Ser tomada de assalto por um
texto é uma das melhores coisas que se pode acontecer a qualquer pessoa que
escreve. É aquele momento em que você está fazendo qualquer coisa que não
pensar em escrever, e de repente é completamente dominado pelas palavras, que dançam
na sua cabeça ao melhor estilo Alice no País das Maravilhas versão Disney. Seu
cérebro começa a trabalhar freneticamente independentemente de você querer
aquilo ou não, de ser 4h da manhã e você ter que acordar às 6h, de você estar
no cinema vendo um filme do David Lynch, ou simplesmente muito cansado pra
pensar. O texto vem e você só encontra a paz quando senta e escreve. E quando
isso acontece é mágico, é um fenômeno, é
como se o cérebro, as mãos que escrevem e o papel trabalhassem numa dinâmica quase
transcendental, pra deixar esse parágrafo um pouco mais hippie.
Adoro quando Hank diz que o exercício de criar é inegavel e absolutamente assustador, e que uma vez que todos nós criamos - ainda que seja apenas a nós mesmos -, todos estamos assustados. Isso significa que ter medo é algo absolutamente normal, e, uma vez que a gente não pode se livrar dessa sensação, melhor mesmo é criar com mais afinco, não deixando esse monstro verde nos dominar. Já o fofo do Michael, ao fim do seu vídeo, diz que ter medo é normal e a gente não deve sentir vergonha disso ou se deixar abater. Pra ele, a melhor forma de aceitar o medo é tirando um dia, uma semana, um mês que seja, pra se deixar ser completamente abatido pelo medo, deixar que ele nos consuma, e depois renascer das cinzas fortalecido pela experiência, afinal você já passou pelo pior, certo? Eu costumava fazer isso ano passado. Imaginava o que aconteceria caso eu não passasse no vestibular e estruturava minha vida a partir dessa perspectiva, até ver que ok, não seria o fim do mundo e eu conseguiria enfrentar aquilo, então vamos em frente.
No entanto, como meu pai muito
sabiamente me ensinou um dia e eu aplico em todos os setores da minha
vida, não existe almoço de graça. Isso significa que não são todos os textos
que simplesmente brotam na nossa cabeça, pelo contrário, isso só acontece com
uma parcela ínfima, selecionada com extremo rigor e crueza. Para todas as
outras coisas na vida a gente pode aplicar o velho critério dos 90% de
transpiração e apenas 10 de inspiração ou, no máximo, aquela declaração do
Chico Buarque de que a gente trabalha as ideias de forma inconsciente por
semanas, meses, até que um dia elas nascem e a gente acredita que foi coisa do
momento.
Meu ponto aqui não é sobre os
melindres da criação, contudo. Até porque eu tenho um blog. Um blog! Se Machado
de Assis me visse discorrer com essa cara de pau toda sobre seu ofício e sua
arte, certamente me colocaria como coadjuvante fútil e abestalhada em algum de
seus romances, como escape cômico. Aceito o risco de bom grado e direi mais:
textos que brotam são a heroína da escrita, ao menos pra mim. Se Mark Renton
fosse escritor, blogueiro ou estudante de jornalismo, não duvido que ele
colocaria o prazer de crônica espontânea ao lado, ou ao menos próximo, do
barato da droga que consegue ser melhor que o melhor orgasmo que você já teve
na vida multiplicado por sei lá quanto. E, como eu ia dizendo, eles são raros,
e essa condição, na cabeça de pessoas cismadas como eu, pode se tornar um
problema.
Sabe quando a gente está lendo um
livro incrível e chega uma passagem que nos toca de uma maneira única,
arrepiando todos os pelos do corpo e enchendo os olhos d'água? Sempre que me
deparo com uma dessas, sou também tomada por um pânico de nunca mais conseguir
sentir aquilo de novo, como se já tivesse esgotado a minha cota de catarses
literárias da vida. O mesmo com os textos. Logo após o último ponto final
daquele post que me surgiu como um vômito de palavras e ideias que se
encadearam sem que eu tivesse que fazer força, eu já surto e penso que pronto,
magia nunca mais, vou passar o resto da vida folheando o dicionário de
sinônimos em busca da frase perfeita. O último "post espontâneo"
postado aqui foi aquele das eleições de Tupaciguara. Eu estava quase dormindo
quando as primeiras frases surgiram, então acendi a luz, peguei um caderno e
escrevi loucamente, o resto dele nascendo à medida que as ideias anteriores
tomavam forma.
