domingo, 5 de maio de 2013

Um dia, cinco aeroportos e lugar nenhum


(Esse post é a versão 2013 do meme Um Dia, inspirado pelo livro de mesmo nome e também pelo documentário "A vida em um dia")

Eu costumava gostar bastante de aeroportos, mesmo. Achava que o ambiente tinha algo de especial, diferente, interessante, misterioso, cheio de histórias. Não é à toa que eu gosto tanto de Chegadas e Partidas. As passagens ainda eram muito caras quando eu era criança, o que acabou acrescentando uma mística inexplicável ao lugar, carregando toda viagem aérea - ou qualquer passada rápida ao aeroporto para levar ou buscar alguém - de uma pitada generosa de empolgação extra. Lembro que morria de inveja das pessoas que tinham que ficar no avião por conta de alguma escala ou das que saíam em conexão, e meu sonho era um dia sair pulando de aeroporto em aeroporto até chegar no meu local de destino.

Recentemente, entretanto, descobri que aeroportos não me fazem mais tão feliz. Na teoria eles continuam igualmente interessantes, misteriosos, cheios de histórias esperando para ser descobertas (quem ainda não leu trate já de ler O Livro Amarelo do Terminal, da Vanessa Bárbara!), mas a prática tem me trazido um sentimento de claustrofobia e aflição sempre que me vejo perambulando em um por muito tempo.

Fiquei pensando nisso ontem, um dia cheio de aeroportos como sempre sonhei na infância, e lembrei de um post que gosto bastante lá do antigo blog da Lu: Não-lugar. Nele, ela conta que a única coisa que conhece do Rio são as mesmas cadeiras azuis da Infraero, o estacionamento de aviões e uma avenida que fica do outro lado do vidro. Pensei imediatamente em Salvador, cidade para a qual já fui três vezes sem, de fato, pisar lá uma única só. Posso dizer que conheço o recorte das praias visto do céu e dependendo da rota dá até pra ver o Elevador Lacerda se prestarmos bem atenção, mas é só: de resto, as mesmas cadeiras azuis, cafés com pães de queijo ruins, e a ausência de uma boa banca de revistas depois da área de embarque. Não fosse pela loja do Olodum, poderia ser qualquer lugar do Brasil.

Foi por volta das 10h30 da manhã de ontem que me vi lá novamente, o segundo aeroporto da terceira cidade do dia. O fim da minha viagem de férias a Fortaleza começou às 4h30 da manhã, com o incômodo toque do telefone do quarto do hotel. Serviço de despertador. Corri pra guardar as últimas coisas na mala e terminar de fechar as coisas, e senti uma satisfação meio culpada por estar vestindo uma calça comprida e calçando tênis depois de uma semana de Havaianas e trajes de veraneio.

A alegria acabou no primeiro aeroporto do dia, quando dei com a língua nos dentes e disse para o atendente da Gol que estava levando meu notebook na mala. Ele me fez abri-la ali no meio do saguão e resgatar meu computador do meio das toalhas e vestidos longos em que ele estava cuidadosamente enrolado. A mochila estava cheia e ele é grande demais para caber na bolsa. Cheguei no café pisando forte e com o trambolho nas mãos. Minha avó perguntou por que eu tinha dito onde ele tava guardado. Kristen Stewart (!) responde:


Recife foi a segunda cidade, mas não cheguei a descer no aeroporto. Mais ou menos uma hora dentro do avião esperando, numa claustrofobia crescente, que aumentou quando entrou um passageiro e sentou do meu outro lado. Fui bem espremidinha entre desconhecidos, impedida de dormir, salva pelo ótimo livro que tinha comigo, já no fim: Serena, do Ian McEwan.

