quinta-feira, 28 de junho de 2012

Como produzir um programa de tv quando não se tem a menor ideia de como fazer isso


Meu primeiro fim de semestre acadêmico pode ser descrito como intenso e inesquecível. Nessas duas últimas semanas, vivi uma montanha russa de emoções fortes, oscilando entre níveis épicos de desespero e uma euforia tão enorme e sincera que Renato Russo diria que parece cocaína, mas é só um trabalho dando ora muito certo, ora muito errado. Esses picos discrepantes de emoção se devem também ao fato de que tudo que fiz nessas semanas não poderia se encaixar num meio termo: ou foi terrível ou foi fantástico.

Na manhã de terça eu falava com meu pai no celular enquanto corria, literalmente, no campus da universidade para chegar a tempo pra uma entrevista. Quando ele me perguntou a razão de toda aquela ofegância, contei do meu atraso e de seus motivos: havia ficado até o último minuto revisando um trabalho que quase foi para as mãos da professora todo errado e sem edição, justo o trabalho que havia me atormentado por quase um mês e assombrado meus sonhos desde que comecei a fazê-lo. Juntou esse estresse, a perspectiva do atraso, a total ignorância do que conseguiria fazer naquele dia e o cansaço acumulado e eu quis sentar ali no meio da rua, chorar e pedir encarecidamente que me tirassem dali. Mais tarde, naquele mesmo dia, eu estava aos pulos e gritos num laboratório da escola, abraçando as pessoas e a ponto de rolar no chão de alegria. Estabilidade emocional, não trabalhamos.

Acontece que, em meio a todos os trabalhos cansativos e complicados, tive que produzir um programa de TV. Tenho uma disciplina chamada Educação e Comunicação que estuda a junção das duas áreas, e o trabalho final consistia em apresentarmos um meio alternativo que pudesse ser incorporado pela prática educativa, e meu grupo ficou com a televisão. O professor, criativo e sem noção, disse que queria um programa de TV todo metalinguístico sobre programas de TV. Aquele pequeno detalhe de que estamos no primeiro período e o telejornalismo aparece só no quinto ele não se lembrou. A expectativa da greve  que nunca veio também fez com que não nos lembrássemos de que tudo que envolve filmagem e edição dá uma mão de obra louca, e nos vimos com um enorme trabalho e um prazo apertado.


No total, fizemos tudo em quatro dias, sendo um fim de semana para estruturar o roteiro e estudar o embasamento teórico, segunda e terça filmando e editando. Até agora não consigo acreditar que conseguimos, tendo em vista de que na terça de manhã cheguei na faculdade sem saber o que aquilo ia virar e saí com o programa pronto no meu pen-drive. Foi um milagre, literalmente. Na madrugada de segunda tudo estava dando absurdamente errado e eu e meu grupo pirávamos e nos descabelávamos em busca de soluções, até que me joguei no chão do quarto, de cansaço e desespero, e pedi misericórdia. Gente, quem nunca experimentou isso não sabe o que é a sensação de corda no pescoço. E sim, a partir do meu clamor alucinado as coisas começaram a fluir. A sincronia dos áudios e dos vídeos ficou quase perfeita. O que antes era um monte de vídeos e ideias se tornou o Repórter UFU.


Sobre essa experiência, o que tenho a declarar é que mexer com audiovisual cansa muito. Eu, que nem apareço no vídeo nem nada, cheguei em casa todos os dias com uma sensação de que havia sido espancada. Foi muito sobe e desce nas ruas e na universidade carregando equipamento, papelada, blusa de frio, notebook, etc. Foram muitos takes até que se conseguisse um "boa tarde" decente. Foram muitos planos A dando errado e também muitos planos B surgindo do nada e se provando melhores que a proposta original. O mais legal é que fazia tempo que não fazia um trabalho de grupo que realmente tivesse cara de grupo. Costumo odiar e sofrer horrores com essas organizações, e sempre acabo com a sensação de que só eu e poucas pessoas se importam realmente com aquilo, mas dessa vez senti que estávamos todos segurando a barra uns dos outros, cada um fazendo sua parte para sair um resultado legal e também para que o processo de produção não fosse um martírio, e sim uma grande e ambiciosa brincadeira. A gente não teria dado conta também sem a ajuda da Chris Pitanga e do Fabiano Goulart, ela nossa professora e ele jornalista da Tv Universitária, ambos sem obrigação alguma de nos ajudar, mas que gastaram tempo e paciência com calourinhos que não sabiam operar a câmera e posicionar os braços diante dela.


Aos olhos de quem conhece técnicas e tem experiência na área, nosso programa tem cara de amador mesmo, mas não consigo não me orgulhar dele. Acho que foi uma conquista bacana, tanto por termos feito quase num piscar de olhos - o maior e mais tumultuado da minha vida, mas ainda um piscar de olhos -, sem saber absolutamente nada e com recursos limitados. Já assisti o produto final tantas vezes que até decorei as falas, e estou sentindo um orgulho enorme da gente.





Não, eu não apareço justamente por causa daquele atraso supracitado, mas quero ver quem encontra minha voz de pônei em meio às narrações em off. =)

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Voltei a amar o Tim Burton


Analisando minha história com o cinema, poderia dizer que o Tim Burton foi o primeiro diretor que gostei de verdade, o primeiro que me fez pensar naquela pessoa por trás da câmera e não apenas naquelas que viviam a história junto comigo. Cresci amando seus filmes e em algum ponto da minha pré-adolescência cheguei à conclusão de que gostava do trabalho daquele cara e desde então venho acompanhando sua carreira. 

Acontece que o Tim Burton parou de me empolgar. Eu ficava ansiosa para os novos filmes dele e quando finalmente assistia, saía do cinema com aquela sensação terrível de que esperava muito mais. Sabe aquele pesar que vem do fundo da alma quando você sabe que aquela pessoa tinha potencial para fazer algo muito ótimo mas acabou entregando um filme bem meia-boca? Lembro perfeitamente que foi esse o sentimento que me acometeu na saída da sessão de A Fantástica Fábrica de Chocolate. Contribui para o desapontamento o fato do VHS com a primeira versão ter morado no vídeo-cassete de casa durante toda minha infância, mas não entendia como o Tim Burton, logo ele, poderia ter feito tão pouco de uma história tão legal. Depois veio Sweeney Todd, que de início me decepcionou fortemente mas depois de um tempo, talvez por eu ter passado a levá-lo menos a sério, consegui gostar. 