Minha vida em um gif |
Coincidentemente ou não, aquele
foi o último post daqui que eu genuinamente gostei. O último que eu postei
sentindo que não faltava absolutamente nada, que eu fiquei com vontade de reler
e não só com vergonha de abrir o blog e com a sensação de que eu era uma
fraude. Eu sei que isso não faz o maior sentido, mas não é como se eu pudesse
controlar essa sensação horrível. Se eu pudesse, aliás, não estaria escrevendo
este texto.
O título não é aleatório.
Recentemente, Charlie McDonnel, um youtuber inglês absolutamente divertido,
criativo e adorável, postou um vídeo em seu canal sob o título "I'm
Scared". Nele, Charlie justificava o lento ritmo produtivo recente com seu
medo, total pânico diante da ideia de talvez não ser bom o suficiente, de não
agradar mais. Ele conta que a vida toda foi muito tímido e inseguro, e que o
Youtube foi o local em que ele sentiu que poderia ser ele mesmo, porque lá
havia pessoas que gostavam e se identificavam com aquilo que ele fazia, com
quem ele era. O problema é que ele se tornou consciente dessa condição, que
agora estava massacrando-o: e se as pessoas parassem de gostar dele? e se tudo
aquilo que um dia fez sentido pra um monte de gente de repente se tornasse uma
produção sem sentindo e completamente dispensável? Essas dúvidas apareciam sempre que ele tentava produzir algo novo, e o medo de não ser bom, ou pelo menos não tão bom como já foi um dia, o paralisava por completo.
Pouca gente conhece ele por aqui
- e se não fosse pela Taryne, a rainha do Youtube, eu também não o conheceria
(amiga, obrigada por dividir suas coisas favoritas comigo) - , mas ele é bem famoso na gringa, principalmente por ser
nerdfighter e muito chapa do Hank Green. Sua vídeo-confissão causou uma
repercussão bem comovente, com uma série de vídeos-resposta que fazem a gente ter mais fé na humanidade.
O próprio fez um apanhado das melhores e postou como uma lista de reprodução,
que eu recomendo veementemente à todos que estão precisando de uma força, mas
tenho duas respostas favoritas bem específicas, que é a que o próprio Hank fez e outra do Michael Aranda, amigo de Charlie.
Adoro quando Hank diz que o exercício de criar é inegavel e absolutamente assustador, e que uma vez que todos nós criamos - ainda que seja apenas a nós mesmos -, todos estamos assustados. Isso significa que ter medo é algo absolutamente normal, e, uma vez que a gente não pode se livrar dessa sensação, melhor mesmo é criar com mais afinco, não deixando esse monstro verde nos dominar. Já o fofo do Michael, ao fim do seu vídeo, diz que ter medo é normal e a gente não deve sentir vergonha disso ou se deixar abater. Pra ele, a melhor forma de aceitar o medo é tirando um dia, uma semana, um mês que seja, pra se deixar ser completamente abatido pelo medo, deixar que ele nos consuma, e depois renascer das cinzas fortalecido pela experiência, afinal você já passou pelo pior, certo? Eu costumava fazer isso ano passado. Imaginava o que aconteceria caso eu não passasse no vestibular e estruturava minha vida a partir dessa perspectiva, até ver que ok, não seria o fim do mundo e eu conseguiria enfrentar aquilo, então vamos em frente.
Assim sendo, esta sou eu sentindo
medo. Oi, meu nome é Anna Vitória e sou fatalista demais pros meus poucos 18
anos de vida, e se nas últimas semanas não tenho gostado muito daquilo que
escrevo, logo imagino que nunca mais vou gostar de nada que irei escrever até o
fim dos meus dias, o que significaria o fim desse blog, que eu gosto tanto.