Nas duas horas de nada em Salvador, comi um pão de queijo ruim e baixei um aplicativo que um amigo me recomendou para baixar músicas direto do iPhone, sem precisar do iTunes. Eu tinha esquecido o iPod em casa e estava quase enlouquecendo com a rádio da Gol, que passa uma sensação bem parecida que a dos aeroportos: várias músicas que não significam absolutamente nada pra mim, embora eu as conheça, assim como os aeroportos, iguais no país todo sem, no entanto, traço algum de familiaridade.

A viagem até São Paulo foi a mais incômoda de todas. Meu ouvido doía por conta das aterrissagens,  meu nariz estava entupido por conta do ar condicionado e a cabeça doía pelas duas condições já citadas, além da fome e da irritação, esse monte de estados se influenciando e sustentando mutuamente. Eu sou uma pessoa razoavelmente agradável de se estar perto na maior parte das vezes, mas fome, sono e dor me transformam numa pessoa horrível. Fiquei feliz pelo avião estar cheio, me fazendo sentar separada dos meus avós, eles não me mereciam naquele estado. Parecia que eu ia entrar em combustão espontânea a qualquer momento.

O terceiro aeroporto foi Guarulhos, talvez o que eu mais odeie de todos que já conheci. Ele é incômodo em todas as áreas: dá trabalho pra chegar, dá trabalho pra sair, e é grande demais para não ser trabalhoso chegar de um ponto ao outro. Pegamos um ônibus até Congonhas, que, em contrapartida, é meu aeroporto favorito. Gosto do linóleo preto e branco do saguão principal, das livrarias e das histórias de todas as vezes que estive lá. Mas, como que para fazer piada com minha cara, o nosso portão de embarque ficava em um ponto que eu não tinha ido antes, longe de tudo que mais gosto, com cara de não-lugar como todos os outros daquele dia. Comi uma coxinha ruim e um Kit Kat que me custou quase 7 reais.

Vistas do alto, as luzes de São Paulo são muito impressionantes e o céu estava tão chapinhado de estrelas que eu até esqueci da aflição que sinto ao voar de noite. Passei a hora que me separava de casa ouvindo três músicas sem parar: "Miss atomic bomb", "No I in threesome" e "All the time".

Cheguei no aeroporto de Uberlândia surda dos dois ouvidos por conta da pressão, mas aliviada por estar em casa. O plano era passar em casa, tomar um banho rapidinho e encontrar meus amigos no nosso novo bar favorito. Foi a perspectiva de risadas e tapioca que me acalentaram durante todo dia, mas meu pai falou tanto na minha cabeça e colocou tanta dificuldade numa coisa tão simples que acabei jogando a toalha. Feito menina mimada eu recusei ajuda com as malas e ainda bati a porta do carro (desculpa pai), e como que por castigo, as minhas pernas se misturaram às rodinhas e a escada na entrada do prédio e eu caí de bunda, pateticamente, feito uma batata. Disse pra mim mesma que as minhas inimigas venceram e que aquele dia não tinha salvação.

Tomei um banho demorado ao som de Legião Urbana, passei um tempão deitada na cama da minha mãe, enchendo o ouvido dela com meus resmungos. Depois de ouvir minhas queixas em voz alta comecei a chorar, me sentindo muito bobinha por ter deixado coisas tão pequenas me afetarem daquela forma. Eu merecia uma bifa na cara dada por alguém com problemas de verdade. Jantei e consegui pegar o final de "Como perder um homem em 10 dias", filme que mesmo tendo em DVD eu assisto sempre que passa na TV. Consegui ver a minha cena favorita, quando Andie e Ben cantam "You're so vain" e acabei pegando no sono ali no sofá mesmo, abraçada com Chico, o poodle, sentindo os problemas se afastarem à medida em que eu dormia.

Acho que o que eu estava precisando mesmo era voltar pra casa.

