sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Talvez Beatles não seja minha banda favorita

Fazer vinte anos supostamente é algo importante, porque as pessoas não param de destacar isso quando vão me dar os parabéns. Foi pensando nisso que há algumas semanas eu vinha pensando em fazer uma mixtape que tivesse como enfoque única e exclusivamente a minha pessoa e trouxesse a listagem mais ou menos definitiva das vinte músicas da minha vida. Se você leu Alta Fidelidade, você entende que isso sim é importante - pelo menos para pessoas como eu e Rob Fleming.


Há alguns anos tenho uma listinha pré-programada com mais ou menos uns cinco músicas que eu sempre cito como favoritas. Curiosamente, todas estão na lista de mais ouvidas de todos os tempos do LastFm - que é algo expressivo, já que eu não sou do tipo que ouve uma música repetidamente até não suportar mais. O problema é que ao colocar essa lista no papel, percebi que não ouvia várias daquelas músicas há uns bons meses - se não anos. E mesmo que quando eu ouça (porque eu fui ouvir para tirar a prova) eu sinta a mesma onda de emoções tomar conta de mim, me parece estranho falar sobre as vinte músicas da minha vida que não tocam na minha vida ou que pelo menos não sejam representativas dos meus vinte anos - já que supostamente isso é muito importante.

No embalo das músicas, parei para pensar um pouco sobre as minhas bandas favoritas - curiosamente, também aquelas que aparecem como mais ouvidas no LastFm - e percebi que tenho escutado pouca coisa das cinco primeiras posições nos últimos anos. Sim, eu disse anos. Novamente, como pode ser a banda da minha vida se ela não toca da minha vida?

O problema é que a banda da minha vida é Beatles. Sempre foi. Não tem como destronar os Beatles. Não tem como ser mais imponente e significativo do que eles na vida de alguém. Não existe uma cartada melhor. Existe?

Não apenas a melhor banda, mas a melhor banda com as melhores fotos
Decidi que Beatles era minha banda favorita quando eu tinha uns 12 anos e ganhei o Revolver. Na décima faixa, For No One, eu concluí que nunca ouviria nada tão excelente quanto aquilo, então ficou decidido que eles eram meus favoritos. Depois veio o Abbey Road, seguido de alguns filmes, uma discografia inteira, pôsteres no quarto, livros, canecas, camisetas e todos os meus amigos vendo algo dos Beatles e lembrando de mim. Veio o show do Paul McCartney, a conclusão de que ele era o cara mais legal do mundo e que Blackbird, essa sim, era a música mais bonita já feita por um ser humano.


Eu cheguei a escrever aqui que uma das coisas mais incríveis de se ver um ex-Beatle ao vivo cantando canções dos Beatles é ver que as sessenta mil pessoas reunidas naquele estádio estão cantando uma mesma coisa. Fazendo isso com alma, paixão e lágrimas nos olhos, porque quando o Paul McCartney sobe num palco e canta Eleanor Rigby, ele faz isso para mim, mas também para a pessoa que está do meu lado, e para aquela que está na arquibancada e para o felizardo que conseguiu ingresso de pista premium. Todos somos pessoas solitárias vindas de um lugar desconhecido. Então é meu, mas também é universal. Isso é incrível, extraordinário e é por isso que os Beatles foram, são e sempre serão sensacionais - mas quando se faz vinte anos, isso não é o suficiente.

Às vésperas de fazer vinte anos, eu percebi que precisava de mais. Os Beatles sempre foram os melhores, mas eles nunca foram plenamente meus. Abraço um sem número das suas letras, mas não sei dizer se alguma é genuinamente minha, a ponto de passar batida pela maioria das pessoas, mas tendo ao mesmo tempo aquela chord change that melts my guts (para citar Rob Fleming novamente), que só eu sei onde se encontra e só eu sei o que acontece dentro do meu coração quando ela toca. 

Brega, claro, mas aos vinte eu já tenho direito a uma crise de meia-idade em busca de identidade. 

Então é mais ou menos assim, vivi todos esses anos (20 na identidade e uns 200 de alma) para chegar num suposto marco da vida e descobrir que não tenho uma banda favorita e que talvez todos os meus anos de bandas favoritas foram uma mentira. A tríade Beatles, Strokes e Los Hermanos (esses merecem um post próprio) está desfeita e sabe Deus o que vem pela frente. Tem dias que acordo e acho que Rilo Kiley é a banda da minha vida, mas nos últimos dias só Wilco me satisfaz. Vira e mexe penso que a única certeza da minha vida é o Chico Buarque, mas o que eu faço quando basta eu entrar no ônibus pra Beyoncé vir quicando nos meus fones? Sem contar os dias que eu volto a ouvir Beatles e me acho maluca por ter pensado em tudo isso - o talvez do título tem uma razão de ser.