A grande facada no peito, contudo, veio com sua adaptação de Alice no País das Maravilhas. Saí do cinema totalmente desolada. Eu esperava que algo fantástico sairia de uma adaptação de um dos meus contos de fada favoritos feita pelo meu diretor de fantasia favorito, e o resultado não poderia ter sido pior. Achei caricato, forçado e não encontrei ali nem o Tim Burton e nem a Alice. O balde de água fria foi tão grande que passei a me questionar se algum dia ele conseguiria me entregar novamente filmes como Edward Mãos de Tesoura, Ed Wood e Peixe Grande, com os quais ele galgou bravamente um espaço no meu coração.

E eis que surge uma luz no fim do túnel, o que é uma introdução bem paradoxal quando se fala em Sombras da Noite, a começar pelo título. Se eu estava ansiosa devido às críticas positivas que li quando o filme estreou na gringa? Sim, mas não coloquei nele minhas expectativas e esperanças mais profundas, uma vez que o tombo que levei com Alice havia me deixado com algumas marcas que ainda doíam. Entrei no cinema querendo apenas não sair deprimida e desesperançosa e saí carregando Tim Burton no colo.



Tenho uma teoria: quando os trabalhos do diretor se popularizaram e ele conseguiu firmar sua identidade como criador de personagens sombrios pero encantadores, todo mundo começou a esperar demais dele, assim como ele mesmo. O processo criativo deixou de ser natural porque as pessoas não esperavam mais um filme, e sim um filme do Tim Burton. Por causa disso, por exemplo, Alice virou a Alice do Tim Burton, e por isso o resultado foi aquele: uma produção qualquer nota da Disney com a estética do Tim Burton. Faltava ali, no entanto, a essência, a originalidade, a coragem. Em resumo, Tim Burton perdeu temporariamente os colhões.  Enfim, divago - Tim Burton, querido, caso queira dar seu depoimento com exclusividade e deitar no divã So Contagious, favor entrar em contato.

O importante é que ele se reencontra em Sombras da Noite. Não se limitando a valer-se apenas de sua estética bacaninha pra contar a história de um vampiro que fora enterrado no século XVIII e volta à superfície nos anos 70 para recuperar o tempo perdido e salvar sua família, Tim Burton para de se levar tão a sério e faz aquilo que eu mais gosto. O filme é sombrio com toques de humor espertos e sinceros. Os personagens são encantadores e erradíssimos. Johnny Depp parou de forçar a barra e está ao mesmo tempo charmoso, excêntrico e engraçadíssimo. O roteiro sai totalmente de casinha e ousa em cenas que beiram ao trash, mas de um jeito lindo e muito divertido. Tim Burton on crack alfinetando Crepúsculo e homenageando A Morte Lhe Cai Bem junto com uma trilha sonora sensacional e participação especial do Alice Cooper.

Ou seja:

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Que hoje eu comprei uma calça vermelha


Esse hoje do título é só pra brincar com a música da Mallu que todo mundo já usou de gancho pra contar que um belo dia usou batom vermelho - este vocês já sabem que uso há tempos, mas a calça vermelha entrou no meu armário só no início do ano. A verdade é que eu sempre gostei de calças coloridas, coisa de paixão antiga, mas ainda não tinha encontrado nenhuma que me agradasse. 

Isso, claro, até o surgimento do famigerado happy-rock com sua corja de seguidores que adotaram a indumentária colorida como uniforme de guerra. Maldito seja o dia que o PeLanza ou seja lá qual foi o infeliz que decidiu que a melhor maneira de imprimir sua marca seria por meio de calças multicoloridas. Fiquei a ver navios, ou melhor, fiquei a ver pseudo-roqueiros magricelas e suas groupies chorosas maculando as calças que eu adorava. Gostaria muito de ter a elevação espiritual que me levasse a não ligar para esse tipo de modismo idiota e conseguir usar o que bem entendesse, ignorando os dedos acusadores que se prontificariam a me apontar a tribo da família Restart, mas não. Passei toda minha pré-adolescência assombrada por terceiros que me acusavam de ser emo só por causa da forma que eu me vestia - e olha que não cheguei nem perto de constranger meus pais - e não queria ter que carregar essa cruz de novo. 

Depois foi a vez da calça colorida, mais especificamente a vermelha, a virar hit da estação. De símbolo de uma pseudo-rebeldia juvenil a ícone fashion efêmero, a calça vermelha passou a figurar em tudo quanto era foto de it pessoas em it blogs com seus it looks. A overdose de informação em forma de pernas rubras foi tanta que, novamente, me senti acuada até mesmo diante do pensamento de encontrar uma pra chamar de minha. Aquela velha de história que de tanto ver tantas pessoas usando a gente acaba se cansando por tabela. Sou dessas.

Contudo, eis que numa manhã de sexta estou passeando no shopping com o cartão da minha mãe na carteira e  a autorização para utilizá-lo. Quer dizer, eu tinha permissão para usá-lo na compra de trajes civis adequados à minha nova vida de universitária que não mais exigia o uso de uniformes. Resumindo: saí para comprar jeans e camisetas básicas para usar na faculdade. Quem conhece a minha pessoa, certamente rir-se-á de tão simples proposta, afinal, saberá bem que não tenho motivação para sair em busca de coisas básicas. Eu juro que tentei ver alguma graça nas araras de jeans normais, e até olhei todas as camisetas possíveis que fossem versáteis e tivessem cara de dia-a-dia como minha mãe explicara, mas meus olhos brilharam mesmo foi diante da Calça Vermelha. Mentira, enxerguei primeiro uma igualmente magnífica calça cor-de-rosa e, no caminho até ela, deparei-me com a Vermelha. Não encontrei nenhuma das duas no meu tamanho exato, uma era um pouco menor e a outra maior. Decidi que ficaria com a que melhor me vestisse (sou dessas) e fui tirar a prova: deu a vermelha. Era o destino.

