segunda-feira, 27 de julho de 2015

17 coisas que aprendi com o Snapchat

Meu pai costuma dizer que você está oficialmente ultrapassado quando surge uma nova onda na internet que você não apenas não faz a menor ideia do que ela seja ou como ela funciona, mas você simplesmente não entende o propósito daquilo. Assim, o surgimento do Snapchat me deixou com a sensação de que eu estava assinando oficialmente o atestado de tia da internet, e dali em diante só me restaria compartilhar notícias do Sensacionalista como se fossem reais, dar bom dia no Whatsapp com ilustração de minions e legendar as fotos assim............. que nem minha mãe faz..... rssss !!

Quando o Snapchat surgiu, eu não fazia a menor ideia da utilidade do aplicativo. Meus amigos compraram a proposta de corpo e alma, e enquanto eles se divertiam eu procurava entender a graça de uma rede social em que você envia fotos? que vão se excluir automaticamente? e vídeos de 10 segundos? que somem? tipo, pra que isso? Baixei e tentei usar, mas me senti extremamente ridícula e não conseguia me interessar por nada que as pessoas compartilhavam por lá. Eventualmente cansei de tentar, e meus amigos se cansaram de insistir pra que eu tentasse, e aceitei a derrota, entendi que de agora em diante ia perder algumas coisas e tudo bem. Tudo ótimo. Não se pode ter tudo. 

Mais recentemente, agora que o app realmente se popularizou e foi abraçado pela internet e pelos famosos, comecei a sentir uma nova coceirinha de curiosidade. Teimosa como sou, custei a admitir e dar o braço a torcer, e precisei encontrar um leão de cara bizarra que me convencesse a voltar. Explico: eu estava andando no shopping quando me deparei com um boneco de leão, não sei direito como chamar aquilo. 

Tinha uma espécie de instalação com vários bonecos de animais, meio que ali pras crianças subirem em cima e ficarem fazendo o que quer que seja que fazem as crianças. Só que o leão tinha uma cara bizarra, uma bunda gigante, e como eu não tenho maturidade nenhuma pra lidar com esse tipo de coisa, tive uma crise de riso. Segui em frente, fui jantar com meus amigos, e quando passei pelo leão de novo, outra crise de riso. Tirei fotos, fiz vídeos, mas senti falta de algo mais; o mundo precisava daquele leão, que não combinava com o Instagram (um pouco de dignidade sempre cai bem), não faria o menor sentido no Facebook, e que nem mesmo o Twitter poderia captar em sua plenitude. Eu precisava gravar um snap daquele leão. 

Foi aí que o aplicativo fez sentido pra mim: o Snapchat nada mais é que um lugar para pessoas que dão risada de leões deformados e sentem necessidade de dividir isso com o mundo. Depois desse episódio, baixei o Snap novamente e nunca mais larguei. É muito bom ser jovem novamente.

Isso aconteceu há pouco mais de dois meses, e nesse intervalo acho que já consegui sacar bem qual é a dele, aprender o que eu gosto, o que eu não gosto e até sentir vontade de cagar um pouco de regra sobre o que as pessoas devem ou não fazer por lá. Não vou me prestar a esse papel hoje, mas resolvi dividir com vocês um pouco das coisas que aprendi por lá, nessa que talvez seja uma das últimas fronteiras de intimidade compartilhada da internet. 

1) Tá todo mundo mal

Aprendemos isso com nossa amiga Jout Jout e o Snapchat veio pra provar isso. Tá todo mundo mal, gente. Enquanto no Youtube as pessoas estão bonitas, editadas, e sempre sob uma iluminação correta que as favorece, no Snap a gente aparece sem maquiagem, com o olho inchado, e todo mundo vê que você dorme com aquela camiseta do trabalho de escola feito em 2007. Assim como no Twitter a gente compartilha que vai no banheiro do trabalho fugir dos outros e pensar na vida, no Snapchat as pessoas ficam três dias sem lavar o cabelo, e mostram que estão comendo bolacha Passatempo o dia inteiro, ou então gravam 100 segundos contando sobre como o dia delas foi horrível, com direito a resfriado forte e sapato aberto na chuva. Eu adoro o Snapchat por isso. 