E nem vamos falar de Taylor Swift e One Direction, porque aí eu provavelmente vou concluir que no fundo minha vida sempre teve As Quatro Estações (o disco), de Sandy e Junior, como plano de fundo. 

Mas a lista das vinte músicas sai, hein. Me aguardem. 

I'm sure I do. Or at least, I'm sure I will. But tonight, I have to confess (but only to myself, obviously) that maybe, given the right set of peculiar, freakish, probably unrepeatable circumstances, it's not what you like but what you're like that's important. I'm not going to be the one that explains to Barry how this might happen, though.

{Nick Hornby - High Fidelity}

É claro que ele não curtiu esse post

domingo, 23 de fevereiro de 2014

De onde eu escrevo

Esse post faz parte da Blogagem Coletiva do Rotaroots, grupo criado para reunir blogueiros de raiz que sentem falta da blogosfera moleque e pé no chão. Para participar, junte-se a nós no grupo do Facebook mais cheio de nostalgia que já se teve notícia e coloque seu link no rotation. O tema desse mês é: de onde eu blogo
Uma das resoluções de ano novo que fiz no fim de 2011 (!) era a de deixar o meu quarto um pouco mais a minha cara. Passei por aquele mal de viver num ambiente que foi juntando restos de infância com uns pedaços de adolescência que no fim das contas mais tinha cara de bagunça do que refletia aquela pessoa que o habitava - no caso, eu (dã!). Não teve reforma radical e nem projeto de decoração algum, só eu mesmo que aos poucos fui me livrando de algumas coisas que não tinham nada a ver, arranjando espaço para aquelas coisinhas que refletem o que sou hoje, e o resultado, a meu ver, ficou bem satisfatório. Fico muito feliz quando meus amigos vem me visitar, porque eles sempre dizem que adoram o meu quarto e que ele é totalmente a minha cara, e esse era o objetivo desde o começo.























Ainda acho que o espaço ainda precisa urgentemente de uma escrivaninha nova e uma estante decente, mas mesmo sem esses detalhes práticos, posso dizer que hoje ele é o lugar da casa que eu mais gosto de ficar. Minha mãe costuma dizer que, pelo menos nos dias de semana, se eu estou em casa, ou é dormindo ou é no computador - que é de onde eu blogo. Nunca instituí formalmente que meu quarto era meu home office, mas na prática é isso que acontece, já que é o lugar onde meus computadores, livros e referências ficam e onde passo boa parte do dia trabalhando, escrevendo e perdendo tempo na internet. 

Sem mais delongas, vamos dar play nessa música simbólica e conhecer o ~meu cantinho~:



Meu desktop é muito velho, jurássico mesmo, e acabo mantendo ele por causa do Photoshop e outros programas que acabam rodando melhor nele do que num notebook. Como uso pouco esses recursos, costumo deixar o fio desse monitor maior solto, assim eu posso conectá-lo ao notebook pra poder assistir filmes e séries numa tela bem maior. Junto dos computadores, alguns livros e muitas coisinhas que eu adoro: brinquedos, lembranças, caderninhos, minha coleção de marcadores de página, quadrinhos, post-its. Parece um pouco bagunçado - e é, considerando que essa é a versão organizada - mas já entendi que minimalismo não tem nada a ver comigo e com meu estilo de vida. Onde tem Anna Vitória tem poluição visual e muita informação, mas cada objeto juntando poeira nos cantos do meu quarto tem uma razão de ser e uma história pra contar.

Passe o mouse para ver meus comentários
Para dar uma dimensão bem realista da coisa e não parecer que eu maquiei o ambiente para tirar essas fotos, mantive na mesa o copo de água e a caneca que me acompanham pra tudo quanto é canto. Como passo muito tempo no quarto, acabo usando ele também de cenário para algumas refeições (sei que é feio, mas me deixem tomar meu café da manhã vendo seriado) e sempre tem caneca de chá ou café em algum canto, junto com copo d'água. Embaixo desse jornal meio no chão fica uma caixa só com papelada, de textos da faculdade que uso mais no dia-a-dia a revistas e pedaços de jornal. Sim, meu futuro está no Acumuladores. Dentro desse baú tem umas coisas velhas de escola, minha coleção de papéis de carta e Caprichos velhas. A superfície serve de apoio, com aqueles livros que não tem muito espaço definido, revistas mais novas e outras coisas que acabam ficando sem lugar. 






