E por que logo hoje eu resolvi vir aqui contar essa história pra vocês? Ora, ontem o Xico Sá, logo ele, lançou-se em uma campanha a favor das calças vermelhas no guarda-roupas feminino. Ele certamente pouco se importa com street fashion e looks do dia, e duvido muito que ele, logo ele, veria alguma graça naquelas mulheres, mas a verdade é que deu-se no post um improvável encontro de preferências. E eu, como fã dele e da calça vermelha, não poderia deixar de me manifestar também, informando-vos que é com orgulho que faço parte dessa legião de adeptas da peça que, segundo o macho-jurubeba, pode até mais que uma bunda. Esta última reflexão deixo a cargo do leitor XY que porventura não desistiu desse texto até agora, e para as moças desencorajadas, uma primorosa foto motivacional:


"E porque quando você começou a gostar de mim procurava saber por todos os modos com que camisa esporte eu ia sair para fazer mimetismo de amor, se vestindo parecido."
Vinícius de Moraes, Para Uma Menina Com Uma Flor (ou: #estratégias)

domingo, 17 de junho de 2012

Ai que prazer, não cumprir um dever! (risos)

Sexta-feira à tarde, numa aula de Mídias e Comunicação que seria seguida de uma reunião de trabalho que preencheria meu fim de semana de obrigações acadêmicas, ao ler um artigo selecionado pela professora, me deparo com uma citação de Fernando Pessoa: "Ai que prazer/Não cumprir um dever/Ter um livro pra ler/E não o fazer!". Aquela estrofe inicial ficou na minha cabeça durante o resto do dia, e foi nela que eu pensei quando, já à noite, voltava pra casa cansada com a perspectiva de ir dormir quase na hora do sol chegar para dar conta de tudo. 

Só que eu cheguei em casa, tomei um banho quentinho e resolvi aproveitar a saída de mamãe para comer pizza enquanto assistia Meninas Malvadas. Quem disse que tive coragem para encarar meus trabalhos finais depois dessa obra prima do cinema norte-americano? Pois é. A noite foi longa mesmo, porém preenchida por episódios de Modern Family e Skins e não com os 22 textos que eu precisava reler para a prova de Leitura e Produção de Texto na próxima terça. Deixei pro sábado.

Depois de acordar (tarde), gastei o resto da manhã me preparando psicologicamente para começar a fazer tudo que eu tinha que fazer, me mantendo consciente de que apenas jogando meu sábado feliz pela janela eu poderia usufruir de um domingo de paz. Só que achei que seria uma boa sair pra almoçar. Sabe como é, saco vazio não para em pé e quem sou eu dizer não ante a perspectiva do risoto e do suco de amora de um dos meus restaurantes favoritos? Comi feito um visigodo e voltei para casa no meio da tarde sem conseguir conversar de tão cheia de comida. Me lembrando dos trabalhos e sentindo que antes de um cochilo providencial seria impossível produzir qualquer coisa, joguei os versos de Pessoa no Google e me deparei com o poema Liberdade, que ecoou na minha cabeça durante toda a tarde.

Ai que prazer 
Não cumprir um dever. 
Ter um livro para ler
 E não o fazer!
 Ler é maçada, 
Estudar é nada.
 O sol doira sem literatura.
 O rio corre bem ou mal,
 Sem edição original.
 E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
 Como tem tempo, não tem pressa…


E durante todo o sábado, aquele sábado em que eu tanto tinha pra fazer e que tão pouco efetivamente fiz, fiquei sentindo aquela culpa monstruosa acompanhada pela sensação de tempo jogado pela janela. Quem é procrastinador a valer não se satisfaz em simplesmente postergar um dever: tem que deixar as obrigações de lado e ainda não compensar o pequeno delito com algo satisfatório. Eu poderia ter visto um filme, lido um pouco, dormido, sei lá, mas só o que fiz foi atualizar o Twitter e o Facebook, andar pela casa, abrir o Word, ler alguns textos sem fazer ideia alguma do que estava escrito neles e perceber que a meia-noite chegara e eu tinha apenas umas duas páginas escritas para mostrar de serviço.

Rolando na cama consumida em angústias profundas, pensava no Fernando Pessoa, logo ele, sendo quem foi, afirmando que liberdade era ter a consciência de que o sol não deixava de brilhar se não houvesse mais literatura e sentindo prazer inigualável em não ler os livros que tinha de ler. Mesmo assentadas na vagabundagem, que tão pouco tem a ver com os tempos atuais obcecados pela produtividade, senti inveja das convicções do Fernandinho. Aliás, talvez justamente por não ter nada com a nossa pós-Modernidade digital que eu as tenha admirado tanto, uma vez que desprezo essa cultura de resultados em metas cumpridas, embora cada pedaço minúsculo de mim esteja inserido nela. Caí no sono sabendo que viria neste espaço o quanto antes discordar desse prazer por deveres não cumpridos enquanto reconheceria que era exatamente por esse desprendimento, abundante nele e deficiente em mim, que Fernando Pessoa é cânone da literatura e a única coisa que eu tenho é esse blog.

Domingo à noite, mais precisamente há uns 15 minutos, joguei o poema no Google novamente para poder falar dele com uma propriedade forjada. E não é que descobri que Pessoito é interpretado de forma errada pela maioria das pessoas que leem Liberdade e que eu mesma caíra na pegadinha? Ao menos de acordo com alguns sites que visitei, no manuscrito do poema encontra-se uma nota de Pessoa avisando que antes de seus versos viria uma citação de Sêneca. Este, por sua vez, estóico com convicção salve-salve, valorizava o cumprimento dos deveres acima de tudo e enxergava essa via como caminho único rumo à liberdade. Logo, Fernandão ironizava ao colocar seu eu-lírico para louvar as alegrias de uma vida abnegada das obrigações mundanas. Há quem diga, além disso, que o grande Fernando Pessoa alfinetava com seus versos Alberto Caeiro, seu heterônimo sonhador. 