Isso me enche de medo, mais do que uma pessoa normal acharia ok alguém sentir por conta de um punhado de palavras
juntas, mas fazer o quê?
Charlie, querido, me dê a mão e
vamos enfrentar esse monstro. Você não está sozinho.
(e acreditem ou não, mas esse
texto começou como um doloroso processo de 90% transpiração e blábláblá e
terminou como uma criação quase espontânea)
Sei muito bem como se sente. Já cheguei a ficar dois meses sem querer escrever, e outras tantas tentativas frustantes. Mas isso passa, pode ter certeza.
ResponderExcluirBj
Annoca, esse post bem resume a minha vida de blogueira. Quase sempre me sinto assim quando vou escrever um texto, e aí eu fico não, não vou postar isso, não tem nada a ver, tá uma porcaria. São raras as vezes em que escrevo algo e fico relendo, pensando no quanto adorei o que escrevi.
ResponderExcluirOutro dia, fui a um evento chamado Café Literário, no qual dois autores capixabas ficam conversando e nós, meros mortais, ficamos ouvindo. Um deles, quando questionado sobre os contrapontos de seu livro, disse que só os escreveu pois não havia preenchido o número mínimo de páginas para um concurso. E aí eu percebi o quanto é ruim você ter que escrever algo assim, por obrigação. Ele mal sabia do que se tratavam os contrapontos, e se sentia constrangido de ter que admitir.
Acho então que, no fim, nós só devemos escrever quando sentirmos necessidade, ou quando, como você disse, algo muito sensacional vier às nossas mentes. E sempre, sempre lembrar que o essencial é que nós gostemos, o público é secundário. Não sei, tento manter isso em mente.
MAS, minha cara, você, brilhante do jeito que é, tem muito menos a temer do que eu, do que várias outras pessoas aspirantes a escritoras por aí. Você é sensacional na maioria dos casos e eu não vou deixar de falar o quanto te admiro por isso. Fim.
Beijos <3
É, minha flor. Toca aqui porque fomos assoladas pelo mesmo mal. Eu ando assim. Tem tempo que não vem uma pérola pronta na minha cabeça. De vez em quando ainda me vem um título legal, mesmo que seja somente uma paráfrase (A vida é a arte da sintonia). Mas enfim, eu sofro como você, e fico com vontade de sumir por não poder encher meu blog de coisas lindas, pela raiva de deixá-lo vazio, e pelo desespero de encher com palavras vazias que podem vir a não dizer nada, e que não agradem ninguém.. É duro! We are really all scared..
ResponderExcluirTe amo.
Doeu meu coração ler isso!! Não consigo conceber que você pense isso de si mesma! Seus textos são tão geniais que me dói pensar que você não acha isso! Sério! Quanto à apoteose homérica de textos que surgem na nossa cabeça do nada, morro de raiva porque comigo isso acontece MUITO. Estou escovando os dentes e minha cabeça começa a recitar um texto ÓTIMO, daí eu sento pra escrever e já não lembro mais dos detalhes e ele fica uma bosta. O problema é que isso acontece quase todo dia e, assim sendo, todos os textos que eu escrevo são apenas um quarto do que deveriam ser, caso eu fosse capaz de extrair exatamente o que minha cabeça tinha planejado! O fato é que meu celular tem uma to do list com mais de 15 títulos e eu resolvi que farei todos eles até o fim do ano porque cansei de sofrer, viu? Nunca passei pelo que você passa, nem sei como te auxiliar, sorry.
ResponderExcluirMas saiba que você é eternamente minha principal ídola blogueira, tá? <3
Anna, acho que o medo assombra todo mundo em grande parte de nossas vidas, é normal, isso faz parte de ser humano, como muito bem disse Charlie. Acho que vai muito além do "escrever", "criar", isso abrange o ~ser~. Ser do jeito que somos nos assusta, bate a dúvida do por que sou assim e não assado? Estou fazendo a coisa certa? Devo seguir mesmo por esse caminho? O que será que irão pensar de mim se eu fizer isso? Frango ou peixe? hahahha. Tudo nessa vida pode nos deixar com medo algum dia.