Mantra para a vida e um globinho pra eu nunca esquecer do meu plano maléfico de dominar o mundo.

Detalhe do meu baú/estante improvisada: quem estiver curioso quanto aos livrinhos, gravei um tour pela minha estante no começo do ano passado. Está um pouco desatualizada - principalmente nessa parte da foto, que é onde ficam os livros mais novos - , mas dá pra ter uma noção legal do espaço da mesa. Esse dinossaurinho roxo eu ganhei de presente ainda na maternidade e essa câmera é a Lydia, minha analógica. 






















Esse presépiozinho - que é uma espécie de caixinha de música - também foi um presente de maternidade. Já o pequeno pônei eu ganhei de uma amiga maranhense que veio passear em Uberlândia. O quadrinho de trás tem motivos parisienses e foi presente de aniversário de uma amiga muito querida, assim como esse livro mais grosso, uma edição de luxo de Sense and Sensibility que ganhei do meu melhor amigo.

Por fim, um detalhe que eu adoro: a tulipa mafiosa, que a Analu mandou fazer para o nosso primeiro encontro e deu de presente para todas nós. Ela fica dentro do meu porta-lápis - que é lembrança do aniversário de um ano de um primo muito amado - com canetas coloridas e vários marca-páginas especiais. Essa Lindinha eu ganhei ainda criança, porque todo mundo dizia que eu era parecida com ela. Eu não disse que cada tralha contava uma história?

Estou com planos de comprar uma mesa e uma estante de respeito esse ano, e caso eu vá mesmo reformar meu quarto, manterei vocês atualizados. Espero que tenham gostado!

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Crônica de um céu laranja na minha janela

Ou: ode às crônicas
Ou, ainda: se tudo der errado eu viro mocinha do tempo
(E também poderia ser: sdds Hilary Duff)

No começo desse semestre uma professora nova foi se apresentar e entre uma coisinha ou outra que disse sobre a vida e o trabalho, ela contou que gostava de escrever crônicas. Tendo dado boas risadas com sua breve autobiografia e folheando sua tese de doutorado com uma tema super legal e agradecimentos ao Pearl Jam no fim, eu já era fã antecipadamente, sem que ela precisasse dizer qualquer outra coisa, mas ela foi lá e disse: sobre crônicas, Ingrid falou que elas eram a melhor e mais autêntica forma de se contar uma história, melhor até que o próprio jornalismo - que nada mais é que a narrativa diária da nossa vida besta e que mesmo assim insiste em ser tão mecânico e frio. 

Uma coisa, ela disse, é ouvir a previsão do tempo ou ler uma nota falando sobre o calor, outra bem diferente era ler uma crônica que descrevesse o mormaço em Uberlândia numa tarde de sexta, em que você olha pela janela e as folhas das árvores não se mexem. Dois parágrafos sobre a onda de calor e as secas da época passam batidos, mas quando o Antonio Prata escreve que o o governo do Astro Rei tem sido bem despótico, você sabe que vai lembrar pra sempre daquele verão de 2014 em que ia para a faculdade com cheiro de Sundown (e de praia, de cloro, e de piscina) porque não aguentava mais tostar os ombros andando na rua.

Essa aula aconteceu em meados de novembro, quando o verão ainda nem era o verão e eu ri da minha professora paulista que caíra recentemente de paraquedas nesse mundão velho sem porteira que é o interior de Minas: ha, ingênua, ela ainda não viu nada. O calor, esse sobre o qual se escrevem crônicas, notas de repúdio, exclamações de elevador e matérias de dois parágrafos sobre a seca, foi começar mesmo em 2014. Pelo menos aqui em Uberlândia foi muito simbólico chegar na cozinha para tomar café da manhã no dia primeiro de janeiro e ter a nítida sensação de que o acordo civilizatório com as altas temperaturas havia chegado ao fim, e como um presidente muito afoito, bastou o ano entrar para a quentura tomar posse e governar nossas vidas - até a última sexta.