Mas, sendo Caeiro parte de Pessoa, pode-se dizer, então, que ele discordava e ironizava a si próprio. Uma das análises que li colocou Liberdade como um poema no qual Fernando Pessoa, já próximo da morte, revê suas convicções passadas e reconhece que não é possível desprender-se dos deveres e viver livre e saltitante por campos floridos, que, opa, não habemus liberdade por esses caminhos. É um pouco triste constatar isso, na verdade. Me vejo aqui - eu, a blogueira - presa tão cedo aos deveres, livros não lidos e imaginando cataclimas monstruosos como consequência de minha irresponsabilidade e procrastinação, na esperança de que um dia isso passe, até que me deparo com Fernando Pessoa - o cânone - concluindo que isso é papo furado e é melhor procurar outro caminho. Ótimo pensamento pra encerrar o fim de semana, hein?

O propósito do post, obviamente, já se perdeu. A Analu só queria que eu discordasse de um poema e cá estou eu conjecturando acerca da liberdade. Mas se o próprio Fernando Pessoa - novamente, o cânone - desceu de pedestal para discordar de si próprio, quem sou eu para apontar o dedo na cara de alguém nesse momento?

quinta-feira, 14 de junho de 2012

E aquela cena, quando toca aquela música?

Mayrinha, essa pessoa linda e incrível que um dia eu farei a Nazaré e a roubarei da Analu, propôs um meme muito ótimo que deixa enlouquecida qualquer pessoa que ame filmes, música e filmes com música que não são musicais. Essa categoria pescada pela Mayroca engloba aqueles filmes, ou momentos de alguns filmes, que a trilha sonora vira um personagem tão ou até mais importante que a própria cena. Listar os meus favoritos é a missão da vez, bastante difícil eu diria, pois sou maluca por trilhas sonoras e poderia passar dias inteiros listando momentos incríveis.




"Bang Bang", de Dalida, em Os Amores Imaginários: O filme de Xavier Dolan conta a história do inusitado triângulo amoroso formado por dois amigos - uma mulher e um gay - que disputam, de forma velada, o coração de um lindo de sorriso fantástico e maravilhosos cabelos cacheados. A trilha sonora é toda ótima, mas gosto especialmente quando a música Bang Bang, que toca em várias partes, compõe a cena que mostra os dois amigos se aprontando para encontrar Nico. A canção faz com que a arrumação dos dois ganhe um toque de guerra: como dois soldados se preparando para batalha eles se trabalham no garbo e na elegância, na esperança de fisgar o coração do enigmático Nicolas. A câmera lenta utilizada na sequência casa perfeitamente com a cadência da música, fazendo com que os movimentos, acompanhados do ritmo, fiquem com cara de um ballet moderno. Apaixonante.




"Tiny Dancer", do Elton John, em Quase Famosos: Em um filme que, dentre outros temas, fala sobre músicos e música, uma trilha sonora sensacional é esperada, ainda mais se o diretor for o Cameron Crowe. Com Quase Famosos não é diferente, e sou especialmente apaixonada pela cena em que, no ônibus que carrega o StillWater e sua caravana de fãs e groupies, começa a tocar Tiny Dancer no rádio e todos começam a cantar juntos. Aliás, a cena é tão marcante que o Dave Grohl, numa apresentação de anos atrás, faz cover de Tiny Dancer e diz que seu sonho é recriar aquela cena.




"I'll Be There For You", do Bon Jovi, em De Repente É Amor: Imagine só se um belo dia, aquele seu caso de idas e vindas que dura anos, que adorava fazer graça com a cara do seu ex-namorado músico o chamando de Bon Jovi, aparece na sua humilde residência tocando mal, porca, pero fofamente uma guitarra vermelha enquanto canta nada mais nada menos que I'll Be There For You. Preciso dizer mais alguma coisa? Ah, sim: o cara é o Ashton Kutcher. De camiseta branca e cara de cachorro sem dono.




"You Make My Dreams", de Hall & Oates, em 500 Dias Com Ela: Depois dessa cena, ficar feliz na vida real é um pouco sem graça, afinal, qual o sentido da felicidade se, ao sair na rua, os transeuntes não vão perder dois minutos do seu dia para celebrar a vida com você ao cantar e dançar como se todas as manhãs fossem a manhã seguinte da noite mais esperada da sua vida?



"The Blower's Daughter", do Damien Rice, em Closer: É a abertura mais sensacional da história. Desde o nome do filme rolando em vermelho, com letras garrafais, aos lindos Natalie Portman e Jude Law quase flutuando na direção um do outro em meio à multidão na calçada lotada de Londres. Sem a música já seria lindo demais, mas o Damien Rice entra na história pra compor o quadro perfeitamente, dando à singela caminhada uma atmosfera de sonho maravilhosa. 




A conversa no telefone em As Virgens Suicidas: Depois que a danadinha da Lux infringiu o toque de recolher imposto pelos seus pais, as irmãs Lisbon se viram trancafiadas dentro de casa. Os moleques do bairro, seus admiradores nem tão secretos, encontraram uma forma de mostrar a elas que, de uma estranha forma, eles estavam ali: ligaram na casa das meninas e colocaram uma música para tocar ao invés de dizer alguma coisa. Elas, em seguida, fizeram o mesmo, e foi dessa forma que a conversa se desenvolveu. Apenas um amor.




"What Ever Happened?", do Strokes, em Maria Antonieta: Eu poderia citar um grande momento musical em cada filme da Sofia Coppola e, em se tratando de Maria Antonieta, poderia citar até dez momentos musicais incríveis. Escolhi esse em particular nem só porque tem Strokes envolvido, mas sim porque não vejo música que se encaixaria melhor na corrida desesperada da rainha que culmina com ela se jogando sem esperanças na cama, do que uma canção cujos versos iniciais são: I wanna be forgotten and I don't wanna be reminded. I say please, don't make this harder.




