Meu pai costuma dizer que você está oficialmente ultrapassado quando surge uma nova onda na internet que você não apenas não faz a menor ideia do que ela seja ou como ela funciona, mas você simplesmente não entende o propósito daquilo. Assim, o surgimento do Snapchat me deixou com a sensação de que eu estava assinando oficialmente o atestado de tia da internet, e dali em diante só me restaria compartilhar notícias do Sensacionalista como se fossem reais, dar bom dia no Whatsapp com ilustração de minions e legendar as fotos assim............. que nem minha mãe faz..... rssss !!
Quando o Snapchat surgiu, eu não fazia a menor ideia da utilidade do aplicativo. Meus amigos compraram a proposta de corpo e alma, e enquanto eles se divertiam eu procurava entender a graça de uma rede social em que você envia fotos? que vão se excluir automaticamente? e vídeos de 10 segundos? que somem? tipo, pra que isso? Baixei e tentei usar, mas me senti extremamente ridícula e não conseguia me interessar por nada que as pessoas compartilhavam por lá. Eventualmente cansei de tentar, e meus amigos se cansaram de insistir pra que eu tentasse, e aceitei a derrota, entendi que de agora em diante ia perder algumas coisas e tudo bem. Tudo ótimo. Não se pode ter tudo.
Mais recentemente, agora que o app realmente se popularizou e foi abraçado pela internet e pelos famosos, comecei a sentir uma nova coceirinha de curiosidade. Teimosa como sou, custei a admitir e dar o braço a torcer, e precisei encontrar um leão de cara bizarra que me convencesse a voltar. Explico: eu estava andando no shopping quando me deparei com um boneco de leão, não sei direito como chamar aquilo.
Tinha uma espécie de instalação com vários bonecos de animais, meio que ali pras crianças subirem em cima e ficarem fazendo o que quer que seja que fazem as crianças. Só que o leão tinha uma cara bizarra, uma bunda gigante, e como eu não tenho maturidade nenhuma pra lidar com esse tipo de coisa, tive uma crise de riso. Segui em frente, fui jantar com meus amigos, e quando passei pelo leão de novo, outra crise de riso. Tirei fotos, fiz vídeos, mas senti falta de algo mais; o mundo precisava daquele leão, que não combinava com o Instagram (um pouco de dignidade sempre cai bem), não faria o menor sentido no Facebook, e que nem mesmo o Twitter poderia captar em sua plenitude. Eu precisava gravar um snap daquele leão.
Foi aí que o aplicativo fez sentido pra mim: o Snapchat nada mais é que um lugar para pessoas que dão risada de leões deformados e sentem necessidade de dividir isso com o mundo. Depois desse episódio, baixei o Snap novamente e nunca mais larguei. É muito bom ser jovem novamente.
Isso aconteceu há pouco mais de dois meses, e nesse intervalo acho que já consegui sacar bem qual é a dele, aprender o que eu gosto, o que eu não gosto e até sentir vontade de cagar um pouco de regra sobre o que as pessoas devem ou não fazer por lá. Não vou me prestar a esse papel hoje, mas resolvi dividir com vocês um pouco das coisas que aprendi por lá, nessa que talvez seja uma das últimas fronteiras de intimidade compartilhada da internet.
1) Tá todo mundo mal
Aprendemos isso com nossa amiga Jout Jout e o Snapchat veio pra provar isso. Tá todo mundo mal, gente. Enquanto no Youtube as pessoas estão bonitas, editadas, e sempre sob uma iluminação correta que as favorece, no Snap a gente aparece sem maquiagem, com o olho inchado, e todo mundo vê que você dorme com aquela camiseta do trabalho de escola feito em 2007. Assim como no Twitter a gente compartilha que vai no banheiro do trabalho fugir dos outros e pensar na vida, no Snapchat as pessoas ficam três dias sem lavar o cabelo, e mostram que estão comendo bolacha Passatempo o dia inteiro, ou então gravam 100 segundos contando sobre como o dia delas foi horrível, com direito a resfriado forte e sapato aberto na chuva. Eu adoro o Snapchat por isso.