Sexta-feira, dia 14 de fevereiro de 2014, eu estava numa sala com ar condicionado e janelas fechadas, sem contato com o mundo exterior, quando uma colega entrou atrasada e molhada: uai, tá chovendo? Estava, assim como choveu pelo resto do dia, e durante todo o fim de semana, assim como chove agora. Passei quase uma hora ilhada esperando minha mãe atender o celular para fazer a bondade de me dar uma carona, mas tudo bem. O guarda-chuva cor-de-rosa estava de férias em casa, empoeirado em algum fundo de armário e eu tinha ficado na mão, mas tudo bem. Estava chovendo. Era Valentine's Day e as pessoas insistiam em ficar falando disso por aqui como se fosse coisa nossa, e eu lembrava de um filme ótimo para se ver nessa data, A Nova Cinderela, quando a Hilary Duff diz que esperar pelo seu ~príncipe~ era tão decepcionante e inútil quanto esperar pela chuva durante uma estiagem. No final do filme, é claro, eles se beijam na chuva ("e este verão abafado parece a ambientação perfeita para uma desgraça em um conto vagabundo, desses em que chove quando o protagonista sofre por amor", escreve Pratinha em "Estiagem") e eu pensava com meus botões que naquele dia ter um encontro com a chuva era bem mais desejável que o próprio Chad Michael Murray. 


Mas, divago: eu queria falar sobre a janela do meu quarto e a mania que tenho de dormir com ela aberta. A janela fica bem acima da minha cabeceira, de modo que quando eu deito de barriga pra cima e levanto um pouquinho o queixo, eu consigo ver o céu. E depois de anos de janela aberta (e uma garganta bem mais sensível, devo admitir) eu aprendi a ler o céu e saber o que ele reserva para o dia seguinte. Tenho essa fantasia brejeira de um dia me ver sentada de cócoras no quintal de casa, rodeada por netos, e aí lamber o dedo, levantar o braço e prever que horas a chuva cai. 

Nas últimas semanas, fui me deitar todos os dias vendo um céu limpinho me espiar caindo no sono, na maior parte das vezes cravado de estrelas. Às oito da manhã isso significa um céu opressivamente azul e sem nuvem alguma, com várias camadas de Sundown nos ombros (e aquele cheiro de piscina, e férias, e vida, me lembrando que eu não deveria estar tendo aula). Mas, nos últimos dias, quem tem me dado boa noite é um céu alaranjado, tanto que até parece que as noites são mais claras. Às oito da manhã isso significa um céu branquinho, às vezes cinza, e tem dias que eu acordo com a testa meio molhada graças aos pingos de chuva. O guarda-chuva cor-de-rosa trabalhou bastante durante o fim de semana. 

'Depois de 16 dias de estiagem, volta a chover em Uberlândia', é o que diz uma manchete do jornal local, e os dois parágrafos explicam todos os fatores envolvidos na questão e informam como deve ser. Não há nada ali, no entanto, que evoque a sensação de ir dormir com a promessa perfeita de um céu laranja na janela acima da cabeceira, depois de semanas do governo despótico do Astro Rei. E é por isso que a gente escreve, para tentar engarrafar numa crônica a brisa gelada de toda a noite de chuva. 

Que bom que elas existem. 

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Vida longa às lapiseiras

Está morta a minha lapiseira lilás.
Vida longa à lapiseira.

Estava ontem lendo uns posts antigos do blog e dei de cara com um no qual eu choramingava a perda da minha lapiseira, que desaparecera misteriosamente enquanto eu conversava na hora do recreio. Parece idiota (e é), mas eu lembro exatamente desse dia, lembro que à tarde cheguei na escola pra estudar e meus olhos se encheram de lágrimas porque eu não tinha mais a lapiseira e foi tão forte que eu precisei largar tudo e escrever aquele post. 

Alguns dias depois eu fui lá e comprei outra lapiseira, que durou até o fim do ano passado. Veja bem, eu sou excessivamente apegada com as minhas lapiseiras, elas são uma das poucas coisas certas na minha vida. Envelhecer é saber que um dia você já chorou na papelaria porque queria a caixa de lápis de cor de 48 cores e sua mãe disse que compraria a de 24, mas hoje sobrevive com uma lapiseira, uma borracha e uma caneca Bic que veio de brinde naquela última semana acadêmica. E tá tudo ótimo! Porque a lapiseira está ali.

O sumiço da lapiseira de 2010 me abalou de tal modo que quando comprei uma nova, jurei que eu nunca ia deixar ela desaparecer. Porque, como eu contei naquele post de quatro anos atrás, as minhas coisas simplesmente somem, sem qualquer explicação aparente. Era uma questão de honra (e amor pelo meu dinheiro, porque lapiseira não é um troço barato) não deixar a nova sumir, quase que uma forma de honrar todas as outras que vieram antes dela e também de intimidar os nargulés e duendes que ousassem pensar em tirar minha preciosa de mim. 