"Try A Little Tenderness", de Otis Redding, em Pretty In Pink: Duckie, interpretado pelo cara que faz o Alan em Two And a Half Man, é perdidamente apaixonado pela sua melhor amiga Andie - aquela que é meu ícone de estilo, coolness, garbo e elegância. Só que ela não está nem aí pra ele e só tem olhos para o cara mais popular da escola. Como garota bacana dos anos 80 que é, Andie trabalha numa loja de discos, e um dia, como num desabafo desesperado de quem já está cansado de não ser levado a sério e ainda ser visto apenas como amigo, o adorável Duckie interpreta Try A Little Tenderness de um jeito surtado e divertidíssimo.




"The Way You Look Tonight" em O Casamento do Meu Melhor Amigo: No dia anterior ao casamento de Michael, ele e Jules tem sua despedida num barco de turismo por um rio que corta Chicago. Ali eles falam sobre os outros amores que tiveram e confessam que foram o amor da vida um do outro. Depois de constatar que não tem uma música com a mulher com quem vai se casar, Michael, com sua voz absurdamente sexy e charmosa, começa a cantarolar The Way You Look Tonight enquanto os dois dançam juntinhos em meio aos turistões. Suspiro e lágrimas teimosas no canto dos olhos.




"Girl", de Urge Overkill, em Pulp Fiction: Tarantino é outro com o dedo encantando para escolher trilha sonora. Essa, pra mim, é a mais marcante simplesmente porque desde que vi Pulp Fiction nunca mais consegui ouvir Girl sem fazer a dancinha da Mia Wallace, com direito a cantar junto fininho e bater cabelo loucamente no meio da sala, finalizando com aquela overdose de cocaína básica de toda sexta à noite.




"O'Children", de Nick Cave, em Harry Potter e as Relíquias da Morte, parte 1: Nunca poderia imaginar que minha cena favorita de todos os filmes da saga seria justamente uma que não aparece no livro. Essa dancinha desengonçada e tímida de Harry e Hermione funciona como uma tomada de fôlego cheia de doçura em meio ao clima tenso do filme e diz tanto sobre a relação deles, ao mesmo tempo que revela, sem nenhuma fala, o que ambos estavam sentindo, que nunca sei direito se choro de lindeza ou de tristeza.




"Jingle Bell Rock" em Meninas Malvadas: Me reservo o direito de não dizer nada e deixar o vídeo falar por si.

E para fazer o meme indicarei uma pessoa que, por não ter sido indicada no último meme que fiz, chegou a colocar em xeque, publicamente ainda por cima, a veracidade do meu amor. Renata, ai de você se não fizer essa lista e não se deixar atormentar pela angústia da escolha ao menos umas duas noites, viu? 

terça-feira, 12 de junho de 2012

Ai de mim que sou romântica! - parte 3

Parte 1 - Parte 2


Dia dos namorados e cá estou eu mais um ano sem ganhar presente. Não é uma reclamação, apenas uma constatação, porque hoje eu acordei bem-humorada. Gripada, mas feliz. Fazendo trabalho, morrendo de sono, mas ouvindo músicas bonitas e em paz comigo mesma. Aliás, acordei brega, achando o amor bonito. E, movida por esse espírito, parei para pensar sobre declarações de amor e demonstrações de afeto. 

Eu não sou o que se pode chamar de pessoa tradicional. Explico: acho essa coisa de dar flores para a mulher amada uma coisa meio besta. Se forem vermelhas então, jogo no triturador. Flor é uma coisa muito clichê, de gente sem criatividade. Se forem rosas, vermelhas ainda por cima, pensarei que além de óbvio o cara não se deu o trabalho de descobrir minhas flores preferidas (margaridas brancas, viu Querido Namorado Que Não Tenho?). Flor só funciona se for de surpresa, naquele dia sem nada especial ou diferente, que você passou na porta de uma floricultura e quis fazer um agrado ou então que viu um jardim e achou ali flores tão absurdamente bonitas que teve que roubar e dar pra menina que chega a mudar de calçada quando aparece uma flor. Em data especial, se for pra ser clichê, que me dê chocolates ou um solitário da Tiffany, tenha dó!

Quanto a pedidos de casamento, tenho um certo receio dessas coisas criativas que andam tão na moda por aí. Eu não queria que meu pedido de casamento virasse hit no Youtube. Acho deselegante. Aquele clichê de levar a menina pra jantar, pegar na mãozinha, ajoelhar no restaurante e tirar a caixinha com o anel do bolso é tão batida que chega a ser bonita. Mais legal ainda se os dois começarem a rir, porque é tão óbvio e evidente e cafona, ou então a chorar, a la Monica e Chandler, porque apesar de óbvio, ambos queriam tanto aquilo que não dá pra fugir do tradicional. Acho bonitinho também aquela coisa de colocar o anel num lugar inesperado, como na taça ou dentro de um doce, mas tenho certeza que engoliria o bendito por engano, e ai meu Deus que romântico, só que não, ser pedida em casamento logo depois de uma lavagem estomacal. Sobre flashmobs eu poderia até dizer que sempre achei cafonérrimo (por favor, né), mas chorei vendo aquele organizado pelo Fantástico. O que eu acho legal mesmo é quando é espontâneo. Os dois ali almoçando China In Box na frente da tv num domingo de chuva quando o bendito olha pra bonita e pergunta se ela aceita se casar com ele, e logo depois pede que lhe passe um guardanapo. Assim, de sopetão, ao melhor estilo "Hello, I love you" de se levar a vida.

O meu pedido favorito de todos os tempos, no entanto, é o de um casal de Anna Kariênina, livro que estou lendo e amando demais. Liévin ama Kitty há séculos, mas uma vez fora rejeitado por ela, que estava com o coração dividido. Os dois ficam sem se ver por anos até que um dia se reencontram num jantar, e em meio àquelas conversas formais e bestas típicas de um evento de família tradicional russa do século XIX, Liévin descobre que ainda gosta dela e, ela, que agora o ama a valer. Então, de repente não mais que de repente, ele escreve com giz numa mesa de jogo de cartas apenas as primeiras letras de cada palavra de uma frase que quer saber se, daquela vez que fora rejeitado, era definitivo ou apenas no momento. Ela bate o olho e entende, e lhe olha fixamente como que para mostrar que entendeu, e ele, não acreditando que havia sido compreendido tão rapidamente, lhe mostra uma letra aleatória e lhe pergunta o que significa, e ela diz a coisa certa. Kitty escreve outra coisa, também apenas com iniciais, e a comunicação dos dois se estabelece dessa forma, com iniciais e olhares que dizem tudo, e ao final, ele tendo certeza de tudo e todo o amor e ela também, Kitty apenas diz que falará com os pais dela naquela noite e está feito. 

