sexta-feira, 23 de março de 2012

Chiquérrimo

Ler a biografia do Chico Buarque me trouxe dois sentimentos distintos: amor e descrença.

Quem escreveu o livro foi Regina Zappa, jornalista que já publicou outras coisas a respeito dele e mulher que, suponho, deve babar colorido por causa daqueles olhos também. Digo isso porque o livro todo é quase como uma ode à pessoa de Chico Buarque. Fala sim da história, dos perrengues, das dores e discos, mas sempre fazendo questão de ressaltar como ele é incrível, foda e querido. Com toda essa parcialidade fica difícil não se apaixonar mais ainda. A cada página que lia só conseguia pensar: que homem é esse, meu Deus? Parcial, sim, mas se até Nelson Rodrigues, o homem que declarou que toda unanimidade é burra, chamou-o de "única unanimidade nacional", que posso eu fazer senão derreter-me? 

O livro divide a cronologia de sua vida e carreira em blocos, cujo início traz uma contextualização histórica do período e depois relata o que lhe ocorreu e o que fez de mais interessante. Além disso, vem com pequenos perfis das pessoas que passaram por sua vida e descreve a forma como elas o viam. Maria Bethânia, a própria, por exemplo, declara que "Ele se esconde no charme que tem. O fato de ele se sentir Chico é problema dele, porque na verdade ele é uma presença diferenciada no palco. Dançava, brincava, fazia números. Desinibido, lindo. Não posso falar dele sem falar no cavalheiro que é. Tem uma alma elegante. Sou uma vergonha falando de Chico, babo de paixão por ele.". O jornalista Tarso de Castro numa reportagem sobre ele disse que Tom Jobim havia dito que não aguentava mais vê-lo falar bem de Chico e desafiou-o a encontrar um defeito no próprio. Sua resposta? O fato de Chico ser casado. Tom, por sua vez, pedia ajuda pra Chico na hora de "amarrar" suas composições e diz no livro que ele é "um excelente músico, excelente letrista, excelente cantor, excelente pessoa". Vinícius, o Poetinha, também compôs muito a quatro mãos com Chico - acho que minha página preferida do livro é a que contem alguns postais que os dois trocaram e o processo criativo de Valsinha - e ainda o chamava de Chiquérrimo (amei muito e já adotei na hora de gritar por Chico, o poodle).

Com o respaldo de tanta gente ótima, só me resta o amor. Amor de doer lá no fundo e deixar os olhos brilhando. Assim como Bethânia, babo de paixão. 

Além de apaixonada, também fiquei descrente de tão impressionada. Primeiro que antes de estourar no Brasil fazendo todo mundo parar pra ver a banda passar Chico já era sensacional. Mais novo que eu esse homem já tinha morado na Itália, já tinha lido mil livros, já desenhava cidades fantásticas, já conhecia um mundo de música e pingava eruditismo. Daí que assim, no susto e pela graça, ele compõe A Banda, que dispensa comentários. Seu amadurecimento só trouxe coisa boa e ele podia ser considerado um Midas - não só da música, mas teatro e cinema também - porque onde ele punha o dedo saía coisa incrível. Daí olho pra mim mesma e fico intimidada, sabe? Meio com vergonha. Sinto aquele livrão lindo e olhos (azuis? verdes?) do homem me encarando na capa como se perguntasse: Anna Vitória, minha filha, 18 anos no mundo e o que você fez?

Não sou dessas saudosistas de um passado que não vivi (ou evitava viver), mas fico meio com pena da minha geração. Não que não tenhamos hoje pessoas talentosas e incríveis, mas não se encontra gente do naipe dele hoje no país. E na época dele, não era só ele. Acredito que Chico só é quem é hoje porque cresceu num meio muito frutífero, com músicos, escritores e intelectuais fazendo saraus intermináveis na sua casa, em que os gênios eram acessíveis, em que a fama e o reconhecimento eram uma consequência de um trabalho muito bem feito, e não o contrário. Ele viveu uma era de verdadeiros artistas. Não pretendo entrar na discussão, mas a época dele foi diferente, o espírito era outro - LPs, festivais, folhetins, o Brasil inteiro cantando seu samba e não deixando-o reservado a uma pretensa elite - e fico pensando que ele viveu algo muito, muito bom - apesar das coisas ruins.