Por diversas vezes eu pensei que tivesse perdido a lapiseira, mas sempre que eu encontrava ela no fundo de uma bolsa, dentro de um caderno, atrás da cama ou presa no meu cabelo, eu me sentia vitoriosa, como se estivesse no controle da situação. Era eu contra as circunstâncias absurdas e inexplicáveis do universo, e toda vez que a lapiseira aparecia, eu sentia que mais uma batalhava estava ganha. Eu contra o mundo, rumo ao hexa, invicta, a campeã voltou, gigante acordou, etc.

Aí eu perdi meu estojo.

Daquele mesmo jeito sem explicação que as minhas coisas somem, meu estojo evaporou da face da Terra. Não existe justificativa plausível, já que eu assisti a aula de francês com o estojo e quando cheguei em casa ele não estava mais lá. Meu professor disse que ele não ficou pra trás, as moças da secretaria não viram nada e ele não caiu dentro do carro e nem está em casa. Ok, meu professor ou algum funcionário da escola bem que poderia passar a mão nele, mas quem é que ia querer um estojo de cerejinhas, com uma lapiseira velha, uma caneta sem tampa que funciona, 18 estragadas, e um monte de papéis de bala dentro? Enfim, meu estojo sumiu e, o que é crucial nesse momento, minha lapiseira permaneceu. Eu estava mandando tão bem nesse jogo que fui capaz de perder um estojo inteiro, mas consegui manter minha lapiseirinha lilás, que estava bem segura dentro de um livro - pra vocês verem que ser desorganizada tem seu lado bom. 


2014 chegou, ano novo, vida nova, decidi que era hora de criar vergonha na cara e comprar um estojo e umas canetas. Cheguei na primeira aula do ano toda pimpona, com meu caderno novo (ah é, eu consegui perder meu caderno), meu estojo reluzente, minhas canetas coloridas e a lapiseira lilás velha de guerra. Que se desfez na minha mão antes que eu pudesse escrever a data no caderno. Assim, sem mais nem menos. Eu cliquei e a lapiseira quebrou, os pedaços começaram a deslizar e eu não consegui montar ela de volta. Guardei e fingi que nada aconteceu, porque vai que ela resolve se montar sozinha. Esperei uns dias e: nada. Até tutorial no Youtube eu procurei para ver se consertava a bendita, tudo sem sucesso.

Minha negação dessa vez durou pouco mais de um mês, porque eu tinha uma prova pra fazer e uma hora a gente descobre que ficar apontando lápis não é lá um troço muito produtivo. Comprei uma lapiseira nova, que não era magicamente bela e lilás como a antiga porque na papelaria da faculdade eu só encontrei aquela azul com cara de coisa de pai, mas tudo bem. É o mesmo modelo, a mesma linha, a mesma gramatura (o cara da papelaria usou esse termo e eu achei tão chique que tive que replicar) e ela há de viver para vingar o sumiço e o desmantelamento sem explicação de suas antepassadas.

Vida longa à nova lapiseira.


Que todos fiquem cientes de que estou trabalhando a 01 dia com a lapiseira, sem acidentes ou sumiços.

(Vou fazer um cartão assim e colocar na minha escrivaninha) 

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Se eu fosse menos louca

Ler Fangirl  foi como sentir um abraço apertado com quase 450 páginas de duração.

Já escrevi aqui sobre minha frustração diante das mocinhas desastradas e estranhas dos filmes adolescentes e das comédias românticas. Não acho que esses gêneros devam mostrar sempre retratos fiéis da realidade e até entendo a ligeira boa vontade da galera ao escolher essas personagens como heroínas. Elas mostram que se até mesmo a garota cuja calcinha vira um troféu a ser exibido e adorado entre garotos mais novos de aparelho fixo nos dentes consegue ter um Jake Ryan encostado num carro vermelho a sua espera, é porque a gente também consegue. Mas, enquanto representante da classe das Desastradas, Estranhas ou simplesmente Ignorantes na Arte de Lidar, sinto falta de uma representação menos plana ou pelo menos um olhar mais honesto e menos cômico sobre a vida de quem simplesmente não se encaixa.

Em 98% dos dias, se sentir desajustada não apenas não é engraçado ou adorável, como é ruim o bastante a ponto de vez ou outra eu realmente me questionar se não sou, de fato, um pouco (muito, talvez), louca.