Preciso dizer que suei frio junto com os personagens?

E como não poderia deixar de ser, meu estilo de declaração de amor favorito é aquele que vem escrito, cheio de palavras. No entanto, tenho pavor de clichês. Essa papagaiada que as pessoas tiram de sites bregas e que, de certa forma, se encaixam com qualquer história banal não serve pra mim. Se o cara me ama e está disposto a usar das palavras, essas coisas bonitas, para demonstrá-lo, que faça direito. Que gaste um tempo. Que perca o sono, mas fale direito. É por isso que sempre direi que Vinícius, meu Poetinha lindo, foi o homem que mais sabia falar e amar uma mulher por meio das palavras. Olha só que estou colocando-o na frente de Chiquérrimo, muso absoluto deste blog. Vinícius casou-se nove vezes e só imagino a quantidade de coisas que deve ter escrito à cada esposa - isso sem falar das ocasionais peguetes. Ainda assim, cada texto, poema, declaração e nota de rodapé nunca se parece com outro, nunca tem seu destinatário compartilhado. É dele, claro, a minha declaração de amor favorita de todos os tempos, a crônica Para Uma Menina Com Uma Flor. 

Desde o título percebe-se que aquelas palavras não são para mais uma ou qualquer uma, mas sim para uma só, para uma menina com uma flor. E o que isso significa, ou seja, ser uma menina com uma flor, tenho certeza que só os dois sabem. Ela é uma menina que acorda tarde, tem um ar recuado e gosta de brigadeiro. Adora purê de batata e tem medo de ver a Cara na Vidraça, que quando eles se conheceram procurava descobrir com qual cor de camisa ele sairia para que ela se vestisse parecido. A crônica é linda porque é toda pessoal e cheia de detalhes, e eu sou uma pessoa absurdamente ligada em detalhes e coisas pequenas que ninguém repara, e me sinto muito mal por saber que quase ninguém nota meus detalhes. Quando o House diz que trocando presentes a gente descobre o quanto os outros não te conhecem é porque só sabe dar bons presentes aqueles que reparam nos outros. Amar alguém é conhecer a pessoa nos detalhes mais insignificantes, porque, na verdade, são eles que constroem a essência da pessoa. É por isso que sou apaixonada pela forma como Vinícius é apaixonado por todas as nuances da personalidade dessa sortuda menina com uma flor e é por isso que tudo que queria na vida é uma pessoa que goste de mim dessa forma completa e que me chame não de menina com uma flor, mas de menina qualquer coisa que fosse minha e de ninguém mais.

"E porque eu me levanto para recolher você no meu abraço, e o mato à nossa volta se faz murmuroso e se enche de vaga-lumes enquanto a noite desce com seus segredos, suas mortes, seus espantos — eu sei, ah, eu sei que o meu amor por você é feito de  todos os amores que eu já tive, e você é a filha dileta de todas as mulheres que eu amei; e que todas as mulheres que eu amei, como tristes estátuas ao longo da aleia de um jardim noturno, foram passando você de mão em mão, de mão em mão até mim, cuspindo no seu rosto e enfeitando a sua fronte de grinaldas; foram passando você até mim entre cantos, súplicas e vociferações — porque você é linda, porque você é meiga e sobretudo porque você é uma menina com uma flor."


Vinícius de Moraes

domingo, 10 de junho de 2012

Aquele com a televisão, o cachorro e a feijoada no final

Em se tratando de mim e da minha mãe, pegar o carro e ir visitar meus avós em Tupaciguara, a mais ou menos 80km daqui, não é tão simples como parece. Aliás, em se tratando de mim e da minha mãe, nada é tão simples como parece.

Para início de conversa, mamãe não vê diferença entre o conceito de mala pra um fim de semana no interior e mala pra uma semana de férias num lugar interessante. Em Tupaciguara, quando saímos de casa, é pra ir visitar minha bisavó e olhe lá. Ainda assim mamãe arruma uma mala de 10 quilos com roupas e sapatos suficientes para uma longa temporada fora de casa, além de uma pesada frasqueira com secador, escovas, creme pro corpo, creme pro rosto, creme para os pés... É claro que chegando lá ela não usa nem um terço do que levou e ainda toma emprestado as poucas coisas que levo em minha módica mochila de leggings, camisetas e moletons.

Jogo mamãe na fogueira mas tenho lá minha parcela de culpa. Sou a esquisita que não consegue se desligar da civilização e que para onde vai leva consigo notebook, uma sacola cheia de carregadores e cabos USB, jornais e revistas que vou juntando e não tenho tempo de ler - o que me faz digna de participar do Acumuladores - e, no caso desse feriado, uma temporada de Skins, um box de filmes do Scorsese e um romance russo de 814 páginas.

Já era difícil quando estávamos apenas em duas, mas a família aumentou há dois anos com a chegada de Chico, o poodle. Lorde Francisco tem também suas posses: duas tigelas, um pote de ração, coleira, brinquedos, roupa de frio; tudo isso dentro de uma ecobag grande - sem contar, claro, com a cama. 

De vez em quando temos também uma sacola térmica que leva as coisas mais perecíveis da geladeira de casa que já teriam expirado na nossa volta. Considerando que fomos ao sacolão semana passada, a sacola estava cheia. Para completar, mamãe decidiu que seria uma boa levarmos também uma TV. Uma televisão. De tubo. 29 polegadas.