2) As pessoas ficam muito doentes

Pelo menos uma vez ao dia me deparo com o snap de alguém reclamando que tá doente. Não é doente de resfriado: é coisa séria, de ficar de molho em casa e fazer exames. Acho isso engraçado, porque eu nunca fico doente. Tipo, nunca. Tenho uma gripe forte e uma infecção de garganta por ano e é meio que isso - fora, claro, as constantes dores de cabeça e nas costas, mas isso são os meus maus hábitos gritando. No Snapchat as pessoas sempre estão doentes e indo ao médico, acho isso curioso. É normal não ficar doente? Deveria eu ir ao médico? Quando estou me sentindo mal vou dormir mais cedo, tomo uma Neosaldina, um chá e espero passar. Não é suficiente? Gente, tem que comer mais brócolis!

3) As pessoas realmente gostam de guacamole

Todo fim de semana tem pelo menos umas três pessoas comendo guacamole em algum restaurante. Eu sei que o fato de odiar abacate não me faz um bom referencial para isso, mas eu jurava que coisas com abacate não eram tão populares. No entanto, aparentemente, as pessoas gostam disso. E saem pra comer isso. E fazem isso em casa. E postam fotos. E vídeos. E fazem HHMMMMM no final. Abacate, gente. Eca.


4) Tem gente que come muito bem

Fico impressionada com os hábitos alimentares de algumas pessoas que eu sigo. É um povo muito bem alimentado! Falo não apenas das pessoas que comem coisas saudáveis, frutinha, salada, batata doce, tudo sem glúten e sem lactose, mas da galera que come umas coisas boas, bonitas, que chega em casa à noite e faz janta gostosa ao invés de miojo ou um misto quente. As pessoas cozinham coisas elaboradas, sofisticadas e comem coisas exóticas em restaurantes - ou no caso da Noelle, tem os melhores roomies do universo que fazem jantares incríveis como se fosse arroz com ovo. Olha, parabéns pra vocês. 


5) Tem gente que come muito mal

Desculpa, eu gosto muito de comida, então reparo muito no que os outros estão comendo. E tem gente que come muito mal. Dá vontade de mandar uma mensagem dizendo "amiga, é a terceira vez que você vai no McDonalds essa semana, isso mata!!" ou então perguntar se a mãe não ensinou que chocolate demais dá dor de barriga. Depois cês não sabem por que vivem doentes, né? Tem que se alimentar direitinho!


6) Todo mundo fala com bicho feito idiota

Uma das coisas mais fascinantes do Snapchat é descobrir a forma como as pessoas interagem com os seus animais. Com voz mais fina ou mais grossa, todo mundo é idiota e 95% das pessoas fazem vozinha. Gosto especialmente de quem conversa com o bicho e faz a voz dele (uma voz especial e cheia de personalidade) respondendo de volta. É meu tipo favorito de pessoa. 

7) As pessoas são mães dos seus bichos

As pessoas tratam seus cachorros, gatos, calopsitas, peixes beta e periquitos como filhos. Chamam de "filho" e se referem a si mesmos  como "mamãe" ou "papai". Nada contra, inclusive tenho uma mãe que trata o cachorro por filho e jura que somos irmãos, mas não deixo de achar engraçado. Algumas pessoas simplesmente não combinam com o título de mãe de bicho. 

8) Eu nunca vou cansar de ver vídeos e fotos de animais

Cachorro, gato, calopsita, peixes beta e periquitos, não importa. Eu vou ver 500 segundos deles sendo lindos e fofos e sentir saudade se você ficar um tempo sem mostrá-los. Just keep them coming. 

9) Há um limite pro overshare

Não estou falando de extremos, como aquela galera que grava snap fazendo xixi. Estou falando do cotidiano mesmo, sabe? Acho que isso acontece principalmente com blogueiras famosas, que estão tão habituadas a fazer a própria vida como material de trabalho que talvez não percebam o quão expostas estão. Talvez até percebam, mas não ligam pra isso. Não que seja um problema, mesmo, mas é que me sinto meio desconfortável por saber demais da vida dos outros, principalmente porque eu tenho vocação pra stalker, uma memória infinita pra fatos inúteis e às vezes percebo que sei tanto da vida de quem nem conheço que me sinto um pouco mal. Tipo, Anna Vitória, você não devia seguir o marido dessa blogueira e ainda saber que domingo ele joga basquete e depois eles saem pra comer um sunday roast e pizza à noite. Tipo, Anna Vitória, você não precisa reconhecer as pessoas pela roupa de cama que elas usam.