17 comentários:

  1. Eu acho que era de um sono bem dado, viu? Sempre faço dessas birras de menina mimada e depois me odeio por ter feito! E nunca vai haver nada pior do que uma viagem repleta de escalas e conexões, mas pense pelo lado bom: você conheceu a Couth, a Char, dormiu com o Chico, teve férias boas e agora pode dormir por mais algunas dias e ver seus amigos em outro dia!
    Abraços <3

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  2. AI, amiga, viajar é ótimo, mas a casa da gente é a casa da gente, né? Queria relatos de aventura no Beach Park, eles virão? E eu fico muito estressada em dias de escalas. E olha que eu geralmente vou pra Vitória, o que significa apenas uma em São Paulo. Mesmo assim eu sempre me estresso. Odeio ficar parada sem companhia em sala de embarque. Minhas histórias favoritas de aeroporto envolvem minha viagem pra Disney e o dia em que passei horas no saguão, sentada no chão, com Mimi, Tatá e Dedê. De resto...
    Mas pelo menos sua saga rendeu um post "um dia" inusitado! O meu eu nem comecei a escrever ainda, e acho que vai ser tão sem graça..
    Beijo! <3

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  3. Vim correndinho ler seu post porque ia ficar chatiada se não tivesse uma referência a mim, depois de tanto papo sobre aeroporto! hahahaha. Sabe que eu também já enchi o saco de aeroporto e nem perdi mais voos. Fico bem amargurada de ter que necessariamente pegar avião pra ir pra casa. Queria muito um ônibus onde eu pudesse entrar, dormir (nem que fosse por 17h) e só sair pra ir pra casa. Ainda mais aqui no Brésil onde os ônibus param em rodoviárias e vc não precisa usar o banheiro do latão. Mas, enfim, acho que nem eu tenho sono suficiente pra 3 dias dormindo. Enquanto isso, é o jeito ficar em filas, ter que aguentar pessoas levantando enquanto o avião mal começou a estacionar e etc.

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  4. Amiga, por que você acha que eu gosto tanto de O Mágico de Oz? Tirando os motivos óbvios (PORQUE É AWESOME, ORA ESSA), adoro o modo como o filme constata que não há melhor lugar que o nosso lar. Quando eu era pequena costumava falar essa frase em voz alta quando chegava em casa... E confesso que hoje em dia ainda penso isso sempre que vejo meu quarto depois de uma viagem longa. Acho que voltar pra casa só doeu demais quando me despedi de vocês, mas mesmo assim foi ótimo estar de volta. Seu dia foi doido e eu posso te imaginar bufando de impaciência, mas acho que é sempre bom relembrar a máxima da Dorothy.

    Beijos!

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  5. Pensa no lado positivo da coisa toda: ao menos você viaja.

    Mas tá, tenho que concordar que aeroportos são um saco.

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  6. Ano passado eu passei 8 horas no aeroporto de Florianópolis, sozinha, já que meus pais voltariam de carro para Porto Alegre. O aeroporto é longe de tudo lá, então não teve jeito, tive que ficar lá mesmo. Naquele dia a magia dos aeroportos morreu pra mim de tão cansativo que foi. Agora esse ano eu passei quase 12 horas no aeroporto de Recife. Quase porque eu quis sair e passear, mas acabei me perdendo e voltei para o Aeroporto antes que as coisas piorassem...Então ó, te entendo.
    Mas bem, pelo menos a viagem foi boa, né? :)
    Concordando com a Tary e com Dorothy: There's no place like home!
    Beijo. <3

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  7. Eu viajo tão pouco que ainda não perdi o gosto por aeroportos ainda, para mim são lugares muito muito legais. Nunca li "O Livro Amarelo do Terminal", mas vou procurar.

    Adoro viajar, mas voltar para casa é sempre muito bom, mesmo. Tem alguma coisa na casa da gente que é impossível encontrar em qualquer outro lugar.