O abençoado eletrodoméstico da família brasileira estava encostado em casa desde que trocamos a TV da sala. Numa chuvosa quinta-feira de Corpus Christi, junto de uma mala de 10 quilos, minha mochila de entretenimento, cachorro, cama de cachorro e mala de cachorro, mamãe pensou que seria uma boa levar a referida. Em sua cabeça, Chico iria no chão do banco da frente e eu atrás com a TV. Eu, 1,75 de altura, no banco de trás com uma TV de 29 polegadas. De tubo. Não sei o que era pior, o plano original ou o B ao qual tivemos que apelar, mas calma, temos que tirar a televisão de casa.

Numa jogada de mestre, minha mãe inventou de colocar a TV sobre um tapete, que foi arrastado até o elevador. Piece of cake. O doce só azedou na hora de andar até o carro, na raça. Duas pálidas mocinhas loiras dos olhos verdes com uma televisão nos braços. Não sabia o quanto essas malditas pesavam até ter a nítida sensação de que minha coluna partiria no meio. Eu, com o frescor da juventude de quem sempre trapaceia na hora de fazer exercícios de braço no pilates, e mamãe, canhota com LER  e tendinite. Resumo da ópera: na caminhada de 20s entre o elevador e o carro, achei que fosse morrer umas trinta e duas vezes.

Nosso carro, compacto pra quem vê gigante pra quem anda apenas na perspectiva distorcida da minha mãe, acomodou com custo a TV no banco de trás. Fiquei no passageiro e Chico foi para o chão da parte traseira. Quer dizer, teoricamente ele dormia pacificamente no chão, mas na prática ele, excitadíssimo com aquele trambolho cinza de acompanhante, não parou de pular um segundo.  Aquele quadro tinha chance de dar errado em tantos níveis diferentes e aterrorizantes que parei de pensar e entreguei pra Deus, em cada curva antevendo a queda simultânea de televisão, cachorro e todos os pontos da carteira de motorista da minha mãe. Passei toda a viagem torta, com o braço para trás, firmando a televisão e ralhando com o Chico, cujo objetivo principal era embolar o tapete que estava em cima da TV para protegê-la, para que pudesse, assim, deitar ali em cima. Em cima da televisão num carro em movimento. 

Se escrevo este texto é porque, graças a Deus, chegamos inteiras: eu, mamãe, Chico, a mala de 10 quilos e a TV - esta, aliás, já faz a felicidade de vovô que a essa hora deve estar todo pimpão assistindo ao futebol deitado na cama. Vovó nos recepcionou feliz da vida, e como recompensa pelo nosso périplo nos preparou uma bela fei-jo-a-da

Minha vida é ou não é um episódio de Friends?

quarta-feira, 6 de junho de 2012

As mulheres preferem os verdes

Eu sempre gostei muito de super-heróis, apesar de meu amor ser poser ao olhar dos nerds. Nunca li nenhum gibi que não da Turma da Mônica e nem foi por desinteresse; penso que gostaria muito de acompanhar quadrinhos, o problema é que nunca sei por onde começar. A questão, porém, não é essa. Eu falava sobre meu amor por super-heróis, certo? Pois bem. O Homem Aranha sempre foi o amor da minha vida e o nome do Peter Parker está inscrito no meu coração - ainda mais agora que ele será interpretado pelo Andrew Garfield, aquele ser humano amor. Ele é meu favorito para todo sempre, salve-salve. No entanto, isso não significa que ignoro todos os outros heróis. Em segundo lugar vem o Batman, e minha lista é imensa.

Apesar da grandeza da minha lista e do meu coração que sempre cabe mais alguém pra amar platonicamente, eu nunca gostei do Hulk. Aliás, eu via o Hulk com um certo desprezo, nem o enxergava como um herói verdadeiro. Quem aí já fantasiou em ser salva de um prédio em chamas por uma criatura verde e raivosa? Eu ia preferir ficar lá pegando fogo, obrigada. Deus me livre de ser esmagada nas mãos do gigante verde. Eu achava tão bobo o fato do Hulk ficar verde e enorme, rasgando as próprias roupas, emitindo urros guturais só porque ficava com raiva, que desprezava-o sem nunca ter nem mesmo assistido ao filme. Deixava ele no cantinho junto com os chatos do Super Homem e do Capitão América, e os heróis bobos do Quarteto Fantástico. No entanto, contudo, entretanto, todavia, tudo mudou quando assisti Os Vingadores.

Quer dizer, tudo mudou quando o Mark Ruffalo entrou na história. Convenhamos que Eric Bana, que o interpretou no primeiro filme, e o Edward Norton, que o fez no segundo, são capazes de fazer o coração bater um tiquinho mais forte, só que Mark Ruffalo, minha gente, se encontra em um outro patamar de amor, infinitamente mais alto e habitado por uma quantidade esmagadoramente maior de borboletas e suspiros. Como diz a Analu, Mark Ruffalo tem cara de um vizinho que todas queriam ter, que bate na porta da sua casa numa sexta-feira chuvosa pra pedir uma xícara de açúcar e ganha de volta seu coração. Mark Ruffalo fez De Repente 30, Just Like Heaven, Minha Vida Sem Mim e uma pontinha toda especial em Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças. Mark Ruffalo fez você pensar em todos os colegas de classe gordinhos e estranhos que você já teve, na esperança de que algum deles seguisse a cartilha das comédias românticas americanas e se tornasse um fotógrafo sensível, fofo e cheio de amor para dar.


 Foi só por causa dele que eu consegui enxergar o outro lado do Hulk. Eu, do alto do meu preconceito com caras verdes e gigantes, pensava que o Hulk fosse apenas um brucutu que gosta de andar seminu quebrando as coisas ao seu redor. Depois do filme, porém, me deparei com a real personalidade dele e quase chorei de tanto amor. O Hulk não só é muito mais do que um brucutu garanhão verde como é uma alma atormentada cheia de traumas e complexidades sensíveis. Nada como uma alma atormentada pra encher o coração de uma mulher. Nada como um coração em conflito escondido dentro de um gigante verde para enternecer mais a minha pessoa. Nada como Mark Ruffalo interpretando um personagem com as características supracitadas para fazer com que eu tenha um ímpeto fortíssimo de colocar o brutamontes do Hulk no colo, mesmo que me esmagasse, lhe dar um beijo na testa e dizer que vai ficar tudo bem. 