10) Você acha que conhece as pessoas

O Snapchat te dá uma sensação de proximidade muito grande com as pessoas. Se você segue gente que usa bastante o aplicativo, provavelmente você descobre bastante sobre a rotina dela, os amigos, o local de trabalho, o que ela faz no fim de semana... e aí de repente você se sente parte da vida dela, ainda que ela não seja nem remotamente próxima a você. Uma das snappers (?) que mais gosto eu conheci através de uma blogueira mais ou menos famosa, é uma das melhores amigas dela. E aí que eu comecei a seguir a moça no Twitter, e a ler o blog dela, e agora eu falo coisas tipo "Ai, mas a fulana disse isso", "A fulana mostrou aquilo" e às vezes me bate um desconforto e eu me sinto meio psicopata por essa proximidade unilateral.


11) É muito fácil acreditar que a internet é um grito no vácuo

Apesar de ter consciência de que não sou completamente anônima na internet, sei que ~meu público~ não é o de uma pessoa famosa ou de uma blogueira de sucesso. No entanto, sei que têm pessoas do outro lado me lendo, me acompanhando e, agora, me assistindo. Só que é muito fácil esquecer disso, principalmente porque no Snapchat você não tem muito controle sobre quem te segue em termos de números e essas coisas. Então estou lá, falando groselhas, achando que só minhas amigas estão vendo, quando de repente alguém aleatório comenta comigo sobre algo que disse lá e eu imediatamente quero me enfiar num buraco e nunca mais falar nada. Mas aí esqueço e logo estou falando groselhas de novo. 

12) Não existem assuntos chatos, existem pessoas chatas

Quando estava aprendendo a usar o Snap, li vários posts com dicas de como usar, o que fazer, o que é cafona ou não, essas coisas. Todos esses textos falavam que não era legal ficar falando demais, que ninguém queria saber como foi um dia banal da sua vida, e nem assistir 150 segundos do seu cachorro tendo a barriga coçada. Concordo em partes, é sempre melhor mesmo mandar a galera maneirar, mas isso significa muito pouco. Se a pessoa é legal, divertida e sabe contar histórias, ela pode falar por 500 segundos todos os dias que eu vou assistir. Agora se for uma pessoa chata, ou simplesmente alguém que não tem o timing certo pro aplicativo, 20 segundos viram uma tortura. 


13) 2 segundos são suficientes pra absorver uma foto

Amigas, superem as selfies de 10 segundos que ninguém aqui é obrigado. Sei que tem como passar antes do tempo acabar, mas ainda assim fico com raiva e ao mesmo tempo com vergonha pela pessoa. Parem. 


14) O Júnior é foooooooooooooooofo

O Júnior. Irmão da Sandy, sabe? Pois é, eu sigo ele no Snapchat. E ele é fofo! FOFO! Na verdade ele nem posta tanto assim, mas eu adoro. Ele tem cachorros fofos e é muito simpático e querido. Sério. Fazia mesmo todo o sentido sermos apaixonadas por ele há quinze anos. FOFO! Sigam: jrlimaoficial

15) As pessoas não têm vergonha de dirigir e fazer snaps

Eu não quero saber se você parou no semáforo, se o trânsito não andava, se o carro estava devagarinho. A única coisa que sei que é eu sou muito nova pra morrer atropelada porque uma pessoa estava fazendo lipsync de alguma música pra fazer graça pra internet. É feio, é irresponsável. Parem. Melhorem. 


16) O tempo passa muito rápido

Um dia passei 40 minutos marcados no relógio vendo todos os snaps que se acumularam ao longo do dia e nem percebi. 40 minutos é muito tempo. Ou eu maneirava meu vício ou de repente meus netos estariam correndo na sala e eu teria perdido toda essa vida - mas na verdade eu não teria netos, porque passei todo o tempo vidrada na tela do Snapchat. Jesus, me ajuda.


17) As pessoas não se levam a sério

A internet está cada vez mais cheia de gente que se leva a sério demais, e parece que é impossível topar com ações despretensiosas que não sejam marketing ou produção de conteúdo de algum tipo. Acho que o termo que mais me irrita é "produzir conteúdo". O Snapchat me mostrou que as pessoas ainda estão dispostas a perder um tempo razoável sendo idiotas, falando bobagens e eu sinto um quentinho no coração sempre que assisto 40 segundos de alguém fazendo caretas variadas ou brincando com os emojis na tela. As pessoas ainda não se levam completamente a sério. Ainda bem. 