Li The Bell Jar e foi com um medo genuíno que me senti muito próxima de Esther Greenwood. A gente acha que é tudo uma excentricidade engraçadinha que rende histórias curiosas para contar pros outros e mostrar no blog, até que se enxerga demais nas crônicas de depressão e loucura da Sylvia Plath. Mas, mesmo que eu entenda totalmente o que ela quis dizer e até um pouco do que ela sentiu, houve ainda um distanciamento, a redoma de vidro (ufa!) sempre me pareceu patológica demais para que eu a considerasse um habitat natural. Então eu cheguei na página 184 de Fangirl e li isso:

"Seriously. Look at you. You've got your shit together, you're not scared of anything. I'm scared of everything. And I'm crazy. Like maybe you think I'm a little crazy, but I only let people see the tip of my crazy iceberg. Underneath this veneer of slightly crazy and socially inept, I'm a complete disaster"

É isso que Cath, nossa protagonista, desabafa para sua colega de quarto bem resolvida quando confessa que passou o primeiro mês de faculdade comendo barras de proteína e pasta de amendoim porque não sabia onde era seu refeitório e, mesmo se soubesse, não saberia como se comportar chegando lá e por isso nunca foi atrás. 

Eu chorei muito lendo esse livro, e olha que ele não chega a ser do tipo dramático. Chorei porque fazia muito tempo que eu não me identificava tão visceralmente com algum personagem ou talvez porque nunca li um livro que tratou desses desconfortos sociais, ansiedades e draminhas existenciais, que tanta gente enxerga como uma besteira ou coisa engraçadinha, com tanta delicadeza e honestidade. Dá pra ver que a Rainbow Rowell sabe exatamente o que é não saber onde se sentar na hora do intervalo ou como entrosar em uma rodinha durante uma festa, e sabe, principalmente, como isso esmaga a gente por dentro. Ela sabe também o que é sentir um pouco de medo das pessoas, até das boas (principalmente das boas) e se sabotar por pânico ou por não saber o que fazer. Tenho certeza que ela, assim como a Cath e assim como eu, já deve ter olhado ao seu redor e tido certeza que os outros receberam um manual de instruções para a vida e só ela perdeu o seu no meio do caminho. 


O livro conta a história do primeiro ano de faculdade da Cath e é tão coming of age como a premissa já entrega. As coisas que ela precisa enfrentar parecem pequenas perto das aventuras mirabolantes ou dos traumas insuperáveis vistos em outros livros, mas é injusto subestimar a cruz que ela carrega. Wren, sua irmã gêmea, quer usar a faculdade como oportunidade para viver uma vida mais louca e independente. Sozinha e a mercê de emergency Kanye parties (somos parecidas até nisso, mas nos meus casos de emergência é a Beyoncé que entra em ação), Cath precisa parar de se preocupar tanto com os outros e aprender a viver um pouco, por mais que ela não saiba como isso funcione. "I don't know how to be", é o que ela diz pro pai, como se qualquer experiência para além da zona de conforto de sua casa, do dormitório ou da internet, onde ela escreve quase cinco mil palavras todos os dias em suas fanfictions, fosse um desafio, um obstáculo, uma aventura que parece aterrorizante demais vista da segurança de dentro. E, uma vez que está estudando para ser escritora, Cath precisa dar uma folga para o universo do bruxo Simon Snow para se livrar de um bloqueio e escrever, pela primeira vez, uma história que seja sua. 

E para isso ela precisa encarar o que está dentro dela, e todos sabemos como isso pode ser aterrorizante.

Engraçado que eu sempre gostei muito de ler dramas e histórias sobre pessoas loucas, atormentadas e cheias de problemas. Sempre fui chegada em uma crise existencial e em jornadas rumo ao centro do âmago dos personagens, mas faz pouco tempo que me inclinei para histórias que, além de trazer as loucuras e pertubações obscuras da alma humana, fossem também sobre mim. É incrível, bizarro e assustador ler coisas que são sobre nós, porque elas nos fazem pensar demais, e mexem com muitas coisas aqui dentro e fazem escorrer o verniz de gente bem resolvida aplicado com muito custo e esmero durante anos. Porque eu realmente acho que hoje eu sou bem menos assustada e vulnerável que a Cath, mas bastou chegar na parte em que ela fala sobre o medo de se envolver com alguém e dos motivos pelos quais ela devia deixar a faculdade, para que eu desse uma choradinha. E até hoje eu só como no bandejão se encontro alguém na fila porque Deus me livre de chegar lá dentro sozinha e não saber onde ou com quem sentar.