2) As pessoas ficam muito doentes
Pelo menos uma vez ao dia me deparo com o snap de alguém reclamando que tá doente. Não é doente de resfriado: é coisa séria, de ficar de molho em casa e fazer exames. Acho isso engraçado, porque eu nunca fico doente. Tipo, nunca. Tenho uma gripe forte e uma infecção de garganta por ano e é meio que isso - fora, claro, as constantes dores de cabeça e nas costas, mas isso são os meus maus hábitos gritando. No Snapchat as pessoas sempre estão doentes e indo ao médico, acho isso curioso. É normal não ficar doente? Deveria eu ir ao médico? Quando estou me sentindo mal vou dormir mais cedo, tomo uma Neosaldina, um chá e espero passar. Não é suficiente? Gente, tem que comer mais brócolis!
3) As pessoas realmente gostam de guacamole
Todo fim de semana tem pelo menos umas três pessoas comendo guacamole em algum restaurante. Eu sei que o fato de odiar abacate não me faz um bom referencial para isso, mas eu jurava que coisas com abacate não eram tão populares. No entanto, aparentemente, as pessoas gostam disso. E saem pra comer isso. E fazem isso em casa. E postam fotos. E vídeos. E fazem HHMMMMM no final. Abacate, gente. Eca.
4) Tem gente que come muito bem
Fico impressionada com os hábitos alimentares de algumas pessoas que eu sigo. É um povo muito bem alimentado! Falo não apenas das pessoas que comem coisas saudáveis, frutinha, salada, batata doce, tudo sem glúten e sem lactose, mas da galera que come umas coisas boas, bonitas, que chega em casa à noite e faz janta gostosa ao invés de miojo ou um misto quente. As pessoas cozinham coisas elaboradas, sofisticadas e comem coisas exóticas em restaurantes - ou no caso da Noelle, tem os melhores roomies do universo que fazem jantares incríveis como se fosse arroz com ovo. Olha, parabéns pra vocês.
5) Tem gente que come muito mal
Desculpa, eu gosto muito de comida, então reparo muito no que os outros estão comendo. E tem gente que come muito mal. Dá vontade de mandar uma mensagem dizendo "amiga, é a terceira vez que você vai no McDonalds essa semana, isso mata!!" ou então perguntar se a mãe não ensinou que chocolate demais dá dor de barriga. Depois cês não sabem por que vivem doentes, né? Tem que se alimentar direitinho!
6) Todo mundo fala com bicho feito idiota
Uma das coisas mais fascinantes do Snapchat é descobrir a forma como as pessoas interagem com os seus animais. Com voz mais fina ou mais grossa, todo mundo é idiota e 95% das pessoas fazem vozinha. Gosto especialmente de quem conversa com o bicho e faz a voz dele (uma voz especial e cheia de personalidade) respondendo de volta. É meu tipo favorito de pessoa.
7) As pessoas são mães dos seus bichos
As pessoas tratam seus cachorros, gatos, calopsitas, peixes beta e periquitos como filhos. Chamam de "filho" e se referem a si mesmos como "mamãe" ou "papai". Nada contra, inclusive tenho uma mãe que trata o cachorro por filho e jura que somos irmãos, mas não deixo de achar engraçado. Algumas pessoas simplesmente não combinam com o título de mãe de bicho.
8) Eu nunca vou cansar de ver vídeos e fotos de animais
Cachorro, gato, calopsita, peixes beta e periquitos, não importa. Eu vou ver 500 segundos deles sendo lindos e fofos e sentir saudade se você ficar um tempo sem mostrá-los. Just keep them coming.
9) Há um limite pro overshare
Não estou falando de extremos, como aquela galera que grava snap fazendo xixi. Estou falando do cotidiano mesmo, sabe? Acho que isso acontece principalmente com blogueiras famosas, que estão tão habituadas a fazer a própria vida como material de trabalho que talvez não percebam o quão expostas estão. Talvez até percebam, mas não ligam pra isso. Não que seja um problema, mesmo, mas é que me sinto meio desconfortável por saber demais da vida dos outros, principalmente porque eu tenho vocação pra stalker, uma memória infinita pra fatos inúteis e às vezes percebo que sei tanto da vida de quem nem conheço que me sinto um pouco mal. Tipo, Anna Vitória, você não devia seguir o marido dessa blogueira e ainda saber que domingo ele joga basquete e depois eles saem pra comer um sunday roast e pizza à noite. Tipo, Anna Vitória, você não precisa reconhecer as pessoas pela roupa de cama que elas usam.