> Quem quiser me ver falando groselhas e julgar meus hábitos alimentares, meu usuário é annachicoria;
>> Se tivesse que escolher sete perfis favoritos pra indicar, seriam cafremder, cheznoelle, carolburgo, daniellenoce, fashionismo, oliveira.v e rebiscoito. E vocês, que tipo de perfil gostam por lá?

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Ode aos meus amigos

Para ler ouvindo (porque eu escuto essa música pensando nos meus amigos e sempre choro, e porque eu não poderia escrever um post sobre amizade sem a minha melhor amiga famosa):


As pessoas sempre me perguntam se eu estou namorando, mas raramente me perguntam sobre os meus amigos. Aliás, as pessoas falam mais sobre um namorado que eu nem tenho do que sobre os meus amigos, que estão aqui todos os dias. Não é estranho? Costumo brincar que nunca fui namoradeira e nem encontrei o amor da minha vida porque gastei minha cota de sorte ficando amiga das melhores pessoas do mundo. É brincadeira (eu ainda tenho um saldo positivo de sorte pra gastar com o amor da minha vida, né? NÉ???), mas é verdade também. Eu realmente sou amiga das melhores pessoas do mundo.  


Sei que é moda dizer que se tem poucos, mas bons, amigos. Todo mundo prefere. Concordo, acho que é melhor mesmo se ter um amigo de verdade do que 10 amigos-até-a-página-seis, 20 colegas e 300 conhecidos no Facebook, mas, como eu disse, tive muita sorte na vida. Eu tenho muitos amigos. Descobri isso esses dias quando fui contar o número de pessoas que considerava minhas amigas de verdade e me faltaram dedos nas mãos pra contabilidade. Isso é muito, não é? Tenho muitos e ótimos amigos. 

Digo isso sem medo de parecer exibida e sem vontade de ser modesta porque considero os meus amigos um milagre, e acho que milagres têm que ser celebrados. Fui assistir Paper Towns semana passada e fiquei um tempão pensando no texto que abre o filme, em que o Quentin diz que seu milagre era ter sido vizinho de Margo Roth-Spiegelman: dentre todas as estados, todas as cidades, todos os bairros e todas as casas, ela foi morar justo do lado dele. Não era exatamente uma loteria, mas é como se fosse.

spoiler: o milagre não era a Margo
Quando eu era mais nova eu pensava muito sobre isso, sobre esses acasos milagrosos que acabam mudando o rumo das nossas vidas. Tinha o menino bonitinho da sala, aquele que todas as meninas gostavam, e tinha uma menina que era vizinha e amiga dele da vida toda. Eu pensava: sempre tem uma menina pra ser vizinha do menino que a gente gosta, e essa menina nunca sou eu. Do mesmo jeito que eu não era a menina sorteada pra fazer trabalho no grupo dele, e a professora nunca me escolheu pra sentar perto do garoto que poderia ser meu namorado.

Eu escapei de todos esses milagres, e quando tinha 12 anos e assistia A Nova Cinderela, costumava me lamentar pensando que se alguém fosse chamar a atenção de um equivalente a Austin Ames, essa pessoa não seria eu. Não seria eu que perderia o celular no dia do baile pra ele encontrar, e nem seria comigo que um cantor italiano trombaria no meio da rua pra depois me convidar pra fazer um show com ele #referências A vida inteira, todos esses clichês de comédias românticas que sempre precisam de um pequeno milagre, um golpe de sorte ou um empurrão do destino pra acontecer, nunca aconteceram comigo. 

No entanto, quando meus pais foram procurar uma escola pra mim depois do jardim de infância, eles rodaram a cidade inteira e ficaram entre duas opções. Numa tarde de sábado, eles saíram comigo pra que eu visitasse as duas e escolhesse a que eu gostasse mais. Antes, uma parada. Uma amiga da minha mãe queria muito que ela conhecesse a escola onde os filhos dela estudavam, um lugar pequeno e pouco conhecido, e foi lá e marcou uma visita, meio que sem minha mãe pedir (ou querer). Pra não fazer desfeita, a gente foi lá ver qual era antes de ir pras outras escolas. Resultado: eu e meus pais amamos tanto aquele lugar que nem chegamos a visitar os outros dois colégios. 

Fizemos a matrícula na segunda-feira e foi lá, no ano 2000, que eu conheci os meus melhores amigos. Dentre todas as escolas, de todas as cidades, entre todas as salas, e todas as panelas, foi ali que a gente se encontrou e é aqui, juntos, que estamos até hoje. Não é um milagre?