    E quanto a fazer dramas imensos por pouca coisa, eu sei que é feio e tudo o mais, mas se serve de consolo eu faço exatamente igual - não se sinta sozinha nessa. E também choro e me sinto culpada depois. Fiz isso hoje mesmo, quando descobri que o celular que eu comprei (e que ainda nem chegou) tem bem menos memória do que o anunciado, por causa do espaço que o sistema operacional ocupa. Acontece que meu irmão estava gravando pra testar a qualidade do celular dele bem no momento em que ele me deu a notícia. Ver a minha cara no vídeo me fez rir e chorar ao mesmo tempo.

    Beijos!

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  8. Nunca viajei de avião, mas pelo pouco que conheço de aeroportos já não sinto muita simpatia pelo ambiente... Só de ler esse post me senti cansada, então imagino como você não estava no final desse dia hahahaha.
    Também sou dessas que se aluga a mãe por horas só pra contar das mazelas do momento, mas na maioria das vezes ela só finge que me ouve #chatiada. E olha, nada de lágrimas, porque as inimigas fazem festa quando choramos, cabeça erguida SEMPRE!
    Beijinhos, Annoca ♥

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  10. Oi! Conheci seu blog há uns anos (você nem na universidade estava ainda, acho). Acho que vi o link no blog da Isadora, que conheci por causa do blog do Rob Gordon... De lá pra cá, entrei aqui algumas vezes, embora eu nunca comente. Este texto, por outro lado, me motivou a deixar um comentário: de aeroporto eu entendo. Já até dormi em alguns... hehe

    Acho que gosto deles pelo que representam - uma viagem, a descoberta de algo novo, minutos de tensão e ansiedade antes de descermos num lugar diferente. Do aeroporto mesmo, nada importa, são sempre iguais, em qualquer lugar do mundo. O legal é o que vem depois dele. Por isso, adoro pisar em Guarulhos, mesmo quando vou fazer um voo local. Fico pensando em quem tem a sorte de estar indo para algum daqueles lugares legais que os letreiros anunciam...

    Agora, ir de aeroporto em aeroporto sem descer na cidade não é legal não. É como quase chegar a conhecer um lugar, mas deixar pra depois. Parabéns pelo texto e pelo blog!

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  11. Olha, aeroportos têm mesmo sua magia. Saudade de passar por um, viu.
    Mas sabe, acho que os aeroportos brasileiros deixam muito a desejar. Ainda não saí daqui pra poder falar sobre isso com propriedade, mas pelo que vejo, os daqui parecem ser bem mais sem graça.

    Beijo, Anninha.
    Que SAUDADE dos seus textos ;*

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  12. Desse dia terrível todo eu bem que queria que sua estadia em São Paulo tivesse se estendido pr'além dos aeroportos >< (e just for the record, também DE-TES-TO Guarulhos e não quero nem ver essa bodega quando a Copa acontecer)

    Enfim, já dizia Dorothy Gale: There's no place like home.

    Beijos Annoca!

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  17. Incrível como eu sempre venho aqui e acabo me identificando com algo que você escreve!
    Eu nunca passei por nada desagradável em aeroportos e talvez por isso meu carinho por eles se mantém constante...Adoro aeroportos. Isso de pegar uma avião e em horas estar em outro país/estado! Pode parecer bobo falar assim mas poxa, acho fantástico. Além de, como você falou, todo o mistério que ele liberta, todas histórias que se escondem por lá. Eu me sinto diferente quando viajo, quando entro num avião. Gosto de esperar as malas, gosto de ter alguém me esperando na chegada, gosto de chegar, gosto de ir e chegar. Gosto de especular a vida das pessoas na cabeça, gosto quando eventualmente aparece alguém do meu lado mais interessante que o resto das pessoas. E as nuvens? Nem vou comentar o quanto me fascina.
    Espero que suas próximas viagens façam esse estresse vago e inconsistente o suficiente para que o carinho pelo aeroporto volte. Ainda melhor que chegar em casa depois de um estresse-de-aeroporto, é chegar em casa com graça de um bom-dia-de-aeroporto.

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