Recomendo sua biografia para todos, fãs ou não. É um livro babão sim, mas quem não quiser babar junto certamente ficará de olhos cheios com tanto material legal disponível: fotos, rascunhos de músicas, curiosidades, pitadas de história do Brasil e o melhor de tudo: um apanhado imenso de reportagens da época. Para mim, em todos os sentidos, foi uma delícia de livro. Analu e Renata não poderiam escolher mais certo.

8 comentários:

  1. Ai, Anninha! Você não sabe como esse post me deixou feliz! Porque eu estava em Vitória, vagando pela Saraiva, esperando a Rafinha chegar. Dei de cara com esse livro e falei: Anna Vitória.
    Combinei com a Rê na hora, e ela achou ótima a ideia também.
    Roí unhas de medo de você já ter, ou alguém ter a mesma ideia que eu, porque, sério, pra mim, foi extremamente óbvio. Não existia presente melhor pra você!
    E até eu um dia vou comprar pra mim, mesmo não sendo fã de Chico. Amo biografias, e essa é fantástica. E as fotos só me provam o que sempre achei: Chico é de Marieta. E ponto final.

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  2. Eu ganhei de presente do Lu, com o seguinte cartão: "Sei que não posso competir com ele, então que eu ganhe pontos te ajudando a alimentar essa paixão."

    Também babo de paixão pelo Chico. O show dele, 20 dias atrás, foi um dos momentos mais mágicos e indescritíveis a minha vida.

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  3. Ain, hoje no serviço falaram do Chico o dia todo, porque uma colega minha ia ao show dele nesse final de semana. Ele é apaixonante, pelo charme, ela cultura, pela classe, por ser quem é. Mesmo quem não conhece ou não gosta, não poderia jamais deixar de notar tudo que esse homem fez e emana. O livro deve ser mesmo delicioso, Anninha. Fiquei com vontade de ler :)
    Beijos.

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  4. É verdaaade! A Analu ficou toda boba com a biografia, lembrou de você e, vou confessar, eu também fiquei tentada. Ela me mostrou a Marieta e, é claro, ficamos bobas com a beleza daquela mulher nas fotos.
    A gente até comentou que não conhece muito de Chico, mas que ficou doida pra comprar a biografia só pra conhecer. Ela é linda de morrer! Outro dia voltei na Saraiva, mas não tinha dinheiro suficiente :( Esperarei o aniversário... E você me deixou com mais vontade ainda também!! D:

    Beijos, Anninha!

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  5. certamente iria me sentir mal lendo essa bio, porque realmente dá pra admirar muito um cara que fez tanta coisa boa e a nossa geração aqui, parada, "vendo a banda passar", sem trazer nada de incrível nesse nosso momento.

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  6. Eu me sinto um ET quando todo mundo dana a falar do Chico. Poxa, por que eu não gosto? hahaha Sério, começo a me perguntar isso. Obviamente não há nada de errado com ele, mas sim comigo. Enfim.

    Mesmo assim, deu vontade de ler o livro; porque você me influencia sempre, menina! É incrível. O seu jeito de escrever/resenhar é tão envolvente, que eu leio até sobre o que não gosto ou não me interessaria se outrém comentasse a respeito. Eu queria ter esse poder também hahaha

    Sem dúvidas ele viveu uma década de ouro, isso não posso negar. Infelizmente, nós estamos passando por um momento em branco. As pessoas andam ocupadas com as coisas erradas. Sei lá. Os únicos que ganham um lugar ao sol, hoje em dia, não tem talento pra tanto; é mais falácia do que habilidade. Por isso mesmo, é bom eu começar a aproveitar o máximo desses artistas que marcaram época :)

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  7. Babo igual a você pelo Chico e sua resenha só me fez ter mais certeza de que tenho que ler esse livro. Muito bom texto e concordo sinceramente com tudo isso das antigas gerações.

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  8. Anna,
    na livraria em que trabalho, essa é uma das biografias mais vendidas. Fiquei feliz quando soube que ia chegar, mas decepcionei-me um pouco com o conteúdo em estilo de reportagem, por parecer somente isso. Então vi que não. E você só serviu para confirmar. Mas antes quero ler as histórias das canções, de Wagner Homem. E esse já é um plano antigo meu.
    Abraços!

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