Da mesma forma, com o fim da escola, eu poderia muito bem ter feito mais um ano de cursinho e tentado vestibular em São Paulo, como minha mãe queria. Ou eu poderia ter ido estudar em Belo Horizonte, como meu pai queria. Ou eu poderia ter feito Direito, como todas as pessoas queriam. Mas eu fiquei aqui, no Jornalismo, e no primeiro período eu fiz amigos, que hoje escreveram um livro comigo, sem nunca brigar - e todo mundo disse que a gente brigaria. Logo eu, que estava morrendo de medo de estar num lugar onde eu não conhecia ninguém, eu que nunca soube muito bem fazer amigos (!) porque a última vez que havia feito isso foi com seis anos de idade, caí numa sala cheia de gente que ri comigo, com quem eu faço planos pro futuro, com quem eu acabo de alugar um apartamento na praia pro feriado. Não é exatamente uma loteria, mas é como se fosse.

Por fim, tem aquela história que vocês já conhecem. São milhões de pessoas vagando a esmo na internet entre textões e gifs de gato, mas eu caí no grupo do Facebook com as amigas que me fazem pensar que não quero reescrever as nossas linhas que se não fossem tortas não teriam se encontrado. É tanto amor que eu escuto músicas românticas da Sandy e penso nas minhas amigas. Eu poderia ter ido dormir mais cedo naquelas primeiras folias, eu poderia ter saído do grupo pra estudar pro vestibular, eu poderia ter acreditado que era loucura viajar 600 quilômetros pra me encontrar com pessoas que eu nunca tinha visto antes, mas olha onde isso me trouxe. Embora haja tanto desencontro pela vida, ela nos trouxe até aqui. Não é um milagre digno de filme?


Quis escrever tudo isso não pra dizer olha só como eu sou legal e tenho amigos legais, mas porque eu acho que a amizade é subestimada no mundo que vivemos. As pessoas dizem que quem tem amigos tem tudo, mas são essas mesmas pessoas que dizem depois que você sempre faz novos amigos e tudo bem. Ou então acham graça de você se despencar pro Rio de Janeiro pra surpreender sua amiga sem uma real necessidade, só porque sim, porque ela merece, porque a gente merece e quis assim. Ou então acreditam que os amigos meio que ficam ali pra tapar os buracos entre a vida familiar, seu trabalho, e seu relacionamento amoroso - nunca sendo uma prioridade, sendo os primeiros a ser deixados de lado quando a correria começa.

Não existe uma propaganda do Boticário ou da Coca-Cola pro dia do amigo, e as pessoas preferem qualquer história mais ou menos de romance do que ouvir minhas histórias com meus amigos, que são muitas, e eu adoro contá-las - logo eu, que detesto falar sobre minha vida pros outros. A sociedade me vê como uma fracassada e as pessoas me consideram sozinha porque não namoro ninguém, mas esquecem que enquanto eu estou "sem ninguém" eu fico até de madrugada sentada numa mesa conversando abobrinhas e rindo horrores com meus amigos, ou que desestabilizamos linhas de metrô, dançamos abraçadas aos berros e vimos o sol nascer juntas - seja depois de uma noite memorável ou depois que o mundo acabou, mas ficou tudo bem. How do you feel by the end of the day, are you sad because you're on your own? No, I get by with a little help from my friends. 


Saberei que encontrei a pessoa certa quando achar alguém com quem eu faça tanta questão de gastar meu tempo, meu dinheiro e minhas noites de sono como eu faço com meus amigos. Na loteria da vida eu não saí com o roteiro de comédia romântica anexado no meu destino, mas consegui os meus amigos. Na vida todo mundo tem um  milagre, e eles são o meu. Ainda bem. 

Feliz dia do amigo pras minhas pessoas - as melhores do mundo. 

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Então eu escrevi um livro

Vocês acreditam nisso? Eu também não. Ainda não. 

A Analu, que também já escreveu um livro (e eu já escrevi sobre o livro que ela escreveu), me disse que eu ainda vou passar um tempo pensando que é mentira e que tudo foi um sonho, mas sempre quando eu acordar ele vai estar ali, na minha cabeceira, totalmente de verdade, totalmente meu. O livro que eu escrevi. 

