Ou: Catástrofes que são engraçadas por serem muito ridículas
O último livro que eu li foi sobre um cara que colocou o futebol na frente de todas as outras coisas importantes da sua vida, e na maior parte do tempo a única coisa que ele recebeu de volta foi desgosto, decepção, e derrotas humilhantes - e eu achei isso inspirador demais. Meu filme preferido começa com um monólogo sobre a diferença entre fracasso e fiasco, e meio que gira em torno da nossa necessária redenção diante dos fiascos inevitáveis dessa vidinha besta. Eu gosto de uma série em que todos os personagens se ferram, sempre, e a média de mortes é tipo a média de gols da Copa: 3,5 por temporada. Já tive que ouvir que minha banda favorita faz música pra homem em crise de meia-idade. Discordo, claro, mas que Wilco funciona que é uma beleza quando a coisa tá preta, isso é verdade.
Assim sendo, vocês me desculpem, mas tenho uma tendência insuportável de poetizar tragédias.
Não existe perspectiva que faça aquele placar de ontem doer menos, a não ser que vocês sejam fatalistas como eu e já estejam antevendo uma vitória argentina no nosso Macaranã. Pra quem diz que é só um jogo de futebol, que é só um bando de homens milionários correndo atrás de uma bola e cagando pra gente, pego emprestadas as palavras da Camila e digo que literatura é só um bando de palavras correndo atrás de um sentido, ativismo político é só um bando de ingênuos correndo atrás de um sonho. Cada um com seu bonde, correndo atrás do que acredita, e que bom que eles passam em linhas paralelas, e não divergentes, como alguns insistem em acreditar.
Não existe justificativa, salvação ou lado bom da coisa. Perder de 7, em casa, daquele jeito (ainda penso que se me distrair um pouco vou olhar pra TV e ver que a Alemanha marcou de novo), é uma grandiosa bosta, bosta essa que nós vamos carregar pra sempre nas costas, e que vamos engolir amargamente no mínimo a cada quatro anos, e que vamos relembrar em seus sórdidos detalhes daqui 60 anos, quando nosso neto, aquela besta teimosa que resolveu fazer jornalismo, resolver fazer um trabalho sobre isso - igual um pessoal na minha turma está fazendo um trabalho sobre o Maracanazzo de 50. Mineiratzen: eu fui.
Risos. Risos eternos.
Só que ontem, no meio daqueles seis minutos insuportáveis em que vimos nossa Seleção tomar quatro gols na cara da forma mais patética possível, peguei meu celular pra atender uma amiga Ana Luísa Bussular Marques aos prantos. Ela mais chorou do que falou, e eu, um belo consolo do outro lado, mais ri de nervoso do que consolei. Depois ela disse que se sentiria melhor se eu estivesse chorando também, e eu mesma queria ter, sim, chorado, sofrido largado.
Mas era tudo tão bizarro e inacreditável que o clichê nunca foi tão preciso: seria cômico, se não fosse trágico. Não parecia um jogo, parecia uma pegadinha, um jogo duro de assistir do Rockgol, um esquete do Monty Python, sei lá. Não parecia um jogo. Acho que sofri mais com as derrotas do México, da Costa Rica e da Argélia do que com nosso vexame de ontem. Não é cinismo, juro, e nem coisa de quem vai embora do estádio antes do fim do primeiro tempo e queima bandeira no meio da rua. Pensei que eu fosse sublimar de tanta vergonha e humilhação, e queria enfiar todos aqueles jogadores embaixo do braço pra tirá-los dali, mas aguentei até o fim. Só que, da forma como foi, não deu nem pra sofrer.
Eles jogaram, a gente não. Eles eram melhores, relaxamos. Eles chegaram junto, desesperamos. Quem não faz, leva, e quem não faz nada leva de 7. Parece discurso pragmático do meu pai, mas nem o ser humano mais passional do mundo diria que não merecemos. Dó eu tenho da Argélia. Injusto foi com o México. Pra nós, paciência.
Isso não diminui minha torcida por aquele time, nem minha admiração por vários daqueles jogadores - sigo grávida de David Luiz e quero ter meu filho na Granja Comary. Isso não altera a realidade de que fizemos e vivemos uma Copa épica, a Copa das Copas de fato. De uma forma irônica, nossa derrota só contribui com o folclore. Perdemos, de 7, em casa, de um jeito ridículo - e corremos o risco de ver a Argentina ganhando. Sério, nem Monty Python escreveria isso tão bem. Goleada dói demais, agora eu sei disso, e vocês perdoem o limite que irei ultrapassar, mas existe uma poesia sádica numa derrota assim. Ou ganha arregaçando, ou perde arregaçado.
MAGIC absolutamente me representa |
(Eu sei que isso só fez sentido na minha cabeça)
O que eu realmente queria dizer, nesse sétimo e último post dessa saga, é que nesse ano eu vivi uma experiência com o futebol como eu nunca tinha vivido antes, e nem esperava viver. Tipo um affair tórrido com aquela pessoa que você menos espera, que aparentemente não tem nada a ver com você, que você ama com toda a alma e depois se estrepa até o último fio de cabelo, mas não se arrepende de ter vivido. Essa Copa me fez sofrer, me deixou tão nervosa que eu tremi e tive taquicardia das brabas, fez com que eu me apaixonasse por gente que nunca vi na vida, e me fez vibrar tanto a ponto de pensar que virar umas pingas seria uma ideia sensacional - eu, que nem sou dessas.