O filme começa com a Scarlett Johanson indo pra Índia tentar recrutar o Dr. Banner pra equipe dos Vingadores. Ele se refugiou lá trabalhando como médico voluntário, isolado de todos, porque sabia que seus poderes eram incontroláveis e não queria ser responsável pela destruição do mundo apenas porque é incapaz de controlar a própria força. Ao chegar no QG dos Vingadores ele logo começa a trabalhar em cálculos ultra complexos, se esquivando linda e acidamente de todo e qualquer tipo de provocação a ele destinada por Tony Stark (outro lindo da minha lista), ali no cantinho dele, ali constrangido porque sabe que todo mundo morre de medo que ele perca o controle, ali todo cheio de inseguranças mesmo quando ele é o único forte o suficiente pra destruir o mundo. Não direi mais apenas para não estragar o desenrolar da história para aqueles que porventura ainda não assistiram o filme. O roteiro, contudo, é o de menos. O grande trunfo do filme é mostrar todo esse encantamento escondido por trás do Hulk, personagem o qual, agora que o conheço inteiramente, não me deixa pensar em argumentos convincentes o suficiente para que eu não tenha essa vontade enorme de casar com ele. 

Se a Renata pode ter os seus mendigos sensíveis, eu  não quero mais viver num mundo sem meu gigante verde sensível e atormentado. 

domingo, 3 de junho de 2012

Sou cara de pau com muitas pessoas, mas não com você

Conversando com minha melhor amiga sobre o quanto eu estava surpresa com o fato de já ter amigos na faculdade e que torcia para que ela encontrasse a turma dela tão facilmente como aconteceu comigo, escuto: "Vai ser um pouco difícil com essa minha cara de antipática, né? Se bem que você tem muito mais cara de antipática que eu." Rimos juntas na hora mas depois, rememorando isso, pensei comigo mesma: Até tu, Anaisa?

Já expus aqui minha total falta de traquejo social e a forma como isso faz com que as pessoas tenham uma ideia errada da minha pessoa. Por não saber como agir, na maioria das vezes ajo errado e quem fica de estranha sou eu. A novidade é que só agora percebo que isso acontece numa proporção muito maior do que eu antes supunha. Já tinha ouvido bastante que as pessoas por vezes pensam que sou metida, mas ultimamente o que mais tenho ouvido é que as pessoas tem medo de mim. Medo, gente. De mim. Eu, com essa voz de pônei e minhas paranoias patéticas, meto medo em alguém. Muitos alguéns. Analu e Marie adoram dizer que pensavam que eu as esnobava sem dó. A última da Analu, que ela contou semana passada, foi que quando começou a visitar o blog, ela tinha vontade de saber como eu configurava a data das postagens (!) e se martirizava com essa dúvida, mas não tinha coragem de me perguntar. 

Aliás, o começo da conversa foi bem diferente. Estávamos eu, Analu, Taryne e Milena conversando sobre o nossa dificuldade de conversar com os outros e o medo de sermos ignoradas quando a Analu me solta: "Eu nunca tive medo de chamar a Milena no chat, por exemplo. Mas eu demorei a ter coragem com a Anna". Até tu, Analu?

Sabe o que é mais bizarro em toda essa história? Eu, aqui do meu canto, aqui com minha cara de antipática, também morro de medo de falar com um monte de gente. É uma espécie de inception do medo de conversar com os outros e passar vergonha. É uma insegurança extremamente infantil, mas nem por isso menos torturante. Diante de uma pessoa com a qual eu não tenho muita intimidade fico com aquele medo de puxar assunto e parecer aleatória demais ou pior, de estar incomodando. Falo oi e já imagino a pessoa do outro lado pensando consigo: lá vem a chata., por que essa menina tá falando comigo? E meus interlocutores intimidantes nem são tão distantes a ponto de figurar na lista dos temidos semi-conhecidos; se não me sinto à vontade o suficiente pra chegar dando um tapa na cabeça, beliscando a barriga (sou um amor) ou abordar utilizando algum apelido de gosto duvidoso (pero pensando com carinho imensurável), é provável que me deixe sem graça.

Fico pensando na quantidade de pessoas que poderiam ter se tornado amigas caso nem eu ou elas estivesse com esse medinho de dar a cara a tapa. Parafraseio mal e porcamente o Jeff Tweedy no título pra dizer que não tenho problemas em abordar estranhos na rua, pedir entrevista, mendigar copos descartáveis com a moça da cantina pra tomar uma Coca-Cola que não foi comprada lá, perguntar pra um garoto da escola se ele tem parentesco com um ex-colega de classe meu, fingir de americana pra me infiltrar num hotel e tirar fotos de lá (baseado em fatos reais), etc. No entanto, basta me apontar uma rodinha de conversa com pessoas da minha sala não tão chegadas que eu tremo toda e peço ajuda aos universitários. 

E no meio desses ruídos de comunicação ainda tem o problema da cara de chata. Muitas pessoas com quem compartilho o defeito nem ligam tanto, mas eu sou do tipo que se importa porque vivo reparando na cara de legal (ou o contrário) das pessoas. Vai ver que é por isso que tenho uma birra tão enorme da Angelina Jolie, porque no fundo sei que, analisando apenas a expressão, ninguém teria vontade de passar a tarde comendo brigadeiro e fazendo as unhas comigo. Tomando novamente liberdade indevida com a letra de Reservations, um apelo: como é que mostro pros outros que quem tem medo e não sabe lidar sou eu?

Uma vez, conversando sobre gordices com umas pessoas da minha sala, nas primeiras semanas de aula, depois de dizer que amava pipoca com Nutella, ouço: "Nossa, nunca pensei que você fosse dizer isso. Você tem cara de quem gosta de acelga." Depois dessa mudarei minha bio no Twitter para: pareço gostar de acelga mas sou legal, ou então - e com o perdão do vocabulário chulo, cara de cu e bom coração.