Aaahh, eu também to apaixonaaaada pelas músicas dessa menina... *_* Cheguei a entrar numa fase de "monomania" em relação às músicas dela, criar um playlist e ficar ouvindo over and over again por dias a fio... hahah.. E é bem isso que você disse: ela consegue falar de amor de uma forma leve, sem ser piegas, descompromissada, até, fazendo piadinhas... E acho que é até por isso que todo mundo se identifica... Porque ninguém vai assumir tranquilamente, de verdade verdadeira, que é meio stalker da pessoa que ama... Mas se alguém faz uma brincadeira e fala de um jeito engraçadinho, é mais fácil você rir e falar "ahahaha... Fato!" :)
    Sem falar que a melodia e a voz meiguinha dela são uma delicinha de se ouvir, né... É aquele tipo de música em que a gente moraria dentro, se fosse possível... :)

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