Eu escrevi um livro. Eu escrevi um livro. Eu escrevi um livro. Preciso ficar repetindo isso pra me acostumar com a ideia, porque chegar até aqui foi tão difícil que eu ainda acho que vou acordar em algum momento e estar presa naquele primeiro final de semana em que passei todas as horas possíveis na frente do computador até chegar no domingo à noite com meia página escrita, odiando todas as palavras que estavam nela, e achando que eu nunca conseguiria. 

Desde que tentei participar do NaNoWriMo ano passado e falhei miseravelmente, me tornei uma consumidora compulsiva de manuais de escrita e livros de autoajuda para escritores. Se estava na loja Kindle por menos de 20 pila, pode ter certeza que eu comprei, li, e grifei inteiro. Um dos primeiros foi o Write Everyday, da Cathy Yardley, e nele ela dedica um capítulo para cada um dos problemas mais comuns que podem estar atrapalhando alguém a escrever. Um deles é o medo. 

É verdade que eu me identifiquei com todos os obstáculos apresentados: falta de tempo e energia, ausência de um processo criativo eficiente, falta de planejamento; mas o maior problema, de longe, era o medo. É claro que eu sabia disso desde a primeira noite que passei encarando o documento em branco sem conseguir escrever uma linha, mas foi importante ver o medo ali, catalogado. Ah, então não sou só eu. Ah, então o medo é realmente uma thing. Ah, então as pessoas sentem medo e isso não é coisa da minha cabeça. Praticamente tudo que eu já li sobre a escrita fala sobre esse medo. Medo, pavor, pânico de criar. Medo de falhar. Medo de não ser suficiente. Medo de dar tudo errado. Medo do desconhecido. Medo de que todos descubram que eu sou uma farsa. Medo, medo, medo, todos eles empilhados sobre minha cabeça, me impedindo de fazer qualquer coisa. 

Conversando sobre isso com um amigo mais experiente, na esperança de que ele me fizesse companhia no incrível exercício que é sentir pena de mim mesma, tive que ouvir de volta algumas verdades. Ele me disse primeiro que eu só conseguiria escrever quando começasse a escrever - antes disso nem ele nem ninguém poderia me ajudar. Ele disse que medo todo mundo tem, mas as pessoas estão aí escrevendo independente disso. E ele disse também que, embora o medo seja normal, eu estava falando sobre escrever, que é aquilo que eu faço e sempre fiz; medo eu deveria sentir se estivessem me obrigando a resolver um problema de física quântica. 


Ele disse por último que o único jeito de superar o medo de escrever, de novo, é escrevendo. 

Então, com muita dificuldade e depois de muito choro, eu resolvi sentar e escrever. Achando difícil, tremendo de medo, mas escrevendo. Não é física quântica, Anna Vitória, você pode fazer isso foi a frase que eu mais repeti pra mim mesma nos últimos meses. Tem uma outra frase muito ótima do Thomas Mann em que ele diz que "um escritor é alguém para quem escrever é mais difícil do que para as outras pessoas.” Essa definição é a mais apropriada que já encontrei para tentar definir essa minha vida de gente que junta uma letra depois da outra, seja por profissão ou só vontade de sofrer mesmo. Porque já faze uns anos que escrever pra mim é isso, sofrimento - embora já tenha sido muito fácil.

Mantenho esse blog há sete anos e meio (!), e é assustadora a forma como minha relação com o texto mudou ao longo do tempo. Antes eu contava casos bestas sobre a minha vida, falava de algum filme que eu tinha assistido, pirava na batatinha com relação aos temas que me interessavam, seguindo bem a cartilha do blog raiz que estava na moda há dez anos. No entanto, algo aconteceu ali no meio do caminho que de repente eu comecei a escrever os casos bestas da minha vida, a escrever o que eu tinha achado daquele filme que eu vi, escrever alguma piração sobre determinado tema do meu interesse. Foi como se de repente eu tomasse consciência daquele ofício e isso mudou pra sempre minha relação com o texto. De repente, não era mais tão fácil.

E acreditem, eu amo escrever. Faço isso por prazer, por gosto, por dinheiro e porque é a única coisa que eu sei fazer. Gosto tanto de escrever que acho muito estranho gente que não escreve, mas, ao mesmo tempo, acho que escrever é uma das atividades mais moralmente degradantes que alguém poderia escolher, e tenho inveja de quem não precisa fazer isso. 