10) Você acha que conhece as pessoas
O Snapchat te dá uma sensação de proximidade muito grande com as pessoas. Se você segue gente que usa bastante o aplicativo, provavelmente você descobre bastante sobre a rotina dela, os amigos, o local de trabalho, o que ela faz no fim de semana... e aí de repente você se sente parte da vida dela, ainda que ela não seja nem remotamente próxima a você. Uma das snappers (?) que mais gosto eu conheci através de uma blogueira mais ou menos famosa, é uma das melhores amigas dela. E aí que eu comecei a seguir a moça no Twitter, e a ler o blog dela, e agora eu falo coisas tipo "Ai, mas a fulana disse isso", "A fulana mostrou aquilo" e às vezes me bate um desconforto e eu me sinto meio psicopata por essa proximidade unilateral.
11) É muito fácil acreditar que a internet é um grito no vácuo
Apesar de ter consciência de que não sou completamente anônima na internet, sei que ~meu público~ não é o de uma pessoa famosa ou de uma blogueira de sucesso. No entanto, sei que têm pessoas do outro lado me lendo, me acompanhando e, agora, me assistindo. Só que é muito fácil esquecer disso, principalmente porque no Snapchat você não tem muito controle sobre quem te segue em termos de números e essas coisas. Então estou lá, falando groselhas, achando que só minhas amigas estão vendo, quando de repente alguém aleatório comenta comigo sobre algo que disse lá e eu imediatamente quero me enfiar num buraco e nunca mais falar nada. Mas aí esqueço e logo estou falando groselhas de novo.
12) Não existem assuntos chatos, existem pessoas chatas
Quando estava aprendendo a usar o Snap, li vários posts com dicas de como usar, o que fazer, o que é cafona ou não, essas coisas. Todos esses textos falavam que não era legal ficar falando demais, que ninguém queria saber como foi um dia banal da sua vida, e nem assistir 150 segundos do seu cachorro tendo a barriga coçada. Concordo em partes, é sempre melhor mesmo mandar a galera maneirar, mas isso significa muito pouco. Se a pessoa é legal, divertida e sabe contar histórias, ela pode falar por 500 segundos todos os dias que eu vou assistir. Agora se for uma pessoa chata, ou simplesmente alguém que não tem o timing certo pro aplicativo, 20 segundos viram uma tortura.
13) 2 segundos são suficientes pra absorver uma foto
Amigas, superem as selfies de 10 segundos que ninguém aqui é obrigado. Sei que tem como passar antes do tempo acabar, mas ainda assim fico com raiva e ao mesmo tempo com vergonha pela pessoa. Parem.
14) O Júnior é foooooooooooooooofo
O Júnior. Irmão da Sandy, sabe? Pois é, eu sigo ele no Snapchat. E ele é fofo! FOFO! Na verdade ele nem posta tanto assim, mas eu adoro. Ele tem cachorros fofos e é muito simpático e querido. Sério. Fazia mesmo todo o sentido sermos apaixonadas por ele há quinze anos. FOFO! Sigam: jrlimaoficial
15) As pessoas não têm vergonha de dirigir e fazer snaps
Eu não quero saber se você parou no semáforo, se o trânsito não andava, se o carro estava devagarinho. A única coisa que sei que é eu sou muito nova pra morrer atropelada porque uma pessoa estava fazendo lipsync de alguma música pra fazer graça pra internet. É feio, é irresponsável. Parem. Melhorem.
16) O tempo passa muito rápido
Um dia passei 40 minutos marcados no relógio vendo todos os snaps que se acumularam ao longo do dia e nem percebi. 40 minutos é muito tempo. Ou eu maneirava meu vício ou de repente meus netos estariam correndo na sala e eu teria perdido toda essa vida - mas na verdade eu não teria netos, porque passei todo o tempo vidrada na tela do Snapchat. Jesus, me ajuda.
17) As pessoas não se levam a sério
A internet está cada vez mais cheia de gente que se leva a sério demais, e parece que é impossível topar com ações despretensiosas que não sejam marketing ou produção de conteúdo de algum tipo. Acho que o termo que mais me irrita é "produzir conteúdo". O Snapchat me mostrou que as pessoas ainda estão dispostas a perder um tempo razoável sendo idiotas, falando bobagens e eu sinto um quentinho no coração sempre que assisto 40 segundos de alguém fazendo caretas variadas ou brincando com os emojis na tela. As pessoas ainda não se levam completamente a sério. Ainda bem.
> Quem quiser me ver falando groselhas e julgar meus hábitos alimentares, meu usuário é annachicoria;
>> Se tivesse que escolher sete perfis favoritos pra indicar, seriam cafremder, cheznoelle, carolburgo, daniellenoce, fashionismo, oliveira.v e rebiscoito. E vocês, que tipo de perfil gostam por lá?