A Copa me envolveu e eu fui envolvida por ela, com vitórias incríveis (Brasil x Chile, melhor pior dia da minha vida por muito tempo) e derrotas cruéis, o pacote completo. No true fiasco ever began as a quest for mere adequacy, diz o Orlando Bloom ao fim de Elizabethtown, e eu digo que essas decepções e vergonhas só sente quem vai pro campo, em corpo ou em espírito, disposto a levantar uma taça ou levar um sarrafo pra nunca esquecer. E eu, pessoa que passou muito tempo da vida observando o tempo passar na janela igual Carolina, com medo de me sujar lá fora, digo que participar é sempre melhor, mesmo quando é horrível.
Copa das Copas: eu fui. E foi incrível.
Amiga, essa Copa foi realmente tão incrível que mesmo a gente perdendo de 7 e mesmo (isola) se a Argentina ganhar no Maracanã eu não vou querer esquecê-la nunca. Tô com você, e você sabe, vivi essa Copa com uma intensidade que nunca imaginei dedicar ao futebol na minha vida. Tremi, chorei, gritei, fiquei rouca, e não troco nosso jogaço com o Chile para não ter perdido essa semifinal. Poderíamos ter perdido ali, e ido para casa na honra de ter pelo menos dado trabalho ao nosso vencedor. Não demos, mas chegamos na semifinal e, entre trancos, barrancos e muito vexame, ainda vamos levar o 4º lugar entre 32. Pensando assim não dói tanto, vai dizer?
ResponderExcluirNunca mais vou esquecer esse 7, isso é fato. Mas se Deus quiser as criancinhas da Sadia ainda vão ver um título, nem que tenham que esperar ser adultas para comemorá-lo, e ainda vamos ter algumas vitórias belíssimas para comemorar! Viva o nosso hexa que tá demorando, mas quando vir, virá quente!
Te amo e obrigada por essa Copa!
Ai, gente! Só eu que torço para nossos hermanos argentinos? Haha. Uma coisa que essa copa me despertou foi uma torcida IMEEEENSA para América Latina como um todo, e eu fiquei toda orgulhosa que de fato, a copa foi latina, e NOPE, NÃO QUERO UM EUROPEU GANHANDO ESSA MERDA. (Discurso digno de Hugo Chávez, esse hein?)
ResponderExcluirMas então, esse sete a zero foi a coisa mais estranha que senti. Não sei se eu ria, se chorava, se gritava, se gargalhava... Havia tantas possibilidades que acho que fiz todas elas. Mas tudo bem, vamos superar e quem sabe o terceiro lugar pode vir como reação. E é isso aí. Vai Brasil!
Opa, sete a um. Já estava acostumada com a ideia do zero que o único gol da seleção ainda não entrou na minha cabeça.
ExcluirEssa cena de MAGIC é a minha vida como um todo <3
ResponderExcluirEstou em estado de negação com essa derrota. Foi muito surreal para uma semifinal. NÃO DEVERIA SER ASSIM. É o tipo de coisa que só acontece nas histórias do George Martin. Não sei lidar. Inclusive, estou com medo desse jogo pra disputar o 3º lugar. Vai ser o fundo do poço se acontecer outra goleada :-/
Primeiro: MAGIC ♥♥♥
ResponderExcluirSegundo: Essa foi A Copa mesmo Anna! Foi demais acompanhar tudo que vocês escreveram e sofrer e torcer junto através dos blogues. Seria cômico se não fosse trágico e fiquei igual a você, rindo sem parar, porque não dava pra acreditar.
Eu já não sabia se era gol ou replay. :/
Muito triste.
Teremos história pra contar forevermente.
E você? Arrazando,como sempre e sempre e sempre.
Anna,
ResponderExcluirsua lógica e suas referências foram incríveis. Tirando o Wilco, divido com vc as preferências e, também, a reação à la MAGIC.
A poesia existe sim: pelo menos a história a ser contada vai ser das grandes (melhor que a história da Holanda, que foi só triste - além dessa coisa de sempre nadar e morrer na praia). Ganhamos grande, perdemos grande. E que venha 2018!
Ontem a maior parte da minha tristeza já tinha passado. Aprendi a lidar com derrotas e decepções no futebol porque já vi muitas delas antes, porque já me envolvi muito com isso. Na terça, fiquei incrédula, me enchi de desgosto, fiquei triste - mais ou menos nessa ordem. Mas eu não me senti particularmente humilhada nem nada. Ninguém me envergonhou. Perderam e perderam muito feio (e o pior: não jogaram), mas o lado bom de tudo isso vai existir se o que aconteceu servir pra um aprendizado realmente significativo de quem está envolvido com o futebol brasileiro no momento.
ResponderExcluirContinuo amando essa Copa, embora eu não esteja conseguindo lidar muito bem com a possibilidade de a Argentina ganhar (NÃO VAI, claro). Nada nunca é tão ruim que não possa piorar, o dia de ontem nos lembrou. Mas quem sabe agora, numa dessas ironias da vida, quem nos deixou tão tristes é quem vai nos dar uma alegrizinha no domingo acabando com o sonho dos nossos hermanos (nem me sinto mal por isso depois de ouvir os argentinos dizendo que já estavam felizes, mesmo se perdessem da Holanda. Ah, vá).
Pelo menos a Copa de 2014 vai deixar muita história pra contar. E, se não deu pra reescrever a história de 1950, pelo menos deu pra deixar os caras descansarem em paz depois de tanto tempo: alguém foi lá e fez algo pior.
Beijo!
PS: esse finzinho de Elizabethtown é tão incrível!
Eu nem estava brincando de copa e sofri não quero nem imaginar a Ana bussolar...
ResponderExcluirhttp://camylialessandraphotos.blogspot.com.br/
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