O mais legal é que o livro termina sem que Cath deixe de ser quem ela é. Não rola um makeover e nem um boost repentino de confiança vitalícia. Ela só quebra a casca do casulo onde se escondia e começa a desabrochar, a existir com um pouco mais de segurança sobre as próprias pernas e palavras, e um pouco mais preparada para ser protagonista de sua história. E eu acho que esse é o maior milagre que a gente pode pedir da vida, muito mais útil a longo prazo que um cabelo bom e convite para o baile vindo do cara mais gato da escola. Não tem um Jake Ryan encostado no carro vermelho esperando por ela, e nem um Blake com amor verdadeiro amor eterno para ela beijar no estacionamento da escola. Mas tem um mocinho muito, muito lindo, que é lindo até no nome e adora ouvir todas as histórias que ela tem pra contar. 

Porque a gente é doida, mas não o suficiente para dispensar um farmboy com cabelo que cheira a café. 

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Strange magic #1: janeirinho da zica

Testando mais um formato de post que vai funcionar dessa vez porque é o melhor que eu consigo pensar no momento, mas que provavelmente será abandonado porque depois de seis anos vocês já conhecem meus esquemas pouco ortodoxos. Se veio pra ficar ou está fadado à sina de one hit wonder junto com Semisonic eu não sei, mas adoro ler resumos mensais em blogs amigos e tenho essa atração voyeurística por diarinhos alheios que não é privilégio meu, mas da raça humana como um todo - e é por isso que eu acho que vocês vão gostar também, sem me achar (muito) idiota. A inspiração direta vem dos resumões da Dani, da sessão Instagram da Cacá e do Imagens da Semana da Fê.


Primeira foto de 2014, chamando a riqueza, o luxo, o requinte e a sofisticação para o ano novo. Sabe, eu realmente gosto de champagne, logo eu, que não gosto de quase nada alcoólico. Na festa de ano novo, mais um jantar dos Rocha como outro qualquer só que com roupas melhores (e champagne), desfilei casualmente com minha tacinha em mãos me sentindo numa festa de Mr. Jay Gatsby. Com a falta de talento para a boemia que me é intrínseca, o máximo de glamour que consegui sustentar durou até a hora em que me entreguei ao borbulhante sono dos justos, antes mesmo de as crianças entregarem os pontos.



Janeiro abriu e fechou com festas de aniversário de amigos amados. Na primeira semana foi a festa surpresa da Anaisa, que ela graciosamente estragou quando entrou na sala escura já dizendo que sabia que nós estávamos amontoados segurando a risada ali em algum canto. Uma pistola que soltava estrelinhas douradas fez a alegria da noite e eu passei mais tempo do que gostaria de admitir rolando no chão catando estrelinha, só pra depois jogá-las pra cima (depois de desistir de colar um monte em mim mesma). Pelo menos as fotos ficaram divertidas. Na última semana Rodolfinho, aquele do beijo das sombras, completou 24 verões muito, muito quentes, e saímos para celebrar em plena segunda como se a vida estivesse ganha. Claramente não estava, talvez por isso o bar enorme que nós fomos tinha só a nossa mesa cheia e uns outros dois gatos pingados. O que foi ótimo, porque enchemos a bandinha de pedidos de música e num dado momento rolou um Leandro e Leonardo de mãos dadas. O garçom ficou bem feliz - depois que a gente foi embora.



Tá rolando solta por aí uma teoria de que janeiro veio com um prolongamento de mau gosto de 2013, um arrotinho deselegante da bagunça que foi ano passado. Isso faz todo sentido do mundo pra mim, que tive uma semaninha de folga apenas e logo no dia 06 cheguei na faculdade defendendo projeto editorial de jornal. No quarto semestre assumimos o controle do jornal-laboratório do curso, o glorioso Senso Incomum, com a missão de reformulá-lo para o ano que virá. Cada grupo bola uma proposta, inventando um jornal do zero - editorial e graficamente - e depois os professores votam no melhor. Meu grupo levou a melhor e nosso projeto venceu, o que foi incrível, mas também deu muita dor de cabeça. Tivemos um delírio minimalista e nosso jornal tem bem menos espaço pra texto - a vingança veio logo, quando minha reportagem de mais de 8000 toques teve que ser reduzida a 3000. Ossos do ofício.