(Meu Deus tem gente que não escreve, deve ser incrível ser uma dessas pessoas)

Acho que esse todo esse desgaste e medo tem a ver com o fato de que criar é mesmo muito assustador. Você já parou pra pensar no que a árvore, o filho e o livro daquele velho clichê têm em comum? São três processos de criação. O primeiro é indireto, a gente só precisa dar um empurrão pra natureza; o segundo é direto, físico, visceral, em que a gente junta duas pessoas pra criar uma terceira que não existia antes; já o terceiro também é direto e visceral, mas vem da alma, e a gente arranca um pedaço nosso, mistura com o resto do mundo, e faz nascer algo que também não estava ali antes. Não sei vocês, mas essa ideia me arrepia os cabelos.

Além de tudo, meu livro é um trabalho de jornalismo. Com firulas de literatura, uma personagem que inventamos pra narrar os casos, mas uma história real, de pessoas reais, o que só adiciona mais responsabilidade à missão. Usar a vida dos outros para criar qualquer coisa que seja me causou um terror quase paralisante. E se eles odiarem? E se as pessoas acharem que eu inventei tudo isso? E se na verdade eu não entendi nada direito e estiver mentindo sem querer? E se a vida real não for  suficiente? E se eu não for suficiente? 

Foram semanas maravilhosas.

Mas eventualmente saiu, e agora eu posso assegurar a vocês que aquilo que as pessoas falam é verdade: uma hora sai mesmo. Às vezes rápido, ou, se você for eu, só depois de muitas noites seguidas na frente do computador até as quatro da manhã escrevendo uns três parágrafos todo dia. Mas sai. Você escreve. E chega um dia que você até vai gostar do que escreveu, e outros em que você vai escrever um monte e se sentir tão inebriada pelo trabalho que está fazendo que vai odiar qualquer outra coisa que não seja trabalhar naquilo. Até que você termina e reescreve tudo. De novo e de novo. Pensei que fosse lenda isso que dizem de que, ao escrever um livro, você escreve pelo menos uns três livros, mas é verdade. Foram mais ou menos umas quatro versões até chegar no resultado final.

Não fiz isso tudo sozinha. Como um trabalho da faculdade, meu livro, o nosso livro, foi escrito à oito mãos. Ficou no meu colo a responsabilidade de uniformizar os textos e cuidar da coerência do elemento ficcional da história, já que a personagem foi criada por mim, mas sozinha, sem todas aquelas fotinhas que comentavam e grifavam trechos e faziam aparecer frases escritas por fantasmas no Docs durante a madrugada, eu não teria saído daquele primeiro fim de semana que me rendeu meia página de vergonha e duas horas de choro compulsivo. Escrever é uma atividade sempre muito solitária, mas é muito melhor quando não se está sozinha. Escrevemos um livro. Escrevemos um livro. Escrevemos um livro.

Agora que acabou fica um vazio existencial enorme. Já sinto falta das nossas fontes, que eu aprendi a amar mesmo sem conhecer, e se eu tivesse dinheiro a primeira coisa que faria seria organizar uma festa que reunisse todos os nossos viajantes num baile sobre rodas, com janelas abertas, música alta e paisagens bonitas. Eu ainda tenho uma banca pra me preocupar, e depois a missão de encontrar um jeito de fazer esse livro chegar até as pessoas (sugestões? estou falando muito sério), e uns dois ataques cardíacos que vim adiando e preciso sofrer em algum momento. Mas agora acabou e não tem mais revisão, nem parágrafos reescritos, e nem discussões filosóficas sobre a materialidade da personagem e se ela pode dar uns tapinhas nas costas de alguém. Existe o vazio daquele meu pedaço que foi junto com as palavras, mas não é uma ausência e sim a saudade da adrenalina que foi arrancá-lo fora. Talvez eu precise fazer isso de novo. Mas antes, claro, os ataques cardíacos. E a banca. E uma semana de férias. Aí podemos conversar.

Por enquanto, meu conforto é olhar para a cabeceira e ver ele ali. O livro que eu escrevi.

(Meu Deus, tem gente que não escreve, deve ser horrível ser uma dessas pessoas.)





































* O Itinerância ainda não está disponível e eu nem sei quando isso vai acontecer, mas temos uma página no Facebook com um monte de coisa legal. Pode curtir, mandar nudes e até mesmo contar sua história. É sério. 
** Acho que estou de volta. Espero que ainda tenha alguém aí do outro lado.