ResponderExcluirEu ainda não tinha visto esse vídeo do Charlie, e minha nossa, quase chorei. Eu sempre o achei incrível, já até aprendi a fazer brownies com ele! É fantástico ver que pessoas tão distantes partilham das mesmas neuras. Contudo, fique tranquila, estamos todos no mesmo barco. O importante é jamais deixar o medo te impedir de remar.
Um super beijo, e nunca vou cansar de dizer que eu amo você, seu blog, seus textos, sua genialidade... <3
Excelente esse texto. Passo por isso o tempo todo, e ultimamente esse tem sido um dos principais motivos pelos quais meu blog está em hiatus. Mas isso geralmente passa, e eu tenho certeza que o seu medo vai passar também. Ou você aprende a viver com ele, só não pode deixar te paralisar.
ResponderExcluirEnfim, gosto bastante dos vídeos do Charlie e dos irmãos Green também, eles sempre falam coisas interessantes :)
beijos
Não tenha tanto medo, os seus textos são excelentes. Visito o seu blog sempre para ler seus causos do dia-a-dia, e eles se tornam tão interessantes pela forma como você escreve, envolve bastante os leitores, pela criatividade de imagens e gifs sempre colocados no momento certo. Um blog muito pessoal mas que me cativou tanto que venho sempre duas vezes por semana (de lei) ler os postagens.
ResponderExcluirTudo de bom. Beijos.
Nunca comento aqui e só tenho a dizer: Seu blog é o meu preferido há 3 anos. Espero que o ~medo~ passe logo, porque, menina, você é absolutamente genial.
ResponderExcluirOlá!
ResponderExcluirTambém me sinto assim, exatamente como você descreve. E os textos legais, junto com a vontade de escrever ocorrem em momentos inusitados. No meu caso, quando estou quase dormindo ou no ônibus. Se eu não escrevo na hora, já era. Poucos são os textos que eu escrevi e gosto de reler. Rsrs!
Você não está sozinha nessa minha cara... rs!
Tchau! tchau!
Acho que o medo nos alerta que ainda estamos vivos e que ainda temos sentimentos. Adorei o post!
ResponderExcluirO Jovem Jornalista fez 4 anos ontem, passa lá e vote, também nas enquetes!
Ai, Annoca, tive que vir aqui comentar, né? Muita coisa importante num post só.
ResponderExcluirEu me identifiquei loucamente com o vídeo do Charlie. Lembro de ter ficado uns minutos olhando pro computador quando o vídeo terminou, pensando que uau, alguém tinha colocado em palavras tudo que eu sentia em relação à escrita.
Sim, nós somos blogueiras, ninguém aqui é o Machado em pessoa. Mas isso não quer dizer que não seja importante. Como leitora, posso afirmar com certeza que o que você escreve é incrivelmente bom e tenho certeza de que pra muitos outros leitores também. Temos essa sensação de que só porque a coisa acontece na internet não é tão séria assim. Escrever é sério. Ter um blog, ainda que a coisa seja descompromissada e leve, é sério.
Nem preciso contar que a resposta do Hank é uma daquelas coisas que você quer tatuar, trancar na cabeça, comer, cheirar, tudo pra que você não esqueça nunca. Pra quando o medo bater você saber que não está sozinha e que ainda pode criar alguma coisa boa.
Obrigada por esse post. <3
Gostei muito do seu texto.
ResponderExcluirConheço o Charlie já faz um tempo, mas me afastei dele um pouco esse ano e acabei não tendo contato com esse vídeo. Os medos pelos quais ele passa agora são os que eu temo passar com o meu próprio blog. Só a possibilidade disso já me assusta.
Mas acho que talvez seja necessário, sabe? Se os medos não existissem, talvez não existe a vontade de ultrapassá-los e assim, nós ficaríamos sempre no mesmo degrau. Espero me lembrar disso quando o momento chegar.
P.S: Tem um selo pra você lá no blog (: Último post
http://cxdamari.blogspot.com.br/