Aliás, essa reportagem consumiu minhas forças, energias e pensamentos esse mês. Resolvi escrever sobre o teatro na cidade, que é uma coisa que me interessa bastante. Foi ótimo, porque é uma delícia trabalhar com o que a gente gosta, mas também horrível, porque eu queria fazer a coisa da forma mais completa e redonda possível e, apesar de ter ficado feliz com o resultado final, me segurei pra não ir chorar no banheiro depois que vi meu texto ser cortado quase que inteiro. Vida que segue.

Esse mês comprei ~materiais escolares~ depois de dois longos anos. No fim do ano passado consegui perder o caderno que usava na faculdade & meu estojo. Como isso aconteceu eu jamais entenderei. Fui levando com a barriga até o recesso, sobrevivendo de canetas e bloquinhos desses que a gente ganha em congresso (os melhores), mas resolvi tomar vergonha e me portar como a garota responsável de quase vinte anos que sou. Meus avós sempre me dão uma graninha de Natal e disse que era pra eu gastar sem pudores com algo que eu quisesse muito ou estivesse precisando, o que me levou a um rolezinho consumista desenfreado que terminou com agenda nova, que vocês já conhecem, esse caderninho belo com estampa de pied-de-poule (depois fui descobrir que é um caderninho de modas, que vem com vários moldes prontos pra croquis) e canetinhas da Stabilo que sempre foram sonho de consumo de uma infância atrasada. Na mesma tacada, achei esse box com as três primeiras temporadas de Modern Family em promoção e não hesitei. Foi uma tarde do tipo que apenas Tom e Donna aprovariam.


Li quatro livrinhos em janeiro - e o quinto devo acabar hoje - o que é bastante para minha média. Iniciei o ano com o penúltimo volume de Vampire Academy, o Spirit Bound, e resolvi dar um sossega na obsessão. Nem posso escrever muito sobre porque senão periga largar tudo pra saber o destino final de Rosinha. Li o divertido Como Ter Uma Vida Normal Sendo Louca, da Jana Rosa com a Camila Fremder, cumprindo a cota de leitura nacional do mês. Depois veio a graphic novel (minha primeira!) Laços, da Turma da Mônica, que é a coisa mais fofa e querida que li em muito tempo. Reli junto com algumas amigas da Máfia o sensacional A Menina Que Roubava Livros. Eis que sete anos depois me reencontro com Liesel, Hans, Max, Rudy e Dona Morte e agora não vejo a hora de ver o filme - mesmo sabendo que devo me decepcionar. Quase no fim do mês recebi uma compra do Book Depository que fiz em dezembro, com dois livros da Rainbow Rowell. Estou quase terminando Fangirl, naquela vibe de ficar postergando eternamente o fim porque muito amor e identificação pra poucas páginas. Escrevei sobre, definitivamente.

Falei a respeito da maioria dos filmes que assisti nesses últimos dias - menos do que gostaria, mas não tenho cabeça para mais nada, Breaking Bad me consome muito. O melhor de todos, no entanto, ficou propositalmente de fora do post, porque aquelas poucas linhas mal traçadas jamais serão suficientes para o tanto que eu achei que O Lobo de Wall Street matou a pau. Já é meu favorito pro Oscar e pra qualquer outra coisa, mesmo que eu tenha visto só dois da lista. Tio Marty, Leozinho e o nojento e fascinante Jordan Belfort já me ganharam. Escrevi sobre a trilha bacanuda (jazz, blues e Lemonheads!) lá no Move That Jukebox

Outro texto de fora bem bacana e polêmico foi a lista que organizei junto com as queridas da 21 sobre alguns casais alternativos da ficção. Estou pensando em fazer uma seleção mais pessoal e postar aqui no blog qualquer dia desses.

I don't know why we listen to poets when nobody gives a fuck 

E por último, a trilha sonora do mês: Wilco continua imbatível, mas dei férias para o Summerteeth e voltei às minhas raízes com a banda me deliciando com tudo de lindo e incrivelmente triste que só o Yankee Hotel Foxtrot é capaz de oferecer. A música que não saiu do repeat foi "Ashes of american flags". Como nem só de lamentos de Jeff Tweedy se faz um mês, resolvi explorar o cd novo da deusa Beyoncé e só descobri coisas maravilhosas (com exceção do easter egg de péssimo gosto que foi dissecado por esses dias na internet e me fez ficar bem chateada com Queen B). Esse álbum fica mais incrível a cada nova ouvida e todo dia tenho uma música favorita nova. Eu poderia dizer que "Drunk in love" é imbatível, mas devido aos acontecimentos recentes, "Partition", meu coração é seu.


E com isso me retiro. Até o próximo mês - ou nunca mais.